Jardins verticais: do prazer estético à redução dos impactos ambientais urbanos

Quando inseridas em políticas públicas ambientais, essas estruturas têm poder de melhorar a qualidade do ar, diminuir a temperatura, gerar empregos e contribuir para economia circular de baixo carbono

  • Por Helena Degreas
  • 23/03/2021 09h00 - Atualizado em 23/03/2021 10h06
Helena Degreas/Jovem Pan Parede verde projetada debaixo de viaduto na cidade de São Paulo A parede verde é um dos recursos que podem ser utilizados como estratégia para a melhoria da qualidade de vida e saúde da população

Jardins verticais, paredes verdes ou paredes vivas são alguns dos diversos termos utilizados para designar sistemas de painéis de plantas cultivadas verticalmente em estruturas que podem ser independentes ou presas às paredes. As técnicas de plantio mais comuns são aquelas em que os elementos vegetais são plantados em floreiras que recebem composto orgânico. Inventor do Mur Végétal, o botânico e garden designer Patrick Blanc patenteou a técnica há 30 anos e, desde então, projetou e implantou inúmeras das suas criações em todo o mundo. Em parceria com o arquiteto francês Jean Nouvel, ele ajardinou a fachada do condomínio residencial One Central Park, na Austrália, alcançando 50 metros de altura e transformando-o num dos jardins mais altos do mundo. Foram utilizadas mais de 85 mil plantas nas fachadas distribuídas entre 23 paredes verdes com cerca de 350 espécies nativas e exóticas em 1.200 m² de área. Vale lembrar que os jardins verticais não são novidade, ao menos aqui em nossas terras. No Brasil, Burle Marx (1909-1994) e Haruyoshi Ono (1944-2017) já realizavam painéis verticais ajardinados em muros belíssimos, verdadeiras obras de arte urbana há décadas, com inúmeros projetos mesclando água, grafismos e vegetação, como o mural do Banco Safra localizado na avenida Paulista

Embora para a maioria da população o uso dos elementos vegetais em fachadas de edifícios e muros tenha um valor predominantemente estético, para prefeitos de cidades compactas, densamente construídas e cujo espaço livre público é exíguo, o plantio vertical é um dos recursos que podem ser utilizados como estratégia para a melhoria da qualidade de vida e saúde. Se atualmente mais da metade da população vive em áreas urbanas, estima-se que, até 2050, 66% das pessoas morarão em cidades. No Brasil, este número já alcança 84.72%, de acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2015. Enfrentar e prevenir problemas ambientais, atuais e futuros, que causem não apenas riscos urbanos, mas também danos à saúde da população, fazem-se urgentes nas cidades.

Os benefícios na implantação dos ajardinamentos em paredes, fachadas e muros são diversos:

  • Ambientais: reduzem as temperaturas por meio da absorção da luz solar, absorvem os gases poluentes da atmosfera e filtram a poeira do ar externo, bloqueiam cerca de 40% dos sons de alta frequência externos e aumentam a biodiversidade, atraindo pássaros e insetos por causa dos frutos;
  • Econômicos: melhoram o comércio local  — as pessoas tendem a ficar mais tempo em áreas ajardinadas  —, fornecem isolamento térmico, reduzindo a demanda por energia, e geram empregos locais, pois, para a sua manutenção, são necessários profissionais diversos;
  • Saúde: reduzem o estresse provocado pelos ambientes urbanos e induzem a passeios e caminhadas ao ar livre.

Como exemplo de boas políticas ambientais vinculadas à gestão pública municipal, a Secretaría Distrital del Ambiente (Secretária do Meio Ambiente, em tradução livre) da cidade de Bogotá desenvolveu uma série de programas e projetos de cunho ambiental, com metas e indicadores que deverão ser cumpridos em prazos definidos e que buscam benefícios ambientais, econômicos e estéticos urbanos. Pretende-se, com todo esse aparato institucional, levar a cidade a ser cada vez mais resiliente às consequências resultantes dos extremos climáticos por meio da constituição de uma infraestrutura verde. Os jardins verticais constituem-se, portanto, em um dos elementos que promovem e ampliam a infraestrutura verde, desempenhando papel significativo para a mitigação das mudanças climáticas. Um dos manuais que orientam a implantação desta solução encontra-se disponível em seu site.

O prefeito de Londres, por sua vez, fez consulta pública perguntando à população quais as demandas para uma cidade com mais qualidade de vida. A partir do feedback, foi criada uma estratégia ambiental integrada, reunindo abordagens para aspectos urbanos que demandavam soluções urgentes, tais como melhoria na qualidade do ar, infraestrutura verde, mitigação da mudança climática, desperdício, adaptação às mudanças climáticas, ambiente barulhento e inclusão de incentivos ao desenvolvimento de uma economia circular de baixo carbono direcionado a empresas e prestadores de serviços. 

Já na cidade de São Paulo, ações pontuais realizadas pela Secretaria Municipal do Verde e Meio Ambiente (SVMA) foram realizadas para a instalação de jardins verticais em edifícios com “paredões sem janelas” por meio de chamamento público para edifícios vizinhos ao Elevado Costa e Silva (Minhocão) e previamente selecionados pela Câmara Técnica de Compensação Ambiental (CTCA). As empresas interessadas em adotar esses “paredões” poderiam se beneficiar com a conversão da compensação ambiental em obras e serviços, jardins verticais e coberturas verdes na capital e que constam do Decreto n° 55.994. Empresa ou munícipe que deseje realizar obras ou reformas envolvendo corte ou transplante de árvores pode se utilizar do Temo de Compromisso Ambiental para construir jardins verticais em qualquer lugar na capital. Em outras palavras, é possível derrubar várias árvores que estão no terreno em que você pretende construir e, em seu lugar, oferecer à cidade um jardim vertical. Como será que isso é calculado? O fato é que os moradores dos edifícios escolhidos pelas empresas e pela CTCA para a instalação dos jardins verticais entraram na Justiça para a sua remoção por falta de manutenção. Prefeitura e empresa alegaram que o desmonte estava previsto em contrato. Os gastos com foram arcados pela prefeitura da cidade. Entendo que o custo de todo esse processo deva ser da iniciativa privada que o instalou, nunca do poder público, especialmente se foram utilizados por meio de benefícios previstos pelo Termo de Compromisso Ambiental (TCA). 

Não coordenados adequadamente, este decreto e demais instrumentos legais previstos pela Prefeitura de São Paulo compõem apenas um conjunto de bons instrumentos legais que podem, eventualmente, ser de interesse de algum munícipe ou empresa interessada em mitigar danos ambientais. É nesse contexto que jardins verticais, muros verdes e demais tipos espaciais se realizam: sem metas, sem continuidade. Embora parte de uma série de medidas legais voltadas às questões ambientais para a ampliação de áreas verdes urbanas, observa-se que a ausência de metas e indicadores da eficácia na produção sistemática de novos tipos espaciais que compõem a infraestrutura verde municipal geram resultados pífios, que não correspondem à importância que exercem as ações ambientais na qualidade de vida e de saúde do cidadão. 

*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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