Governo precisa avançar na aquisição de vacinas para evitar que imunização se arraste até 2024

Principal problema do Brasil é mesmo a falta da vacina e alguém tem que ser responsabilizado por isso; fora a logística e o planejamento, o Brasil conta ainda com problemas burocráticos inimagináveis

  • Por Álvaro Alves de Faria
  • 09/02/2021 13h47 - Atualizado em 09/02/2021 13h49
DANIEL RESENDE/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO Ministério da Saúde diz ter 354 milhões de doses, número suficiente para vacinar 83% da população

Não é possível e, principalmente, não é honesto “esconder” notícia da população. Esse tempo já passou. Num Estado democrático, as pessoas têm direito à informação. É muito noticiário sobre a vacinação. A situação mostra-se dramática pelo simples motivo de faltar vacina. O Brasil, seguindo a política do descaso, deixou de fazer o que era preciso. Não comprou a vacina quando os laboratórios internacionais ofereceram. Os países mais ricos compraram tudo pensando no futuro. Fizeram o que tinham de fazer, em vez de zombar do vírus e menosprezar a doença por Covid-19. De acordo com os cientistas que estão à frente dessa guerra contra a doença, a continuar no ritmo que está, o Brasil só concluirá a vacinação de 70% da população em 2024. Isso mesmo: 2024. A não ser que a conduta do governo federal mude em relação à Covid-19. Caso contrário, o destino é esse mesmo. Só se fala em vacina, vacina, vacina. Mas onde estão as vacinas? No entanto, segundo os cientistas, mesmo com esse descaso, há ainda espaço para mudar esse desempenho deplorável diante de um mal que já matou mais de 230 mil só no Brasil. Será preciso avançar de maneira agressiva na aquisição de vacinas. E o governo tem de fazer funcionar como se deve o Programa Nacional de Imunização (PNI), com planos corretos para enfrentar a falta de vacinas que deixou de comprar por motivos condenáveis.

Não havendo o número de vacinas desejável, o PNI praticamente parou porque não tem o que fazer. Está com as mãos atadas por culpa de uma conduta relapsa, que pouca importância deu ao aparecimento do vírus e zombou abertamente contra o que ia acontecendo a cada dia. Até esta terça-feira, 9, o Brasil vacinou 1,79% de sua população. Mesmo assim, está melhor que outros países latino-americanos que vacinaram menos, caso da Argentina, México e Chile, mas aqui estamos tratando do caso do Brasil. Os países que levaram a doença a sério já vacinaram 70% de sua população 2021, caso dos Estados Unidos, Emirados Árabes, Reino Unido e Israel, entre outros, de acordo com dados do projeto Our World In Data, da Universidade de Oxford. O cenário atual preocupa os organismos multilaterais, como a Organização Mundial da Saúde. Isso significa que os países em desenvolvimento estão isolados diante da doença que mata cada vez mais. O principal problema do Brasil é mesmo a falta da vacina. E alguém tem que ser responsabilizado por isso. Mas fora a logística e o planejamento, o Brasil conta ainda com problemas burocráticos inimagináveis. Basta dizer que das 10 milhões de vacinas disponibilizadas para o SUS, somente 3 milhões foram aplicadas até sexta-feira, 5. Desde o dia da primeira vacinação, o Brasil tem aplicado até agora somente 165 mil vacinas por dia. É um ritmo bem aquém da capacidade, no dizer do professor da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, José Cássio de Moraes. Ele garante que o Brasil pode vacinar tranquilamente 2 milhões de pessoas por dia, observando que o processo tem de ser agilizado.

Já o presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações e médico do Hospital das Clínicas de Porto Alegre, Juarez Cunha, assegura que hierarquizar os grupos a serem vacinados torna o processo cada vez mais lento. E existe, ainda (vejam vocês!), o problema dos chamados fura-filas. Pode uma coisa assim? É vergonhoso. Outro problema é que alguns estados e municípios estão guardando as vacinas para a segunda dose. É só problema. Tudo é problema. Mesmo diante de um cenário assim melancólico, o Ministério da Saúde se mostra otimista, garantindo que dispõe de 354 milhões de doses, suficientes para vacinar 83% da população. Ocorre que esses números fazem parte de contratos que ainda necessitam ser honrados. O Ministério se mostra otimista, mas não sabe informar uma data específica para a vacinação que seja, pelo menos, razoável. A situação atual é essa. É grave. Tanto que um grupo de empresários e entidades de São Paulo lançou nesta segunda-feira, 8, o movimento Unidos pela Vacina, com o objetivo de facilitar a chegada do imunizante contra a Covid-19 ao Brasil, garantindo que toda a população brasileira estará vacinada até setembro deste ano. O movimento tem à frente a empresária Luiza Helena Trajano. Ela diz que os empresários não querem discutir política nem encontrar culpados para a situação brasileira em relação à vacinação. Preferem inicialmente destravar os problemas do Instituto Butantan, de São Paulo, e da Fiocruz, do Rio de Janeiro. A ordem inicialmente é enfrentar a burocracia do país, diminuindo o tempo de espera para resolver qualquer questão. O movimento fará uma campanha nacional em parcerias com redes de TV, visando reduzir a resistência à vacina, gente que está jogando contra. Na verdade, tem gente jogando contra há muito tempo, pelo menos desde  junho de 2020, quando, com arrogância, o governo brasileiro se negou a encomendar a vacina. Hoje parece quem ninguém sabe de nada. E que novidade há nisso? Nenhuma novidade. No Brasil, as coisas são assim mesmo. O problema vem lá de trás, quando o governo, em vez de agir, preferiu zombar, sempre se colocando contra todas as iniciativas de combate à Covid-19. Estamos colhendo o que plantamos. Mas alguém ainda, algum dia, será responsabilizado por isso. Não pode ser diferente.

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