Oposição prepara ofensiva para barrar descriminalização do porte de drogas
Na Câmara e no Senado Federal, parlamentares falam em ‘invasão de competência do Poder Legislativo’ e articulam o envio de ofício e apresentação de um Projeto de Decreto Legislativo
A retomada do julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 635659 pelo Supremo Tribunal Federal (STF), com o voto do ministro Alexandre de Moraes, mobiliza uma ofensiva de parlamentares da oposição para barrar a possível descriminalização do porte de drogas para uso pessoal. Entre os congressistas, surgem duas saídas para reverter (ou impedir) a mudança de entendimento sobre a Lei de Drogas (13.343/06). Na Câmara dos Deputados, a Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado aprovou um requerimento do presidente do colegiado, o deputado federal Ubiratan Sanderson (PL-RS), para que seja realizada uma audiência pública sobre os “reflexos na segurança pública” da descriminalização do porte de drogas para consumo próprio. Além disso, a comissão decidiu pelo envio de um ofício para que o STF suspenda o julgamento do tema até que a audiência seja realizada, “tendo reflexo direto na segurança pública do país, além de acarretar em grave prejuízo para a saúde pública”, afirma o autor do requerimento, em documento encaminhado ao site da Jovem Pan.
No rol do Senado Federal, a movimentação caminha em outro sentido. Enquanto os deputados se mobilizam para adiar o julgamento no plenário do Supremo, na Casa Alta, os parlamentares articulam a apresentação de um Projeto de Decreto Legislativo (PDL) contra a liberação do porte. Para isso, os senadores devem aguardar o término do julgamento no Supremo. À reportagem, o senador Jorge Seif (PL-SC), vice-líder do Partido Liberal (PL) no Senado, celebrou que o próprio presidente do Congresso Nacional, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), já sinalizou em que a Casa vai “para cima”. “Pacheco tem tomado algumas posturas importantes, até para elevar o moral do Senado e retornar o status de Poder da República, porque tínhamos perdido protagonismo para o Supremo. Então, vejo toda condição do mundo de fazermos um PDL. Não se cancela ação do STF, mas podemos sustar os efeitos. Será esse o caminho”, afirmou o parlamentar, que vê o tema certamente ser encabeçado pela oposição “tão logo finalize a votação” no Judiciário. A fala ocorre após Pacheco classificar como um “equívoco grave” e uma “invasão de competência do Poder Legislativo” a possibilidade de descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal.
“Ao se permitir ou ao se legalizar o porte de drogas para uso pessoal, de quem se irá comprar a droga? De um traficante de drogas, que pratica um crime gravíssimo, equiparado a hediondo”, disse o político mineiro, que cobrou dos ministros do STF a compreensão do papel da arena política. Outros senadores também entendem que, ao decidir pela liberação do porte de drogas, o Supremo estará “legislando”. “Se vocês [ministros] tiverem a audácia de fazer isso, vou protocolar um projeto para poder derrubar esse escárnio […]. Quem faz a legislação aqui, quem é o representante do povo, somos nós. E o povo brasileiro, lhes garanto que mais de 80%, até 90%, é contra drogas”, argumentou o senador Cleitinho (Republicanos-MG). Caso a descriminalização seja aprovada, ele irá protocolar um projeto para derrubar a decisão. Além disso, questiona o que deve acontecer com o Brasil caso as drogas sejam legalizadas. “Pode comprar droga no supermercado? Pode comprar droga na farmácia? Onde compra? Com ela descriminalizada, onde é que compra? Só vai fortalecer mais ainda o tráfico”, acrescentou.
Como o site da Jovem Pan mostrou, na última quarta-feira, 2, o plenário do Supremo retomou a análise de recurso apresentado pela Defensoria Pública contra a prisão em flagrante de Francisco Benedito de Souza, que portava 3 gramas de maconha dentro de Centro de Detenção Provisória. Na prática, o Supremo analisa a constitucionalidade do Artigo 28 da Lei das Drogas (Lei 11.343/2006). Até o momento, a Corte soma pelo menos quatro votos favoráveis a algum tipo de liberação. Para formar maioria, são necessários mais três dos sete votos futuros — cenário que aponta para a iminente decisão pró-liberação. Dos quatro ministros que já se manifestaram, três entendimentos se destacam: o primeiro foi apresentado pelo relator, ministro Gilmar Mendes, em 2015, com sinalização favorável à descriminalização de todos os tipos de drogas.
Abrindo divergência, ainda naquele ano, o ministro Luis Roberto Barroso se posicionou favorável à liberação do porte exclusiva para usuários de maconha, defendendo o estabelecimento de um critério para diferenciar consumo de tráfico. Com isso, ele propôs a descriminalização do porte de até 25 gramas ou a plantação de até seis plantas fêmeas. Por sua vez, o ministro Edson Fachin considera a regra inconstitucional exclusivamente em relação à maconha, mas entende que os parâmetros para diferenciar traficantes de usuários devem ser fixados pelo Congresso Nacional. Já o ministro Alexandre de Moraes, o primeiro a votar após a retomada do julgamento, também propôs a fixação de um critério nacional, exclusivamente em relação à maconha, sendo de 25 a 60 gramas ou seis plantas cannabis fêmeas.
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