Mulher aventureira: como encarei uns dias em meio à natureza

A paisagem daria ótimas fotos pros stories, mas minha alegria durou pouco

  • Por Bia Garbato
  • 25/04/2024 08h00
Freepik Vista lateral de uma agricultora cavalgando Não sou uma mulher do campo, mas uma viagem ao sítio do meu cunhado fez eu me sentir estranhamente bem

Há muito tempo que eu sei que não sou uma mulher do campo. Desde quando fui para um acampamento e simulei uma dor de barriga para escapar da trilha do Indiana Jones. Na verdade, eu gosto muito de verde, sobretudo da vista de um parque através de uma janela no 18º andar. Foi, então, que o meu cunhado me chamou para passar uns dias no sítio da família dele e achei que era a chance de eu evoluir. Agradeci o convite e fui em busca de um bom chapéu. A casa era bonita e confortável, a paisagem daria ótimas fotos pros stories e, quem sabe, eu seria muito feliz naqueles dias. Só que minha alegria durou pouco. Logo na chegada, minha mala de rodinhas atolou na grama fofa. Comecei a suar tentando salvá-la e levei uma picada de um inseto exótico na ponta do nariz.

Na primeira noite, descobri que, sobre a cama, havia um mosquiteiro. Acordei revigorada, abri os olhos e dei de cara com uma mosca-varejeira pousada do lado de fora do mosquiteiro. Sorri, fazendo a esperta, e, só pra desdenhar, dei um peteleco nela. Só que ela estava do lado de dentro e começou a voar enfurecida, mirando meu cabelo desgrenhado. Soltei um grito e acordei meu marido, que, calmamente, levantou o tecido e liberou a criatura da verdadeira predadora: eu. Fomos nadar no lago. Achei melhor fechar os olhos e me imaginar numa piscina. Em um momento de confiança, resolvi mergulhar. Quando abri os olhos, um peixinho dourado me encarava. Olhei em seus olhos, ele nos meus, me senti em comunhão com a fauna local. Posso jurar que ele piscou pra mim, então acordei do transe e saí nadando até a margem, no estilo cachorrinho descoordenado.

Na volta, fui tomar um banho. De repente, a água diminuiu, esfriou, soltou uma lufada de ar e finalmente gotejou na minha cabeça, nitidamente rindo da minha desgraça. Respirei fundo, me rendi e meti a cabeça na pia, onde a água, muito da sacana, ainda jorrava. Beleza, bora pro Instagram, que isso vai me alegrar. Tirei uma foto linda com aquele cenário todo atrás. Vou postar, só pra fazer pinta de aventureira. Peraí, internet? Aí já é pedir demais. O 3G pega depois da sétima figueira. E a coragem de ir até lá? Lá pelas tantas, percebi que havia uma pinta, da qual não me lembrava, ao lado do meu umbigo. Reparando bem, ela estava descolando em um dos lados. Refleti: “Isso não pode ser bom”. Não pensei duas vezes. Meti um band-aid em cima dela. No dia seguinte, resolvi dar uma espiada. Olhei mais de perto e, que bizarro!, a pinta tinha patinhas. Mostrei pra minha irmã, que se acabou de rir. Eu estava cultivando um carrapato.

Apesar de tudo, para minha surpresa, do meio pro fim comecei a me sentir estranhamente bem. Me peguei admirando as plantas da vasta vegetação; ousei subir em uma goiabeira e morder a fruta sem medo de encontrar um bicho; me emocionei com o nascimento de um potrinho; me orgulhei de saber diferenciar um sabiá de um bem-te-vi; admirei a beleza do céu e até boiei no lago. Mas, principalmente, pisei na terra com satisfação. E olha que eu fui criada no carpete. Chegada a hora de voltar, lá no fundo eu não queria. No carro, consegui finalmente postar uma foto. A legenda? #amante_da_natureza #meninadomato #semfiltro.

*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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