Assédio no trabalho: como lidar com esse problema que só aumenta?

Nos últimos anos, houve um aumento do número de denúncias, com exceção de 2020, devido ao impacto da pandemia nas relações corporativas

  • Por Claudia Abdul Ahad Securato
  • 12/08/2022 10h00
Freepik Mulher chora e põe a mão no rosto após ser abordada com rispidez por um colega de trabalho Muitos assédios morais sucedem tentativas de assédios sexuais que não foram correspondidas pela vítima

O Ministério Público do Trabalho (MPT) recebeu, nos primeiros seis meses deste ano, 300 denúncias de casos de assédio sexual em empresas públicas e privadas. Em todo o ano anterior, esse número foi de 474. De acordo com levantamento divulgado pelo MPT, desde 2018 foram 2.010 casos de assédio sexual denunciados. O número de queixas sobre assédio moral é ainda maior: foram recebidas 3.309 denúncias, além de 1.103 inquéritos.  A procuradora Adriane Reis de Araújo, da Coordenadoria Nacional de Promoção de Igualdade de Oportunidades do MPT, aponta que, nos últimos anos, houve um aumento do número de denúncias, com exceção de 2020, devido ao impacto da pandemia nas relações de trabalho. Na opinião da procuradora, esse aumento se deve ao fato de as pessoas conhecerem um pouco mais são os assédios morais e sexuais, bem como pelo fato de terem percebido que essa  prática é muito nociva e não pode ser tolerada dentro do ambiente corporativo.

É válido destacar que o assédio sexual pode ser classificado de duas formas: (i) assédio sexual por promessa de favorecimento, o qual consiste em prometer à trabalhadora ascensão profissional caso ela ceda aos interesses sexuais do assediador; ou (ii) assédio sexual por chantagem, que consiste em comunicar, de maneira expressa ou implícita à trabalhadora, que essa poderá perder o seu emprego ou sofrer algum tipo de retaliação se recusar-se a anuir às investidas do assediador. Não há assédio sexual caso a pessoa assediada corresponda voluntariamente às investidas. Em relação ao assédio moral, dentre os principais tipos sofridos, tem-se: (i) xingamentos; (ii) difamações; (iii) serviço em excesso; (iv) transferências injustificadas de local de trabalho; (v) constrangimentos através de importunações e insinuações maliciosas, com o objetivo de obter vantagens ou favorecimento sexual; (vi) ofensa emocional; (vii) ofensa psicológica; e (viii) atribuição à vítima de tarefas incompatíveis com sua saúde.

Muitos assédios morais sucedem tentativas de assédios sexuais que não foram correspondidas pela vítima, principalmente em se tratando de mulheres. Seria a situação, por exemplo, de um superior hierárquico que tenta uma investida em relação a uma funcionária; ela deixa claro que não tem interesse, e ele, na tentativa de repreendê-la pela negativa, acaba tornando a vida dela, dentro do ambiente de trabalho, insustentável. De todo modo, apesar da necessidade de os empregadores se atentarem aos mínimos vestígios que possam vir a configurar uma situação de assédio dentro de suas empresas, é importante que saibam que inúmeras práticas corporativas são inerentes às relações de trabalho, de modo que nem tudo pode ser tachado como assédio. Uma das características inerentes às relações de emprego é a subordinação hierárquica e o poder diretivo do empregador, tendo que ser compreendido pelos empregados que receber e cumprir ordens é requisito básico desta relação contratual. Assim, uma exigência com relação à execução do trabalho, ou ainda uma chamada de atenção por um comportamento inadequado do funcionário, por exemplo, não pode ser considerado assédio.

Em junho desse ano, o presidente de um grande banco foi acusado de assediar sexualmente funcionárias durante viagens e eventos. As denúncias incluíram toques íntimos não autorizados, abordagens inadequadas e convites incompatíveis à relação de trabalho. Todas as mulheres que vieram a público, sem que seus nomes fossem divulgados, trabalham ou trabalharam em equipes que atendem diretamente ao gabinete da presidência do banco. De acordo com relatos, os casos aconteceram, muitas vezes, em viagens, e o presidente escolhia preferencialmente “mulheres bonitas”, sendo que, na maioria das vezes, eram promovidas hierarquicamente sem preencher os requisitos necessários para a ascensão. Em sua carta de demissão, ele negou as acusações e declarou que combateu o assédio dentro do banco. Acrescentou que foi colocado em uma “situação cruel, injusta, desigual e que será corrigida na hora certa com a força da verdade”, o que não impediu sua destituição do cargo e a instauração de um comitê de auditoria para investigar as denúncias contra si e todos os demais funcionários que foram indicados como tendo conhecimento sobre o tema, sem que tenham adotado as medidas apropriadas à época.

Diante dos números divulgados pelo MPT e do recente caso, é importante que a empresa estabeleça códigos de conduta e ética de funcionários e crie mecanismos de denúncia a serem utilizados, nos quais os trabalhadores vítimas de assédio — ou que presenciem situações de assédio — se sintam à vontade para se queixar antes de tomar uma medida como o pedido de demissão ou a propositura de uma reclamatória trabalhista. As empresas têm responsabilidade sobre o que ocorre no ambiente de trabalho, bem como perante a sociedade, e precisam ser firmes e proativas para evitar esse tipo de situação. É desejável adotar política interna de incentivo à denúncia, bem como punir devidamente casos de assédio comprovados, demonstrando-se completamente impiedosa em relação aos assediadores. Para tanto, é dever da empresa demitir o assediador. O empregador jamais pode desmerecer denúncias sem uma prévia investigação sobre o teor das alegações trazidas pelos funcionários. Os atos de assédio são passíveis de punição na esfera trabalhista e criminal. Se não forem resolvidos internamente, a vítima pode procurar seus direitos pelas vias judiciais, o que, com certeza, traz uma repercussão bem mais gravosa para a vida pessoal dos envolvidos, bem como para a imagem da empresa perante o mercado, clientes e potenciais investidores. 

*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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