Ser ou ser visto? Que histórias estamos nos contando fora dos stories?

Guardar partes que consideramos imperfeitas não é privilégio de quem tem questões mentais

  • Por Bia Garbato
  • 26/04/2023 09h00 - Atualizado em 22/06/2023 21h00
Reprodução/Fotos gratuitas Pessoa posa para foto Jovem tira foto para ser postada em rede social

Recentemente, contei sobre a minha bipolaridade nesta coluna. Quando entrei no site e vi meu nome junto da palavra “bipolar”, parei por uns instantes. Fui buscando o que eu estava sentindo no rol dos sentimentos: frio na barriga, alegria, vergonha, orgulho, arrependimento… Não. Não era nada disso. O que eu senti foi o prazer de ver, do lado de fora, quem eu sou por dentro. A verdade é que guardar partes que consideramos imperfeitas não é privilégio de quem tem questões mentais. Será que conseguimos viver um encontro incrível, com pessoas queridas, ou a emoção de estar em um lugar lindo, sem sacar o tijolinho do bolso e eternizar aquele momento? Ou, pelo menos, disponibilizá-lo por 15 segundos numa rede social? O curioso é que a ideia não é mais registrar o momento para compartilhá-lo com quem estava presente. Nem mesmo para dividir a alegria com quem ficará, certamente, feliz por nós. A ocasião especial é registrada, justamente, para compartilhar com os que não estavam. E aquela foto pode não gerar um sentimento bom, afinal, sejamos honestos: a inveja anda mais em alta do que a empatia.

Um exemplo, para ilustrar: está aquele calor infernal e estamos numa fila interminável para… Qualquer lugar, não importa. Certamente estamos olhando para baixo, para o nosso telefone (ainda se chama assim?). Paramos um pouquinho pra ver a foto daquele conhecido, em uma cachoeira (bonita, hein… Chapada?), emagrecido, com amigos rindo em volta. Só que, na verdade, não são amigos, mas, sim, pessoas que estão esperando, ansiosamente, a vez de entrar embaixo d’água. E não é porque o sol estava iluminando aquela cena como um flash, que o “modelo” não ficou o tempo todo tenso, não só por estar puxando o umbigo pra dentro, mas pra segurar a sunga que insistia em escorregar. E, ao sair da cachoeira, não deu pra ver na foto, mas bateu um ventinho frio de deixar a boca roxa e os pelos das costas pra cima, o que gerou um arrependimento danado de ter entrado naquela água gelada. E é exatamente nesse momento que entra a foto, para aquecer o coração ao saber que podemos estar batendo os queixos, enrolados numa toalha previamente molhada, mas o nosso perfil, seja o do rosto ou o das redes sociais, está cada dia mais bonito. O fato é que, muito melhor do que o prazer de saber que te invejaram, é o de te admirarem pela coragem de ser quem você é. Eu recomendo.

*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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