Transnístria, o enclave rebelde na Moldávia que sonha em ser parte da Rússia

  • Por Agencia EFE
  • 18/04/2014 06h44
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Raúl Sánchez Costa.

Tiraspol (Transnístria, Moldávia), 18 abr (EFE).- O enclave pró-russo da Transnístria, uma espécie de museu vivo sobre a época soviética situado entre a Moldávia e a Ucrânia, sonha em se transformar parte da Rússia seguindo a esteira da anexação em março da península ucraniana da Crimeia por parte de Moscou.

A Transnístria se autoproclamou independente após uma curta, mas cruel guerra com a Moldávia há 22 anos e, desde então, se encontra em um limbo geral, no qual a saudade pelos tempos nos quais fez parte da União Soviética não passa despercebida.

A foice e o martelo estão por as todas partes na capital, Tiraspol, inclusive no escudo e na bandeira, a temida polícia secreta segue chamando-se KGB e o Parlamento é o Soviete Supremo.

A região separatista surgiu com a desintegração da URSS, mas nunca conseguiu ser reconhecida por nenhum Estado, nem sequer pela Rússia, que tem ali 1.600 soldados, declarados como forças de pacificação encarregadas de custodiar antigos arsenais soviéticos.

Uma terceira parte de seu meio milhão de habitantes são moldávios de língua romena, outro terço russos e o resto ucranianos.

Em 2006 foi realizado um referendo similar ao da Crimeia no qual 97,2% dos eleitores optaram pela independência e a adesão à Rússia, apesar de não ter fronteira comum, embora ninguém tenha reconhecido a consulta e nem sequer Moscou tenha reagido ao resultado.

“Queremos a independência e depois decidir que caminho tomar”, explicou à Agência Efe o ex-ministro das Relações Exteriores, Vladimir Yastrebchak, em uma cafeteria entre o Parlamento e a presidência, duas instituições perante as quais há uma imponente estátua de Lênin.

Embora o apoio à Rússia seja majoritário, muitos opositores criticam a falta de liberdade e um modelo econômico baseado no clientelismo, no contrabando e na corrupção.

“A Transnístria depende das receitas do gás que é importado de graça da Rússia”, declarou um jovem opositor que não quis revelar seu nome porque já teve problemas com as autoridades pró-Rússia.

Parte desse gás é revendido a preços de mercado à Moldávia, o que representa um dos pilares da economia do território, que depende também da ajuda financeira direta de Moscou, segundo explicaram à Efe fontes da missão da OSCE na Moldávia.

Os preços do gás e da eletricidade são muito baixos e as pensões 25% superiores às da Moldávia, o país mais pobre da Europa, com uma aposentadoria média de 70 euros por mês. Essas são algumas das razões da fidelidade da população à Rússia.

No entanto, o jovem opositor denunciou que “a repressão, a corrupção e o contrabando dominam este território sob o regime imposto por pseudocomunistas” que vivem gastando muito enquanto a grande maioria está na miséria.

O grupo empresarial Sheriff, próximo ao poder, controla uma parte importante da economia do território, com cadeias de postos de gasolina, restaurantes, supermercados e construtoras, entre outros negócios.

O maior emblema do grupo empresarial é o luxuoso estádio em Tiraspol de seu time de futebol, também chamado Sheriff, que disputa o Campeonato da Moldávia – foi campeão em 12 ocasiões nos últimos 14 anos- e participou deste ano na Liga Europa.

As autoridades pró-Rússia não outorgam licenças de emissão aos canais moldávios, por isso que só são sintonizadas emissoras russas, ucranianas e duas locais, uma pública e outra do grupo Sheriff.

Outro motor econômico é o tráfico de tabaco e álcool em grande escala, denunciado em um relatório de 2012 do Parlamento Europeu, o que causa grandes perdas às economias dos países vizinhos.

Esse relatório da Eurocâmara também apontava que o crime organizado está presente na região em atividades como o tráfico humano, de veículos roubados, de armas e, em menor medida, de drogas.

No território rebelde ficou após a desintegração da URSS um arsenal de 40 mil toneladas de armamento, embora o primeiro-ministro da Moldávia durante 1990 e 1991, Mircea Druc, sustente que “a maior parte já desapareceu”.

“E o que permanece está caduco”, acrescentou em declarações à Efe.

A OSCE calcula que ainda hoje restam 20 mil toneladas de armamento.

Desde que explodiu a crise na Ucrânia, Tiraspol negou a entrada a jornalistas ucranianos por medo de um contágio dos protestos de Kiev e fechou oito fóruns de internet onde os usuários expressavam livremente sua opinião.

“Agora resta observar o que acontecerá em algumas cidades ucranianas como Odessa”, com uma grande população de origem russa e a apenas cem quilômetros de Tiraspol, afirmou Druc.

A população de Transnístria segue com interesse a situação na vizinha Ucrânia, enquanto a possibilidade de viajar sem vistos pelo espaço Schengen com um passaporte moldávio a partir de 28 de abril abriu novos horizontes.

“A Transnístria ficará vazia se terminar por se integrar à Moldávia”, declarou à Efe Gabriela Cervinschi, uma estudante que pretende emigrar para Europa quando conseguir o passaporte moldávio.

“Uns não suportarão estar sob as ordens de pró-europeus (e irão para Rússia) e outros tentarão ir para o Ocidente”, previu. EFE

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