Caso Elizabeth Holmes: de capa de revista para trás das grades

O que leva uma empresaria do porte de Elizabeth Holmes, com cultura, outras línguas e contatos, a colocar em risco milhares de vidas em nome de reconhecimento?

  • Por Fabi Saad
  • 04/01/2022 12h54 - Atualizado em 04/01/2022 13h56
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Peter Dasilv/EPA/EFE Elizabeth Holmes, fundadora da Theranos, seu parceiro, Billy Evans (L), sua mãe Noel (2-R) e pai Christian (R) deixam tribunal Elizabeth Holmes, fundadora da Theranos, foi condenada por fraude nos Estados Unidos

Impressionante o caso da empresária americana Elizabeth Holmes. O que pode ter causado a empresária a vender sua alma para o diabo? Poder? Ganância? Exemplos errados durante sua infância (seu pai foi VP da Enron)? O que explica a sequência de erros da empresária americana, que por muitos foi considerada a empresária da década. Para quem não acompanhou o escândalo, capa de “Financial Times” e Bloomberg, a empresária americana de 27 anos foi condenada e pode pegar até 20 anos de prisão.

Holmes chegou a ser considerada uma das popstars do Vale do Silício ao ter sua startup, a Theranos, avaliada em US$ 9 bilhões. Detendo 50% das ações da empresa, se tornou a mais jovem bilionária do mundo (hoje quem ocupa o posto é Whitney Wolfe Herd, da Bumble). Foi capa de revista, participou de milhares de cerimônias, solenidades e entrevistas focadas em empreendedorismo feminino. Uma estrela em ascensão, que rapidamente foi ao declínio e se tornou um fiasco, com suas conquistas todas permeadas por fraudes e maquiagem de números. A empresária foi desmascarada por um ex-funcionário que revelou a realidade. A startup era incapaz de realizar testes precisos com os equipamentos próprios.

Entretanto, há tempos um jornalista do “The Wall Street Journal”, John Carreyrou, iniciou uma extensa e secreta investigação para entender como funcionavam os processos da Theranos. Carreyrou teve acesso a documentos, através de funcionários da empresa e fontes de confiança. Descobriu em 2015 que o sistema não oferecia resultados precisos e que a maioria das máquinas utilizadas era de fornecedores terceiros, não desenvolvimento próprio. O jornalista chegou a publicar um livro em 2018: “BAD Blood – Secrets and Lies in a Sillicon Valley Startup” (em tradução livre, Sangue Ruim – Segredos e Mentiras em uma Startup do Vale do Silício). Holmes chegou a rebater as criticas dizendo o seguinte: “É isso o que acontece quando você trabalha para mudar as coisas. Primeiro acham que você é louca, depois tentam te derrubar e, de repente, você muda o mundo”. Bonitas palavras, se não fossem falsas. Em 2016, a gigante americana Wallgreens proibiu o “In Store Blood Collection”, que ocorria em parceria com a Theranos, após o Centers for Medicare and Medicaid Services) propor uma proibição de dois anos na gestão de Holmes. Em 2017, finalmente descobriram que a empresa havia vendido mais de 1,5 milhão de testes de sangue falsos e pagou um total de US$ 4,65 milhões (R$ 26,27 milhões na cotação atual) em multas.

Holmes nasceu no dia 3 de fevereiro de 1984, passou por Stanford, não se formou e tinha como proposta “democratizar a assistência médica”. Seu pai foi vice-presidente da Enron, outro caso lendário de fraude nos Estados Unidos. Sua mãe foi congressista. A jovem empreendedora estudou em St Johns School, em Houston, e cursou chinês antes de entrar em Stanford, faculdade que abandonou ao se envolver com um empreendedor paquistanês casado, 19 anos mais velho que ela, chamado Ramesh Balwani. Este, que veio a se tornar seu marido, pai de seus dois filhos e, coincidentemente, também CEO da Theranos.

Este caso serve para refletirmos. Em um mundo ESG (Environmental, Social and Governance, em tradução, Ambiental, Social e Governança), onde todos pregam a importância de ter uma missão, de ter um propósito, o que move uma empresária do porte de Holmes, com cultura, outras línguas e contatos, a colocar em risco milhares de vidas em nome de reconhecimento? Um reconhecimento temporário, pois evidentemente seria uma questão de tempo até ser desmascarada. Este episódio, de alguma maneira, me lembra o caso Madoff, onde, ao ser preso, o empresário relatou se sentir aliviado. Quem sabe o que Holmes sentiu no momento que foi oficialmente condenada? Para fechar este artigo gostaria de dividir duas frases que me marcaram, ambas do procurador Jeff Schenk:

  • “She chose fraud over business failure.”
    (“Ela escolheu fraude em vez de fracasso empresarial.”)
  • “She chose to be dishonest. This choice was not only callous, it was criminal.”
    (“Ela escolheu ser desonesta. Não foi falta de sensibilidade, foi criminal.”)

*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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