Coligações mostram que o Congresso é a terra onde os fracos não têm vez

Deputados que desejam a volta das alianças partidárias armaram um falso dilema, colocaram duas aberrações no mesmo projeto e fizeram a Câmara optar pelo mal menor

  • Por José Maria Trindade
  • 12/08/2021 13h00
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Cleia Viana/Câmara dos Deputados - 10/08/2021 Imagem do plenário da Câmara vista do fundo, com muitos deputados de costa, um no telão e um saindo A Câmara dos Deputados votou uma série de projetos voltados à segurança pública no retorno do recesso parlamentar

Os deputados só pensam naquilo: reeleição. Um círculo vicioso está montado. Os políticos roubam para se reeleger, se reelegem para roubar e vão assim pelos mandatos, até que um dia nenhum deles sabe mais se está se reelegendo para roubar ou roubando para se reeleger. É a tal ética da política, onde todo mal que tenha como objetivo a eleição ou fortalecimento partidário é perdoado. A volta das coligações é um exemplo de como o instinto de sobrevivência política domina os comandos centrais. Os deputados e senadores jogaram os vereadores numa experiência considerada trágica. Acabaram com as coligações partidárias nas eleições proporcionais e analisaram detidamente todos os resultados. Uma carnificina. Muitos vereadores perderam os mandatos, pois estavam pendurados em projetos políticos falsos. Os deputados voltaram com as contas prontas, e era mesmo preciso acabar com as coligações. O movimento começou pelos parlamentares sem base própria e foi inicialmente barreirado pelos grandes partidos. 

As coligações partidárias permitem que partidos sem nenhuma identidade se unam para formar o quociente e eleger deputados. Uma comensalidade. Os votos são somados e fazem as vagas nas câmaras de vereadores, nas assembleias e na Câmara dos Deputados. Depois de eleitos, os parlamentares, sem nenhum constrangimento, se transformam em adversários políticos nos plenários. Para eles, pouco importa, o objetivo é a eleição e reeleição. Uma coligação com mais candidatos e “puxadores de votos” consegue mais vagas e acaba elegendo os que não teriam números. Candidatos que dominam partidos fazem as contas e enchem a coligação de candidatos sem importância, completam a legenda e se elegem. Os outros candidatos acham que estão tentando a vida política buscando votos para eles, mas na verdade estão no projeto do dirigente. Os votos vão para os que estão no andar de cima. O distritão parece menos cruel, mas não é. Os mais votados são eleitos, simples assim. Parece justo, mas um desastre para a vida política. Aí entram os mais famosos, atores, jogadores de futebol, cantores e principalmente os dirigentes partidários.

Sem a legenda, o partido lança poucos candidatos, dois ou no máximo quatro. A estratégia é evitar a divisão dos votos e, principalmente, do dinheiro do partido para a campanha. O lado negativo é que favorece muito os que já estão no poder, impede a formação de novos quadros. O processo acaba com a formação de novos quadros e fortalecimento dos partidos. Uma eleição assim leva para a Câmara políticos soltos, sem as amarras partidárias e donos dos mandatos. Negociam voto, posicionamento e mandato. O Congresso se transformaria numa torre de babel, onde cada um tem o seu projeto. Uma política assim significa o fim dos partidos políticos, base para uma democracia estável. Mas os deputados não estão pensando nestas coisas de país, democracia ou partido. Eles estão é pensando neles. 

Na Câmara, a armadilha foi montada. Para furar o cerco dos grandes partidos, os deputados que querem a volta da coligação armaram um dilema falso. Colocaram no mesmo projeto e aprovaram na comissão especial duas grandes tragédias. Mais ou menos dizer que é uma coisa ou outra, mas as duas juntas no mesmo prato. Distritão e coligações proporcionais são incoerentes, mas apareceram no projeto, e os parlamentares tiveram que optar por matar o distritão e ficar com o “mal menor”, as coligações proporcionais. Só o Senado, que não depende das coligações proporcionais, para evitar a volta deste crachá. O distritão já está descartado. Todo o debate em nome de uma reforma eleitoral está aí, na volta das coligações. E, se desse, no financiamento de campanha eleitoral, com “doação” por empresas para partidos. Este item não pegou, mas ficou o fundão bilionário aprovado na LDO.

*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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