Como voltei dos 100 kg, a continuação

Cheguei à clínica toda trabalhada na pena de mim mesma e nas desculpas, mas lá me disseram a primeira verdade que mudou minha vida: ‘Querida, você engordou porque comeu’

  • Por Bia Garbato
  • 07/09/2022 08h00
jcomp/Freepik Foto conceitual sobre perda de peso, com balança, fita métrica, frutas e legumes Alimentação regrada e saudável é fundamental para quem deseja perder peso

Depois de ter chegado aos 100 kg e voltado para contar, decidi relatar com mais detalhes como é que isso aconteceu. Quando eu já tinha desistido de perder os muitos quilos que eu havia adquirido nos últimos anos, uma amiga da pesada como eu apareceu mais magra e alegrinha, sacudindo um iogurte zero açúcar, o que, intimamente, me deixou com uma inveja profunda. Ter engordado por conta de remédios para depressão me fez entrar em depressão, e eu não tinha ideia de como sair desse ciclo infernal. Engordei porque deprimi ou deprimi porque engordei? Era assim que eu me justificava quando encontrava alguém que não via há algum tempo: “Pois é, tomei uns remédios que me fizeram engordar”. E fazia cara de coitada. Foi com esse discurso que entrei na tal clínica de emagrecimento que essa mesma amiga indicou, quando eu perguntei qual era a mágica.

Eu já havia tentado algumas dietas à base de gastar fortunas no Mundo Verde, cortar o glúten, a lactose e a felicidade. Eu até perdi 3 kg e cheguei a me achar linda. Anos depois, me dei conta de que a humanidade só perceberia que eu tinha perdido algum peso a partir dos 10 kg. Mas o fato é que comer batata-doce com canela em jejum não foi sustentável por muito tempo e eu voltei para a batata palha de braços abertos. Eu tinha me matriculado na academia e, devido ao advento do personal trainer do bom papo, estava me exercitando para valer. O resultado foi a melhora das minhas taxas de colesterol e de glicemia e das dores nos joelhos, mas nada em quilos ou diminuição do corpinho. Tem gente que engorda no bumbum. E tem gente que engorda na barriga, como eu. São quase espécies diferentes. Ambos acham que estão do lado mais desfavorecido. Eu tenho certeza que estou. Passei a seguir influencers plus size e não me identifiquei nem com elas. Todas com cintura e o corpão contrabaixo. Tudo caindo bem, super sensuais. E eu de bata, disfarçando meu abdômen avantajado com duas perninhas finas embaixo.

Mas, voltando à clínica de emagrecimento. Cheguei toda trabalhada na pena de mim mesma e nas desculpas por eu ter embalofado. Foi então que me disseram a primeira verdade que mudou minha vida: “Querida, você engordou porque comeu”. De fato, os remédios não têm calorias. Mesmo assim, eu fiquei indignada. “Mas eu quaaaaseee não como. Aliás, me alimento superbem. Eu como arroz, feijão, carne, legume, salada, fruta, macarrão, chocolate, pudim, pedra…”. “Pois é, você comeu”. A nutricionista me passou uma dieta bem simples, de se comprar em qualquer supermercado, instruções muito claras e uma balança pequenininha. Eu olhei para ela e pensei: “Eu não caibo aí”. A nutri então disse: “A partir de agora, você vai pesar tudo o que comer”. Oi? “Se tiver 2 g a mais de papaia, você vai jogar fora”. Que desperdício, meu Deus. Lembrei envergonhada que, com essa desculpa, eu comia os restos do prato do meu filho constantemente. A partir daí parei de pensar tanto no que iria comer e segui a regra obstinadamente. A parte que mais me apavorou foi como eu iria me organizar. Como iria separar a minha comida e a da minha família? Como enfrentaria os almoços de domingo? Como ia cozinhar, se preciso de receita para fazer café com leite? Ok, eu tenho alguma habilidade no miojo amanteigado e no arroz com ovo, porque foi o que eu comi nos períodos em que morava sozinha e a grana era curta. Mas isso não entrava na dieta. Por sorte, a Graça, minha parceiraça aqui em casa, super me ajudou nessa.

Aprendi que me programar era o segredo do sucesso. Estar com fome na rua às 16h era certeza de que eu me jogaria no pão de batata. Aprendi que teria que me afastar de programas que me expusessem à comida, tipo um churrasco ou um happy hour, pelo menos no começo. Que a energia para me manter abstêmia era gigante e, depois de uma festinha infantil, a chance de fazer besteira era enorme. Que passar na frente de um fast food significava “fast fod*u”. Percebi que muitas vezes não pensava, botava para dentro. Rápida e ansiosamente. Enchia a cara, literalmente. Eu tinha um diagnóstico: compulsão alimentar. Muita gente vai embora nessa hora. Eu adoro dar nome às coisas. Se tenho um diagnóstico, quer dizer que tenho um tratamento. Afinal, eu prefiro ser compulsiva alimentar do que bola, balofa, Peppa Pig e por aí vai.

Percebi que eu tinha tanta compulsão alimentar que onde estava escrito lua de mel eu lia pão de mel. Que eu não pedia o café, pedia o canudinho de chocolate que vinha junto. Aprendi que dieta não tem feriado e isso é menos ruim do que parece: #cinturinhapáscoasemovo + #natalsemrabanada = #verãosemroupão. As pessoas me falam: “Agora tá bom de emagrecer, né?”. Dá vontade de responder: “Fofa, alguma vez eu disse para você que estava bom de engordar? Não. Então cada um cuida do seu peso corpóreo, por favor”. Emagrecer pode parecer apenas diminuir alguns números da calça. Mas, para mim, foi casar de novo com meu marido, me tornar uma mãe mais disposta, perder o medo de ir a festas, reencontrar os amigos, me sentir capaz de me expressar através da escrita e, o mais importante, retomar o controle da minha própria vida.

*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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