Tere Chad compartilha a experiência de participar de mais de 60 exibições e mais de 20 exposições internacionais

Artista vanguardista tem mestrados em renomadas instituições e é membro da Royal Society of Sculptors

  • Por Fabi Saad
  • 17/07/2024 12h16
Arquivo pessoal Mulher Positiva 'Eu nasci como artista, de criança fui muito curiosa e trabalhava muito com minhas mãos'

Nossa Mulher Positiva é Tere Chad – Artista vanguardista, possui Mestrado em Arte e Ciências da Central Saint Martins, Universidade das Artes de Londres (2018) e outro Mestrado em Escultura do Royal College of Art (2020). Possui o título da Global Talent Visa, que a manteve em Londres para continuar promovendo projetos internacionalmente. Em 2021, tornou-se membro da Royal Society of Sculptors. Tere Chad participou de mais de 60 exibições e realizou a curadoria de mais de 20 exposições internacionais.

1. Como começou a sua carreira? Eu nasci como artista, de criança fui muito curiosa e trabalhava muito com minhas mãos. Inclusive, tentava não brincar com os brinquedos “comprados” e criar meus próprios com material reciclado ou matéria orgânica que encontrava no jardim. Desde muito cedo decidi que limitaria o desenvolvimento de minha criatividade. Escreveria minhas próprias peças de teatro, histórias, poemas, fazia minhas fantasias, exposições de arte, e sempre tentaria fazer as tarefas o mais rápido possível. Minha primeira formação foi publicidade. Meus pais entendiam que a publicidade poderia me levar a escritórios e seguir um padrão mais do dentro que parecia “normal”. Mas no paralelo, estudei ourivesaria por 7 anos com o escultor chileno Cristián Arrué na oficina Taller Villaseca, em Santiago, Chile. Em 2014, recebi um convite para fazer meu primeiro projeto de arte “Fusión-Haka Piri” (2016) na Galeria Aukara em Hanga Roa, uma coleção de joias inspiradas na cultura arqueológica da Ilha de Pascoa. Nesse momento, tive que decidir se continuar trabalhando no marketing ou iniciar meu caminho oficial como artista, e optei por seguir com minha paixão. Como Ilha de Pascoa é uma cultura polinésia, totalmente não relacionada com Chile, tive que estudar muito e me conectar com uma comunidade indígena Rapa Nui. Este projeto me ajudou para apresentar um portfolio sólido e cursar Mestrado em Arte e Ciência na Central Saint Martins, University of the Arts London (2018) e depois, Mestrado em Escultura no Royal College of Art (Londres, 2020). Enquanto estudava em Londres, sempre trabalhei ao mesmo tempo, porque queria ter a possibilidade de receber o Global Talent Visa, que conquistei em 2020 e me permitiu continuar minha carreira internacional em Londres, promovendo o intercambio com nossa região e outras partes do mundo. Em 2021, fui aceita como Membro da Royal Society of Sculptors, que me ofereceu muitas oportunidades.

2. Qual foi o momento mais difícil da sua carreira? Eu acho que cada dia da vida de um artista, é um dia da muita dificuldade, passamos grande parte de nossas vidas lidando com impossível e instabilidade constante. Eu penso que este é um sentimento, que apenas os artistas conhecem, porque as pessoas fora desta área têm uma ideia muito romântica de “ser artista”. Há uma falta de clareza quando falamos em construção de obras de artes. Apesar das dificuldades que encontramos, não mudaria nada na construção de minha carreira. É um grande privilégio poder trabalhar naquilo que me dá prazer e considero ser meu propósito de vida. Eu gostaria lembrar alguns dos momentos mais difíceis das diferentes das edições de Neo Norte. No projeto 1.0 (Fundación Cultural de Providencia, Santiago, Chile, 2018), quase fui parada pela imigração, isso a duas semanas da inauguração. Uma das caixas com obras, as esculturas 3D impressas da Juan Covelli. Eram obras muito antigas e exalavam um odor um tanto estranho, mediante isso o policial achou por bem cheirar a caixa e chacoalhar, que fez com que um certa poeira saisse da mesma. Como todos os documentos legais e pertinentes as obras estavam comigo, consegui a licença de seguir adiante. Mas devo confessar que foi um grande susto. Neo Norte 2.0 (Exposed Arts Projects, Londres, Reino Unido, 2019), foi numa galeria antiga, as oficinas dos carros da Jaguar da rainha Elizabeth II. Nuno Vinhas da Anglo-Paraguayan Society ofereceu fazer uma cobertura das entrevistas pelo livestreaming de um canal do facebook latino para na abertura. Enquanto Nuno entrevistava o artista Lorenzo Belenguer, pensou que na oficina mecânica, onde estava a obra de Lorenzo, havia um vidro para proteger da água, mas não, e com o livestreaming, caiu e rompeu na obra, e tive que rapidamente iniciar a limpar e buscar ajuda, porque tinha muita preocupação, porque na galerista Sasha Burkhanova-Khabadze esteve grávida e a ponto dar a luz, e não poderíamos ocasionar mais estresse. No seguinte dia que chamei a Nuno, ele estava fascinado, porque sentiu que foi uma experiência como da performance contemporânea. Neo Norte 3.0 (Galeria Myymälä2, Helsinki, Finlândia, 2021), como não consegui fundos para transporte de arte, tive que dirigir uma van de Londres até Helsinki. Depois, em Helsinki, me emprestaram uma bicicleta sem freios e acabei me acidentando. Tive que fazer todas as apresentações, reuniões e visitas na galeria com o rosto marcado pelo acidente e sob efeitos de antibióticos. Lidar com a dor, a vergonha e insegurança, foi o grande desafio deste projeto. Neo Norte 4.0 (Parque Arqueológico de Segesta e Villa Giulia, Palermo, Sicília, 2023 – 2024), tivemos um grande problema na instalação de land art “Elyma”, onde o artista siciliano Gandolfo Gabriele David, circunscreveu a Chakana, símbolo andino do Cruzeiro do Sul no Parque Arqueológico de Segesta, porém o parque foi fortemente afetado pelos incêndios intencionais de julho do ano passado… Situação que impactou a forma da abordar a performance e seminário posterior. Agora para Neo Norte 5.0, já recebemos a aprovação da Lei Rouanet e aguardamos PROAC. Fizemos o lançamento oficial junto na Marca Regional da América Latina e Caribe promovida por CAF – Banco de Desenvolvimento da América Latina, e inicia nosso primer desafio que é fazer na campanha de levantamento de recursos.

3. Como você consegue equilibrar sua vida pessoal x vida corporativa/empreendedora? Eu tenho três critérios que costumo seguir: praticar esportes, meu principal médio de transporte em Londres é a bicicleta, e faço em média 60 km semanalmente. Acho que o esporte ajuda a equilibrar no estresse, e processar os momentos da frustação que todo empreendedor enfrenta. Em segundo, é aprender a ouvir nosso corpo e administrar o tempo. Como eu trabalho com minha paixão, trabalho de 70 – 90 horas semanalmente de segunda-feira a domingo e em raras ocasiões, tiro férias. Como empreendedora, meu maior ativo, é meu tempo, diante disso, me concentro tanto trabalhando que perco noção de tempo. Em determinados momentos, a dedicação acaba sendo tanta que fico sem dormir. Por iso algumas vezes me pego cansada sem entender, aí meu corpo me diz que é necessário parar e cuidar um pouco de mim. Londres, como São Paulo, são cidades grandes e agitadas, onde o tempo de deslocamento te consomem, por isso é importante aprender a priorizar nossas atividades e o próprio tempo, para que nesse meio do caminho possamos encontrar amigos e desacelerar. Em terceiro lugar, buscar espaços da tranquilidade. Eu elegi morar perto da natureza e meu parque favorito em Londres, Hampstead Heath. Os dias que não tenho tempo para andar de bicicleta, caminho no parque e aproveito para fazer minhas chamadas telefónicas. Tenho como habito, todas manhãs e as noites, escutar música clássica, acalma a alma.

4. Qual seu maior sonho? Sonhos tenho muitos, como artista vivo no abstrato mundo das ideias, como na famosa pintura da Raphael Sanzio da Na Escola de Atenas (1509 – 1511), me identifico por completo com a representação de Platô. Em um sentido platónico, sempre aspiro alcançar a beleza e harmonia estética.

Definir a estética é sempre um debate que não acaba, não existe um fim nos meios academicos… Mais pensando nos sonhos de curto prazo, eu gostaria muito que Neo Norte 5.0 fosse um sucesso no Memorial da América Latina e que por um lado ajudasse a reposicionar o Memorial como um “cultural hub” ou epicentro dos estudos Latino-americanos em nível mundial. E num plano de médio prazo, que eu pudesse num futuro, não distante, criar a “Fundação da Neo Norte” para entregar aos criativos do Sul a possibilidade de estarem em destaque no mercado internacional. Acredito piamente que neste tempo que vivemos hoje de crise mundial, o Sul tem grande chance e potencial de oferecer soluções inusitadas, criando conexão com nossa intuição e biodiversidade para lidar com as mudanças climáticas e desafios propostos do século XXI.

5. Qual sua maior conquista? Além de ser artista e empreendedora, é ter a possibilidade de concretizar meu sonho de apresentar Neo Norte 5.0 no Memorial da América Latina, com a finalidade de fornecer aos criativos da nossa região, convidando-os a uma outra forma de conectar com nossa intuição e experiência humana. Os tempos que não estou trabalhando, estou lendo e aprendendo outros idiomas. Eu falo cinco idiomas: espanhol, inglês, italiano, alemão e português, mais preciso melhorar meu português e alemão. Penso que aprender outros idiomas desenvolve o pensamento lateral e a criatividade. Não é apenas uma coisa da memorizar palavras, mas abre horizontes para entender outras formas de pensamento que enriquecem no trabalho dos artistas. Em momentos que o algoritmo das redes sociais polariza os debates, penso que é um grande privilégio poder aprender outros idiomas, porque mantém você com o pensamento aberto a conhecer outras culturas.

6. Livro, filme e mulher que admira. Livro: “1434” de Gavin Menzies (2008), ano em que uma magnífica frota chinesa velejou para a Itália e deu início ao Renascimento, outra impressionante reavaliação da História. um marinheiro inglês aposentado que faz uma pesquisa para argumentar que uma frota china pegou a Italia do renascimento. É um livro que mudou radicalmente minha concepção do descobrimento da América. Filme: “Il Gattopardo” dirigida por Luchino Visconti (1963), e baseada no livro de Giuseppe Tomasi di Lampedusa. É um filme fantástico para entender as dinâmicas políticas, ou o paradoxo do “gatopardismo: todo muda para que nada mude.” Penso que é um perfeito reflexo dos nossos sistemas políticos, e muito relevante para aplicar em São Paulo, cidade com grande imigração italiana. Mulher: Não sei se a palavra correta é dizer que tenho admiração por esta mulher, porque é uma personagem de uma história muito controversa, mas foi minha obra preferida da 35º Bienal de São Paulo, “Coreografias do Impossível”. O “Retrato de Doña Catalina de Erauso, la monja alférez” (Retrato de Dona Catalina de Erauso, La monja alferes) pintado por Juan Van der Hamen y León (1630), e na obra “Uma voz para Erauso. Epílogo para um tempo trans” (Uma voz para Erauso. Epílogo para um tempo trans) da dupla Cabello e Carceller (2021), onde contam a história da Antonio de Erauso que nasceu como mulher como Doña Catalina de Erauso em 1592, e desafiou os padrões da época para transitar como homem e combater os colonizadores espanhóis e cometer atrocidades com o povo Mapuche. A história das atrocidades logicamente não aprecio, mas penso que é interessante a forma como Cabello e Carceller vão mais fundo nos corpos transgéneros, porque te transportam a complexidade das teorias não binárias no século XVI. Em outro caso da Bienal que gostaria de destacar, sim posso afirmar que tenho admiração pela trajetória da escultora com Síndrome de Down Judith Scott (1943 – 2005).

*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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