Economia, sustentabilidade e aproveitamento de recursos: vinho e azeite se misturam, sim

Culturas complementares têm sido mantidas ao longo dos séculos, especialmente em Portugal, Itália, Grécia e Líbano, criando tradições ricas e uma abordagem sustentável para o uso da terra

  • Por Esper Chacur Filho
  • 29/09/2024 10h00
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Arquivo Pessoal/Esper Chacur Filho Mesa de restaurante com vinho e azeite Produzir vinho e azeite na mesma terra é uma prática antiga em várias regiões do Mediterrâneo

A natureza nos brinda com exemplos de simbiose únicos, alguns, inclusive, fazem-se refletir em harmonizações gastronômicas excepcionais. Neste diapasão, encontramos a perfeita harmonia entre o vinho e o azeite, que começa desde o cultivo e segue até a mesa. Produzir vinho e azeite na mesma terra é uma prática antiga em várias regiões do Mediterrâneo, onde o clima e o solo favorecem o cultivo da videira e da oliveira. Essas culturas complementares têm sido mantidas ao longo dos séculos, especialmente em Portugal, Itália, Grécia e Líbano, criando tradições ricas e uma abordagem sustentável para o uso da terra.

Há muitas vantagens de produzir o vinho e o azeite na mesma terra. O aproveitamento de recursos naturais propicia que tanto as videiras quanto as oliveiras prosperem em solos semelhantes, frequentemente áridos e com baixa fertilidade, característicos do Mediterrâneo. O cultivo conjunto permite otimizar o uso da água e dos nutrientes do solo, especialmente em terrenos com pouca água. Sob o ponto de vista econômico, a produção de dois itens de alto valor agregado numa mesma propriedade pode reduzir riscos financeiros, uma vez que as oscilações de mercado de um produto podem ser compensadas pelo outro.

Por seu turno, a combinação das culturas pode contribuir para uma gestão ambiental mais sustentável, reduzindo a erosão do solo e promovendo a biodiversidade. Além disso, as práticas de cultivo sustentável, como a produção orgânica, tendem a ser mais fáceis de implementar quando essas culturas coexistem. Cabe destacar que vinícolas, que também produzem azeite, podem oferecer uma experiência mais completa aos turistas, com degustações de ambos os produtos e visitas guiadas que mostram o processo de produção de vinho e azeite. Importante advertir que se não houver uma gestão cuidadosa, a oliveira e a videira podem competir por água e nutrientes, o que pode afetar negativamente o rendimento de ambas as culturas; também o tempo de colheita e processamento de uvas e azeitonas pode sobrepor-se, exigindo uma logística complexa e maior mão de obra durante certos períodos do ano.

Como declinei acima, regiões antigas sempre adotaram tal prática de cultura paralela e comum. Portugal é um dos maiores produtores de azeite e vinho do mundo, com regiões que combinam essas produções há séculos. Um exemplo é a “Herdade do Esporão”, no Alentejo, que é uma das propriedades mais conhecidas que produz tanto vinhos de renome como azeites de alta qualidade. O clima quente e seco do Alentejo favorece a coabitação dessas culturas. A Quinta do Crasto, no Douro, produz vinhos de excelência, como o Porto, e também azeites premium.

A Itália é o maior produtor mundial de azeite e um dos líderes em vinhos finos, sendo que o “Castello di Ama”** (Toscana), situada na famosa região de Chianti, também cultiva oliveiras e produz azeite virgem extra, combinando a tradição do vinho com a excelência em azeites. A “Frescobaldi”, também na Toscana, é  uma das mais antigas e renomadas vinícolas italianas, que também tem tradição na produção de azeite de oliva. O vinho e o azeite são parte integral da cultura grega desde a antiguidade, e muitas regiões ainda produzem ambos os produtos, como ocorre em Santorini na “Domaine Sigalas” que é conhecida pelos seus vinhos brancos, especialmente de Assyrtiko, a vinícola também produz azeite extra virgem na bela ilha vulcânica do Mediterrâneo; já de Nemea, temos a “Gaia Wines”, que é outra vinícola que combina produção de vinho e azeite, aproveitando o microclima grego.

Por fim, o  Líbano, que  é famoso pelo seu vinho milenar, mas também tem uma forte tradição de cultivo de oliveiras. O “Château Ksara”, do Vale do Bekaa e berço da agricultura libanesa, é uma das vinícolas mais antiga do Líbano e produz vinhos há mais de 150 anos, bem como azeite, aproveitando o clima mediterrâneo do Vale do Bekaa. De Batroun veem os vinhos da  “Ixsir”. Esta vinícola relativamente nova é conhecida pela produção de vinhos de alta qualidade e também cultiva oliveiras, produzindo azeites finos em suas propriedades. A “Ishtar”, que é uma vinícola boutique, a primeira fundada no Norte do Líbano (Bekka fica no sul do país), em Darbechtar, região de Koura, produz vinhos e azeites no mesmo solo e com práticas sustentáveis em ambas as culturas. O nome Ishtar é em homenagem à Deusa do amor, beleza e desejo. A vinícola é comprometida em fazer os melhores vinhos orgânicos do Líbano.

Todos os produtores acima citados estão presentes no mercado nacional e valem ser conhecidos, sendo que estes exemplos mostram como a combinação de vinhas e oliveiras pode ser bem-sucedida em diferentes regiões, cada uma com suas particularidades e desafios. O uso inteligente da terra e a busca por qualidade em ambos os produtos têm gerado excelentes resultados tanto para os produtores quanto para os consumidores. Salut!!!

*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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