Espumantes brasileiros envelhecem melhor e se tornam mais gastronômicos

Se considerarmos os espumantes do Novo Mundo, são os do Brasil que envelhecem melhor, conservando a perlage com mais potência e imprimindo certa evolução que os torna especialmente interessantes

  • Por Esper Chacur Filho
  • 29/01/2023 10h30
Arquivo Pessoal/Esper Chacur Filho Garrafa de espumante brasileiro O Cave Geisse Brut é um vinho espumante brasileiro produzido com as uvas Chardonnay e Pinot Noir na região de Pinto Bandeira

De modo geral, os vinhos tintos, especialmente os com estrutura de taninos e alguma madeira, envelhecem bem; melhoram, mudam com a guarda. Os vinhos brancos, por seu turno e de mofo geral, ganham menos que os tintos com a guarda. A dúvida reside nos espumantes, em que pese o leque ser muito grande. Ainda no final do século XX, considerando os “champagnes”, havia o mito de que eram bebidas para serem consumidos logo e que apodreciam com a guarda. Debito este pensamento errado ao fato de que os consumidores de champagne, até meados dos anos oitenta, do século passado, tinham o hábito de guardar seus espumantes no armário abaixo da pia da cozinha, bem pertinho do fogão… Bem, aí não há bebida que resista, nem os mais alcóolicos destilados não cozinhavam. 

Certa vez, por volta de 2003, ganhei uma garrafa do Champagne Piper-Heidsieck Rose, safrada de 1977. De verdade, pelo estado da garrafa, rótulo e cápsulas desarranjados, não pus nenhuma fé de que o líquido não estivesse apodrecido (champagne dificilmente avinagra, apodrece mesmo). Um dia resolvi abrir em um daqueles memoráveis almoços que ocorriam no, extinto, São Paulo Club, feudo do saudoso Dr. Gastão Vidigal, localizado na Av. Higienópolis. E não é que o champagne em questão, a despeito de ter perdido bastante da perlage, que são as bolhas do espumante e que se formam naturalmente a partir do processo de fermentação, ela estava bem palatável. Deste dia em diante passei a me tentar mais a idade dos espumantes, inclusive procurando alguns de safras antiga (à época com mais de dez anos). Sempre tive boas surpresas. 

Descobri, com o tempo, que não só o champagne pode envelhecer na garrafa. As “Cavas” (espumante catalão) e as  “Franciacortas” (espumante produzido em meio aos alpes italianos, na região da Lombardia, norte da Itália), especialmente as safradas, apresentam um potencial de envelhecimento bem considerável, até maior que muitos champagnes. Agora a grande surpresa, para mim, é o potencial de envelhecimento dos espumantes brasileiros, especialmente os mais complexos e produzidos pelo método tradicional. Posso afirmar, sem medo de errar, que, se considerarmos os espumantes do Novo Mundo, são os brasileiros que envelhecem melhor, conservando a perlage com mais potência e imprimindo certa evolução que os torna especialmente interessantes. Verdade que perdem um pouco do frescor, mas ganham, em contrapartida, complexidade ímpar, tornando-se, até, mais gastronômicos. Mas, destaco, não é todo espumante que evolui, só os mais bem elaborados. Convido o leitor a guardar, por mais de três ou quatro anos, alguns espumantes nacionais e provarem os mesmos, comparando com aqueles mais novos, vão se surpreender. Salut! 

*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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