PF diz que Milton Ribeiro cometeu ‘façanha criminosa’ no MEC e dava ‘prestígio’ à atuação dos pastores

De acordo com a investigação, há pelo menos três indícios de pagamento de propina envolvendo a esposa do ex-ministro, um ex-assessor da pasta e o genro de um dos pastores lobistas

  • Por André Siqueira
  • 23/06/2022 19h03 - Atualizado em 23/06/2022 19h06
LUCIANO FREIRE/PHOTOPRESS/ESTADÃO CONTEÚDO Ministro da Educação, Milton Ribeiro, durante coletiva do INEP Milton Ribeiro foi preso na quarta-feira, 22, pela Polícia Federal

A Polícia Federal (PF) afirma que o ex-ministro Milton Ribeiro cometeu um “façanha criminosa” no Ministério da Educação (MEC) e deu “prestígio” à atuação dos pastores Gilmar dos Santos e Arilton Moura, acusados de cobrar propina para facilitar o repasse de verbas da pasta para os municípios. No documento enviado à Justiça Federal, a corporação cita a suposta prática dos crimes de corrupção passiva privilegiada, prevaricação, advocacia administrativa e tráfico de influência. Por isso, a PF solicitou a prisão preventiva de Ribeiro, Moura, Santos e de outras duas pessoas. O pedido foi acatado pelo juiz Renato Borelli, da 15.ª Vara Federal Criminal do Distrito Federal. Na tarde desta quinta-feira, 23, o desembargador Ney Bello, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), determinou a soltura dos investigados.

“Os fatos acima informados não deixam dúvidas da façanha criminosa de Milton, Gilmar, Arilton, Helder e Luciano, em utilizarem o prestígio da administração pública federal para suposta pratica dos crimes capitulados corrupção passiva privilegiada (§2º do art. 317), prevaricação (art. 319), advocacia administrativa (art. 321) e tráfico de influência (art. 332). Aproveito o ensejo para adicionar à capitulação o crime de Organização Criminosa, Lei 12.850/13, pois é factível que os investigados estavam estruturalmente organizados e cada um atuando com divisão de tarefa”, diz um trecho do documento.

De acordo com a investigação, há pelo menos três indícios de pagamento de propina. Um deles foi a venda de um veículo, Kia Sportage, pela esposa de Milton Ribeiro, Myriam Ribeiro, para a filha de Moura, pelo valor de R$ 60 mil, além de extratos bancários que comprovam transferências de Luciano Freitas Musse, à época gerente de projetos do Ministério da Educação, para Helder Diego da Silva Bartolomeu, genro de Arilton Moura. Musse e Bartolomeu também foram presos – a dupla é suspeita de ter recebido propina dentro do esquema. Em outro trecho do relatório, a Polícia Federal afirma que Milton Ribeiro “conferia o prestígio da administração pública federal à atuação dos pastores Gilmar e Arilton”.

“As camadas de atuação são perceptíveis e individualizam perfeitamente as condutas, sendo o ex-ministro da Educação quem conferia o prestígio da administração pública federal à atuação dos pastores Gilmar e Arilton, conferindo aos mesmos honrarias e destaque na atuação pública da pasta, até mesmo, internamente, nas dependências da sede do Ministério da Educação, e, sobretudo, nos eventos onde os pastores faziam parte do dispositivo cerimonial”. “A infiltração de Luciano nos quadros de servidores da pasta demonstra a sofisticação da atuação agressiva da ORCRIM, que indica desprezo à probidade administrativa e fé pública. Helder teve sua conta utilizada para receber propina e também viajou com a comitiva dos pastores”, segue a corporação.

Como a Jovem Pan mostrou, o Ministério Público Federal disse à Justiça Federal que os supostos crimes cometidos dentro do MEC foram praticados com o respaldo do ex-ministro Milton Ribeiro. “Com efeito, as provas colhidas e já documentadas apapontam para a prática dos crimes de corrupção ativa, tráfico de influência, prevaricação e advocacia administrativa, todos em contexto de Organização Criminosa. Como bem apontado pela Autoridade Policial, os crimes ora investigados foram praticados no âmbito do Ministério da Educação, ao que tudo indica, com o respaldo do então Chefe da Pasta – Milton Ribeiro”, diz o parecer da procuradora Carolina de Oliveira. “As provas carreadas aos autos demonstram a articulação da ORCRIM para utilizar verbas públicas em contrapartida a benefícios próprios. Como bem apontado pela Autoridade Policial, tratam-se de pessoas influentes, com vasto conhecimento no âmbito político, que podem vir a usar seus conhecimentos para atrapalhar as investigações. Os autos estão instruídos com elementos documentais que revelam, com efeito, a existência de fumus comissi delicti, devendo ser resguardado a garantia da ordem pública e a efetividade da instrução criminal”.

Apesar do parecer, a procuradora foi contra a prisão preventiva de Milton Ribeiro e dos pastores Arilton Moura e Gilmar dos Santos. Ela defendeu a imposição de medidas cautelares contra os investigados, como a proibição de comparecerem ao MEC, de manterem contato entre si e de deixarem o país. A investigação contra Ribeiro e a dupla de pastores foi aberta após o jornal O Estado de S. Paulo revelar a existência de um “gabinete paralelo” dentro do Ministério da Educação. Na sequência, o jornal Folha de S. Paulo divulgou um áudio no qual Ribeiro afirmava que, a pedido do presidente Jair Bolsonaro, repassava verbas a municípios indicados por Gilmar dos Santos.

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