Lula, Dino e o toque de Midas invertido

Congresso está cada vez mais reativo ao governo, que chega ao quinto mês com uma base de apoio reduzida, fragilizada; parlamentares independentes se distanciam de uma gestão que parece contaminar tudo o que toca

  • Por Claudio Dantas
  • 04/05/2023 13h09 - Atualizado em 04/05/2023 13h16
WILTON JUNIOR/ESTADÃO CONTEÚDO - 15/03/2023 O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o ministro Flávio Dino (Justiça) durante cerimônia de lançamento do novo Programa Nacional de Segurança Pública O presidente Lula e o ministro Flávio Dino (Justiça) juntos em evento no Palácio do Planalto

Não sou adepto a teorias conspiratórias, mas Brasília é campo fértil para coincidências que acabam alimentando mentes mais criativas. Ontem, Jair Bolsonaro foi alvo da Polícia Federal por suspeita de ter forjado certificado de vacinação contra a Covid-19 — mesmo declarando aos quatro ventos nunca ter se imunizado. O despacho de Alexandre de Moraes foi assinado no dia 28 de abril, mas a operação foi deflagrada um dia depois da fragorosa derrota do governo em tentar votar o PL da Censura, ostensivamente apoiado por Flávio Dino. Hoje, a PF voltou às ruas para prender CACs que não recadastraram suas armas no prazo estabelecido pelo ministro da Justiça, que semanas atrás havia prometido a integrantes da Comissão de Segurança Pública da Câmara revisar o prazo. Na noite desta quarta-feira, 3, a Câmara impôs nova derrota ao governo ao derrubar o decreto de Lula que havia alterado o Marco do Saneamento.

Coincidência ou vingança? Esse questionamento ganha força num Congresso (Câmara, especialmente) cada vez mais reativo ao Executivo, que chega ao quinto mês com uma base de apoio reduzida, fragilizada. Os independentes pendem cada vez mais para o outro lado, se distanciam de uma gestão que parece contaminar tudo o que toca. “Lula foi eleito com aquela velha imagem de Midas que forjou nos primeiros mandatos, mas agora parece um Midas invertido. Em vez de ouro, o que ele toca vira m…”, desabafa um líder partidário. Segundo outro parlamentar, a atuação ostensiva de Dino com respaldo do Planalto indica o caminho escolhido por Lula. “É o caminho da retaliação e não da pacificação. O governo gasta sua energia, não em dialogar com o Parlamento, mas em exibir força contra adversários.”

Na prática, Lula aposta na polarização para tentar encobrir sua incompetência, e Dino aproveita a oportunidade para crescer politicamente, ganhando ascendência sobre os demais ministros da Esplanada e tomando a frente dos nomes do PT para a sucessão de Lula em 2026. Mas a estratégia pode ser um tiro no pé, desgastando prematuramente o próprio governo. Após a derrubada do decreto de Lula na Câmara, outra derrota espera o governo no Senado. Não dá para brigar com o fato de que o Marco do Saneamento elevou em cinco vezes o investimento no setor, que (como o nome sugere) é básico para o desenvolvimento de qualquer sociedade e que tende a mudar a realidade dos mais pobres — aqueles que o petista diz querer ajudar. O terceiro mandato de Lula não poderia estar mais avesso ao interesse de quem mais precisa, vide a tentativa de taxar compras em sites estrangeiros.

O ataque sistemático aos fundamentos da política econômica, sob a falácia de que Roberto Campos Neto é o responsável por todos os males, só deteriora o cenário econômico, aumenta o risco e afugenta investidores, gerando desemprego e mais inflação. A cereja do bolo petista é o assédio ao agronegócio com apoio às invasões do MST e retaliações primárias, como a de retirada do patrocínio do Banco do Brasil à Agrishow, maior feira do setor. É preciso repisar que o governo de Jair Bolsonaro foi recordista em reforma agrária, distribuindo mais de 400 mil títulos de terra a famílias de agricultores. Também é necessário ressaltar que o agro hoje é a principal alavanca do PIB e tem uma das maiores bancadas no Congresso, ombreando com a evangélica — intimidada com o PL da Censura — e a da ‘bala’, indignada com a traição de Dino e firmes na defesa da política que ampliou o porte e a posse de armas, refletindo na queda dos índices de homicídio e demais crimes associados à violência urbana e rural. 

 

 

*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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