Por 9 votos a 1, STF determina manutenção da prisão de André do Rap
Ministros também fixaram tese de que o descumprimento do artigo que baseou a liminar de Marco Aurélio Mello não gera soltura automática dos presos; integrantes da Corte também ressaltaram que presidente não pode cassar decisão de seus pares
O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou, na tarde desta quinta-feira, 15, o julgamento da prisão de André Oliveira Macedo, conhecido como André do Rap, um dos líderes do Primeiro Comando da Capital (PCC), acusado de tráfico internacional de drogas. Na quarta-feira 14, o plenário formou maioria a favor da decisão do presidente da Corte, ministro Luiz Fux, que derrubou a liminar concedida pelo relator do caso, ministro Marco Aurélio Mello, responsável pela soltura do narcotraficante. O placar final da votação foi de 9 a 1 pela manutenção da prisão do narcotraficante. Os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Dias Toffoli, Rosa Weber, Carmen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes seguiram o entendimento do presidente da Corte, ministro Luiz Fux, que determinou a manutenção da ordem de prisão. O único a votar contra foi o ministro Marco Aurélio Mello. Os ministros também fixaram a tese de que o descumprimento do artigo 316 do Código de Processo Penal (CPP), que baseou a decisão de Marco Aurélio, não pode gerar a soltura automática dos presos, devendo o juiz competente ser instado a reavaliar a atualidade e legalidade de sua decisão. Além disso, em seus votos, os ministros destacaram que é “totalmente descabido” o presidente do Supremo cassar uma decisão liminar concedida por outro integrante da Corte.
“Decretada a prisão preventiva, deverá o órgão emissor da decisão revisar a necessidade de sua manutenção a cada 90 (noventa) dias, mediante decisão fundamentada, de ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal”, diz o CPP. O dispositivo não constava no texto original do pacote anticrime, idealizado pelo ministro Sergio Moro, mas foi incluído através de uma emenda de autoria do deputado federal Lafayette Andrada (Republicanos-MG). O texto foi aprovado pelos parlamentares e sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro. À época, Moro foi contra o acréscimo e elaborou um parecer no qual recomendava seu veto. A Procuradoria-Geral da República (PGR) também orientou o veto.
Primeiro a votar, o presidente da Corte, ministro Luiz Fux, disse que a revogação da liminar concedida por Marco Aurélio Mello foi “medida extrema e excepcionalíssima” e que encontra precedente em outras decisões do STF. Fux também afirmou que o artigo 316 do CPP já produziu “precedentes no Supremo que não podem ser ignorados” pelos integrantes da Corte. Em outro trecho de seu voto, o presidente do STF disse que André do Rap debochou da Justiça e que sua liberdade compromete a ordem pública. “Os estados gastam milhões para recapturar um foragido dessa grandeza criminosa. E aproveitou a decisão para evadir-se imediatamente, cometendo fraude processual ao indicar endereço falso. Debochou da Justiça, debochou da Justiça”, disse o ministro. Por fim, Fux ressaltou que havia se comprometido em não interferir nas decisões liminares concedidas por outros ministros, mas que levou a análise do caso ao plenário por “deferência ao colegiado”. “Sob um ângulo do desgaste, é melhor deixar o relator pagar o preço judicial da sua liminar. Mas o presidente do Supremo Tribunal Federal tem que velar pela Corte”, disse. Segundo ministro a votar, Alexandre de Moraes acompanhou o entendimento de Fux e destacou que o caso de André do Rap não envolve, apenas, uma prisão preventiva, mas, sim, “uma dupla condenação em segundo grau num total de 25 anos”. “Além disso, continua sendo investigado por outros delitos”, acrescentou.
No primeiro voto da sessão desta quinta-feira, a ministra Cármen Lúcia seguiu o entendimento do ministro Luiz Fux e ressaltou que o descumprimento do artigo 316 não dá direito à soltura automática. O segundo a votar foi o ministro Ricardo Lewandowski, que chamou de “totalmente descabida” a decisão de Fux de cassar a liminar concedida pelo ministro Marco Aurélio Mello, por acreditar que o presidente da Corte não pode cassar decisões de seus pares. Em outro trecho, Lewandowski ressaltou que o artigo 316 do CPP, aprovado “em bora hora” pelo Congresso, “muito contribuirá para diminuir o aumento exponencial da população carcerária, em sua maioria negra e parda, que atualmente supera a espantosa cifra de 700 mil presos, segundo informa o Conselho Nacional de Justiça, os quais sobrevivem amontoados em jaulas inapropriadas até para animais de zoológico”. Apesar de ter criticado a decisão de Fux, Lewandowski votou pela prisão de André do Rap. “Reconhecendo a boa-fé e o empenho do nosso presidente da Corte, não conheço da presente suspensão de liminar. Acompanho a ministra Rosa Weber para referendar a decisão, restringindo-me às peculiaridades do caso concreto”, disse.
Gilmar Mendes afirmou que a soltura de André do Rap foi resultado de um “festival de erros, equívocos e omissões”. Em seu voto, o ministro disse que é “bastante constrangedor o fato de a PGR ter se quedado inerte em apresentar qualquer impugnação nos autos do HC de terça-feira [data da concessão da liberdade de André do Rap] até o fim do dia de sexta-feira” – o líder do PCC foi solto no sábado pela manhã. Gilmar Mendes também endossou o entendimento do ministro Ricardo Lewandowski e destacou que a possibilidade de o presidente do STF cassar liminar de outro integrante da Corte é “manifestamente incabível”. Apesar da crítica quanto à cassação de liminar, Gilmar acompanhou o voto de Fux.
Ao término do voto de Gilmar, o presidente do Supremo reiterou que entende que sua decisão deve ser “excepcionalíssima” e que não tem “nenhuma pretensão de ter superpoderes” à frente da Corte, mas de “manter a imagem do Supremo Tribunal Federal”. O ministro disse, também, que se não tivesse cassado a liminar, estaria dando “embasamento para a fuga” do líder do PCC.
Último a votar, o ministro Marco Aurélio Mello fez duras críticas à decisão de Fux, que cassou sua liminar. Para o decano, Fux assumiu uma postura autoritária ao derrubar sua decisão. O ministro iniciou seu voto reafirmando que a base para concessão do habeas corpus “foi a existência de um quadro a revelar, segundo o ditame da lei, ilegalidade”. O decano da Corte também citou que o artigo 316 do Código de Processo Penal (CPP) foi aprovado para evitar prisões preventivas alongadas por tempo excessivo. O ministro voltou a dizer que a cassação de sua liminar pode promover uma “verdadeira autofagia” no Supremo. “O que está em jogo neste julgamento é saber se o presidente pode tirar do cenário jurídico uma tutela de urgência implementada por um par, personificando o Supremo. Isto é que se está em jogo aqui. Cabe ao tribunal, em primeiro lugar, dizer se isso é possível”, afirmou. “Se alguém falhou, não fui eu. Não posso ser colocado como bode expiatório”, acrescentou Marco Aurélio Mello, se referindo ao fato de não ter havido manifestação do juiz do caso e do Ministério Público quanto à manutenção da prisão preventiva de André do Rap. Em outra crítica endereçada a Fux, o decano disse que o presidente do Supremo não pode ser “censor” de seus pares. “O presidente é o primeiro entre os pares, mas é igual em termos de atuação judicante”, resumiu. “Não havia campo para ter-se o acolhimento da suspensão da liminar implementada, não pelo cidadão Marco Aurélio, mas pelo próprio Supremo, sob pena de não haver o buscado entendimento no âmbito do próprio tribunal”, prosseguiu. “Apenas a vaidade do presidente ganha [com a cassação da decisão de outro integrante]. O colegiado não ganha”, afirmou em outro momento. “Voto no sentido de inadmitir a possibilidade, seja qual for o presidente, de ele cassar individualmente decisão de um integrante do tribunal”, encerrou.
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