STF vai analisar se Lei de Segurança Nacional pode ser considerada inconstitucional

Há três representações a serem avaliadas pelo Supremo, mas a primeira da fila é a do PTB; o partido argumenta que ela tem sido usada para suprimir liberdades de expressão

  • Por José Maria Trindade
  • 24/03/2021 11h48
Vinicius Loures/Câmara dos Deputados O deputado federal Daniel Silveira O deputado federal Daniel Silveira foi preso com base na Lei de Segurança Nacional

Nunca a velha e gasta LSN, a Lei de Segurança Nacional, foi tão requisitada e debatida. A mesma lei usada para prender um deputado federal em pleno exercício do cargo é elogiada por um grupo que, em seguida, faz críticas pesadas quando a mesma peça legal é usada para constranger críticos do presidente e do governo. De “pequi roído” a faixas em frente ao Palácio, a LSN virou debate. Agora a discussão se impõe e o Supremo Tribunal Federal se prepara para aposentar o velho instrumento que perdeu mesmo o sentido e soa estranho como uma velha arma enferrujada encontrada em uma gaveta. Pode funcionar, mas perdeu a força e deve ser descartada ou trocada por um novo instrumento. 

Em 1988, a nova Constituição foi promulgada. Houve remissões a leis e decretos para regulamentar artigos novos, mas a base legal continuou em vigor até o momento, a não ser que haja conflito com o novo texto da Carta. Aí é que mora o debate, que só agora toma proporções para movimentar o plenário do Supremo. Em 2009, uma discussão parecida foi parar na avaliação dos ministros. Era a sobrevivência da Lei de Imprensa, que tinha sito promulgada em 1967. A maioria determinou: incompatível com a nova Constituição.  Não houve unanimidade, a declaração de inconstitucionalidade da Lei de Imprensa contou com votos dos ministros Eros Grau, Menezes Direito, Cármem Lúcia, Ricardo Lewandowski, Cezar Peluso e Celso de Mello. O relator foi o ministro Carlos Ayres Britto, foi o pedido de Descumprimento de Preceito Fundamental. Os ministros Joaquim Barbosa, Ellen Gracie e Gilmar Mendes entenderam que a lei poderia ser aplicada em parte e o ministro Marco Aurélio se isolou e foi contra o pedido de inconstitucionalidade, ou seja, a favor da vigência do entulho que caiu de velho. 

No julgamento que enterrou a Lei de Imprensa, o ministro Menezes Direito disse que “não existe lugar para sacrificar a liberdade de expressão no plano das instituições que regem a vida das sociedades democráticas”. A ministra Cármem Lúcia disse no seu voto que a LI tinha o objetivo de “garrotear” a liberdade de expressão e que há “mecanismos para cortar e repudiar todos os abusos que eventualmente ocorram em nome da liberdade de imprensa”. O ministro Joaquim Barbosa aceitou em parte e foi vencido. Ele concluiu que “o tratamento em separado dessas figuras penais, quando praticadas através da imprensa, se justifica em razão da maior intensidade do dano causado à imagem da pessoa ofendida”. O ministro Marco Aurélio ficou no contraponto e votou pela permanência da lei, dizendo que “não posso, de forma alguma, aqui proceder a partir de um ranço, de um pressuposto de que essa lei foi editada em regime que aponto não como de chumbo, mas como regime de exceção, considerado o essencialmente democrático”. 

Agora, entra em debate a LSN. Lembra a edição do AI-5, quando o ministro Jarbas Passarinho, da pasta do Trabalho e da Previdência Social, opinou: “Às favas, senhor presidente, neste momento, todos os escrúpulos de consciência”, foi favorável ao ato que fechou o Congresso, suprimiu direitos e trancou a imprensa. A expressão “às favas” foi trocada na ata por “ignoro”, mas a gravação da reunião de ministros mostra a palavra original. Para justificar a prisão do deputado Daniel Silveira, o ministro Alexandre de Moraes usou a LSN.  No seu voto, o ministro Luís Roberto Barroso deixa claro que “já passou a hora de nós superarmos a Lei de Segurança Nacional, que é de 1983, do tempo da Guerra Fria, que tem um conjunto de preceitos inclusive incompatíveis com a ordem democrática brasileira”. 

A lei foi usada pelo procurador-geral Augusto Aras contra os chamados atos antidemocráticos. O Ministério da Defesa usou contra o ministro Gilmar Mendes quando ele afirmou que o “Exército estava se associando a um genocídio” na atuação da Saúde em combate à Covid-19. O ministro da Justiça, André Mendonca lançou mão da lei para reagir contra jornalistas. O agressor de Jair Bolsonaro, Adélio Bispo, foi enquadrado na lei pela facada contra o presidente, mas depois considerado inimputável. A novidade agora é que o assunto foi colocado na porta do Supremo. São três representações, mas a primeira da fila é a do PTB. O partido quer que a LSN seja declarada inconstitucional. O argumento é de que ela tem sido usada para suprimir liberdades de expressão. Com a palavra, os ministros e o Congresso, que já está gestando uma nova proposta, o projeto que cria a Lei de Defesa do Estado Democrático e das Instituições.

*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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