Barbosa deixa o Supremo Tribunal Federal; veja as implicações

  • Por Jovem Pan
  • 02/07/2014 12h04

Reinaldo, Joaquim Barbosa deixa o Supremo. Que balanço você faz de sua atuação?

Vamos ver. Ainda que o tenha feito por vontade e determinação pessoal, muita gente suspira aliviada, nem tanto porque se sentisse ameaçada por ele – não havia como ameaçar ninguém -, mas porque se sentia traída. Assim: a gritaria contra Barbosa – não a crítica justa, que pode ser feita – corresponde a uma algaravia de interesses contrariados e a ódios que traduzem nada mais do que má consciência.

O meu blog existe há oito anos. O arquivo está disponível a quem queira consultá-lo. Nunca fui e não sou um fã nem do estilo nem de algumas ideias de Joaquim Barbosa. Acho que seu temperamento um tanto irascível o atrapalhou – e à necessária harmonia dos trabalhos no tribunal – mais de uma vez. Não concordo também, e já evidenciei isso aqui, com algumas de suas teses sobre racismo – o que, e não me sinto obrigado a provar, nada tem a ver com a cor da sua pele e a da minha.

Mas esperem aí: a gritaria que se armou contra Barbosa se deveu a seu temperamento? Ou ao eventual descumprimento de rituais processuais ou mesmo ao entendimento prejudicado desse ou daquele princípios? Uma ova. A máquina de desqualificação montada pelo petismo e por outros setores da esquerda o atacou em razão de suas virtudes, não de seus eventuais defeitos. É mentira que o julgamento do mensalão tenha recorrido a instrumentos de exceção. É mentira que tenha sido ele – e nem poderia – a manipular tais instrumentos. É mentira que tenha usado com petistas uma régua e um conjunto de regras particulares. Isso tudo é obra da guerra política mais rasteira.

O fato é que os petistas tentaram – e um mensaleiro chegou a vocalizar isto – cobrar de então ministro uma espécie de dívida. Já que Lula teria levado o primeiro negro para o Supremo (é mentira: antes, houve Pedro Lessa e Hermenegildo de Barros), que este então lhe fosse grato, votando conforme as vontades e as necessidades do PT. E, como é sabido, Barbosa não caiu no truque. O ex-deputado João Paulo Cunha, o mensaleiro condenado, não teve vergonha nenhuma de dizer publicamente: “Barbosa chegou ao Supremo porque era compromisso nosso, do PT e do Lula, reparar um pedaço da injustiça histórica com os negros”.

Entenderam a alma profunda de um petista? Já que Lula levou um negro para o Supremo, a melhor maneira que esse negro tem de demonstrar que é livre é violando a sua própria consciência para ser grato a quem o indicou.

Assim, tudo somado e subtraído, com agravantes e atenuantes (para fazer uma blague…), o saldo da passagem de Barbosa pelo Supremo lhe é amplamente favorável e também ao país. Num dado momento, uma poderosa coordenação de forças atuou de modo deliberado para desmoralizar o Supremo e o Judiciário como um todo, alvos permanentes de correntes autoritárias que estão no poder em vários países da América Latina.

Lula é hoje um desafeto pessoal de Barbosa porque descobriu que este acabou se tornando o homem certo, no lugar certo e no momento certo – sempre levando em conta os interesses do país, não os do próprio Lula e do PT. O tempo dirá que não conseguiremos dizer o mesmo de muito engomadinho de fala mansa. Arroubos de temperamento podem ser controlados. Rombos de caráter não têm cura. Joaquim Barbosa fez o seu trabalho com dignidade.

 

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