Com decisão de Nunes Marques, condenados na Lava Jato poderão se candidatar
Liminar derrota de uma só vez a Câmara, Senado, Presidência da República e plenário do Supremo e corta a lei da Ficha Limpa
O Congresso teve que engolir a Lei da Ficha Limpa. Eram tempos onde os réus e investigados investiam em política. Guardados pelo privilégio de julgamento no Supremo, políticos se escondiam atrás do poder. Um grupo de juízes, com apoio da CNBB, OAB e entidades civis mudaram o hábito e a proposta de lei foi entregue ao Congresso com mais de um milhão de assinaturas. Isto não seria suficiente se não houvesse a participação em forma de pressão do público. Por onde andava, o parlamentar era pressionado a aprovar a proposta. Foi assim que o projeto andou e passou entre deputados e senadores no Congresso. Uma lei para ser considerada boa, aplicável e experimentada, além de aprovação no Congresso, tem que passar pela sanção do presidente da República e depois do Judiciário. O caminho foi trabalhoso, mas conquistado. A Lei Ficha Limpa chegou ao Supremo por entendimento de repercussão geral. Houve divergências, mas o plenário do Supremo Tribunal Federal acabou confirmando a lei que promoveu mudanças na cultura dos eleitos por aqui. Do TSE, para os ministros da mais alta corte, assuntos divergentes foram esclarecidos. Num caso raro, a aplicação retroativa foi confirmada. Os candidatos condenados antes da lei não puderam se safar. Neste caso, não é preciso o tal “transitado em julgado”. O raciocínio é de que a elegibilidade é uma condição, e não um direito.
Os condenados em tribunal colegiado, ou a penas superiores a três anos, ficam sem possibilidade de candidatura. Os políticos formaram equipes jurídicas especializadas e por aqui se fala inclusive no terceiro turno, que é a disputa judicial depois das eleições. Diante deste poderio jurídico, os assuntos relativos à ficha limpa chegaram rapidamente ao TSE e ao Supremo. A jogada de mestre foi definir condições de elegibilidade, incluindo a ficha limpa. Nada mais óbvio, mas já em 2010, o óbvio tinha que ser escrito em lei e discutido no Supremo. O número de candidatos sujos barrados é muito grande. Hoje, os condenados nem tentam mais entrar para a política, mas mesmo assim 2.500 candidatos foram barrados nas últimas eleições.
O que vem agora contra a lei assusta pelo uso do poder de um ministro do Supremo de forma isolada. O plenário do Supremo já decidiu pela aplicação desta norma, inclusive sobre o prazo de inelegibilidade. Em decisão liminar, o mais novo ministro do Supremo, Nunes Marques, surpreendeu e, na canetada, suspendeu o prazo em que o condenado em tribunal colegiado deve ficar com direitos suspensos. Pelo texto, 8 anos após o cumprimento da pena. Para o ministro, o prazo é a condenação. O pedido é do PDT e pede a suspensão do termo “após o cumprimento da pena”. Por este novo conceito, os primeiros condenados da Lava Jato já poderão se candidatar. A vontade legislativa foi de varrer do mundo político os condenados, mas uma pena assim é impossível diante do conceito de que não há penas perpétuas no Brasil. Este artigo retirado pelo ministro Nunes Marques tem como objetivo dar um equilíbrio entre crimes graves e os mais leves em termos penais. Não se pode dar o mesmo prazo de inelegibilidade para quem cometeu um crime grave e quem cometeu um crime mais leve. Daí, a saída inteligente e já confirmada pelo plenário do Supremo de que a suspensão começa a contar do cumprimento da pena.
Juridicamente, a decisão é uma aberração. Como pode uma liminar assinada pelo ministro mais novo do Supremo, Nunes Marques, revogar uma decisão do plenário? Estas sentenças monocráticas mostram que a jurisprudência para o Supremo muda ao sabor do processo. A surpresa também é a origem da ação, o PDT. Certamente o plenário vai cassar a liminar, mas fica mais um ponto para o debate sobre a necessidade de limitação pelo Congresso do uso destas decisões monocráticas. Por enquanto, apesar de discutíveis, as liminares mandam e transformam o Supremo em 14 órgãos. O plenário, as duas turmas e os gabinetes dos 11 ministros. O Congresso está devendo uma regulamentação do poder das liminares.
*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.
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