CPI fez um trabalho importante, independentemente do nome de seu presidente e do relator

Calheiros afirmou que “a história não perdoa os omissos e condenará os covardes”; é verdade, convém não esquecer que a frase foi dita por Renan Calheiros, com mais de 10 processos de corrupção nas costas

  • Por Álvaro Alves de Faria
  • 21/10/2021 07h51
Roque de Sá/Agência Senado Omar Aziz e Renan Calheiros na bancada da CPI Relatório de Renan Calheiros foi lido nesta quarta-feira, 20, e pediu o indiciamento de 66 pessoas e duas empresas

Foi um dia triste para o Brasil. Confesso que escrevi muito aqui chamando a CPI de circo. Eram episódios pontuais. Mas confesso também, agora, que a CPI fez um ótimo trabalho para este país, independentemente do nome de seu presidente e de seu relator. Foi um dia triste para este país. Não me venham os alucinados me dizer que tudo aquilo foi uma grande mentira. Não foi, não. A CPI juntou provas consistentes de crimes cometidos durante a pandemia que mostram bem a cara do Brasil e de alguns personagens que nunca desaparecem. Quer dizer que tudo aquilo é mentira? Uma óva! Mesmo descontando os exageros e os iluminados à luz dos holofotes e a mediocridade dos argumentos dos defensores do governo, as provas conseguidas contra verdadeiros bandidos são consistentes demais para serem contestadas. Ao ler um resumo do relatório na sala da CPI, o relator Renan Calheiros afirmou que “a história não perdoa os omissos e condenará os covardes”. É verdade, convém não esquecer que a frase foi dita por Renan Calheiros, com mais de 10 processos de corrupção nas costas. Sim. Mas a frase é absolutamente verdadeira.

Os crimes que a CPI descobriu com uma investigação responsável são assustadores. Os ladrões do país agem até quando milhares de brasileiros estão morrendo nas portas dos hospitais. As mortes pouco importavam e eram comentadas com deboches, com total descaso do governo federal que preferia chamar de ‘maricas’ a população que tinha medo do vírus em vez de agir como agiram e ainda agem governantes do mundo inteiro. Foi um dia triste. Não venham, por favor, os inocenteis úteis discursar nos meus ouvidos essas palavras em defesa dos bandidos, dizendo que as conclusões da CPI da Covid são apenas mentiras escandalosas. Não são. Vamos ser sérios por alguns minutos, depois voltaremos ao normal. Vamos ser sérios: a CPI fez um trabalho importante para mostrar a cara de um país afundado num lodaçal sem tamanho, com autoridades com as mãos sujas de deboches e dignidade nenhuma.

Ao saber do relatório da CPI da Covid, o filho do presidente, senador Flávio Bolsonaro (Patriotas), em Brasília, pediu licença aos jornalistas para dar uma gargalhada imitando seu pai. Tomou fôlego e deu: “Quá! Quá! Quá!”. E disse que seria assim que seu pai reagiria no Ceará, no município de Russas, onde estava. Bolsonaro, seus três filhos políticos, ministros, ex-ministros, deputados federais estão na lista dos pedidos de indiciamento. Ao saber dos crimes que lhe são atribuídos, o presidente afirmou que não tem culpa de absolutamente nada e que seu governo “fez a coisa certa desde o começo de tudo”. E mais tarde, já em Brasília, em cerimônia no Palácio do Planalto, Bolsonaro dirigiu-se ao presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luiz Fux, para dizer que é bom estar entre amigos. Adiantou que grande parte desses amigos pertence ao Poder Judiciário. Afirmou, ainda, que o Judiciário representa uma grande parcela de nossa democracia, nossa cidadania e nossa liberdade. Foi um dia triste para o Brasil, esta quarta-feira, 20, o final da CPI. No final de tudo, restou duas cenas assombrosas: de uma lado, uma intensa gargalhada, de outro, muitos cemitérios com pequenas cruzes azuis com mais de 600 mil mortos que nunca merecerão nenhuma consideração de um governo distante. 

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