Conselhos do Padre Antonio Vieira cairiam como luva na sociedade atual

Se as suas palavras fossem seguidas hoje, acredito, as mazelas do nosso país poderiam ser rapidamente sanadas

  • Por Reinaldo Polito
  • 27/07/2023 09h00 - Atualizado em 27/07/2023 17h15
Reprodução/Freepik/Fotos gratuitas Homem lendo livro É da autoria do Padre Antonio Vieira a melhor e mais importante aula de oratória que se conhece

Sempre que falo do Padre Antonio Vieira em sala de aula, procuro saber se alguém desconhece essa personalidade histórica. Vez ou outra surge um aluno dizendo que nunca soube da existência dele. Infelizmente, boa parte da geração atual passa pelos bancos escolares sem ouvir nomes como os de Vieira, Rui Barbosa, Joaquim Nabuco. Cada um deles possui histórias fascinantes. Aproveito para contar um pouco sobre essas curiosidades. É uma tentativa de estimular a classe a pesquisar e se aprofundar no conhecimento daqueles que marcaram a vida intelectual brasileira. A respeito de Vieira esclareço que – reproduzindo as palavras do professor Silveira Bueno, um dos mais destacados filólogos que tive a felicidade de conhecer – foi o maior orador, o mais elevado pregador e o mais perfeito escritor da língua portuguesa. Ninguém falou e ninguém escreveu melhor que ele. Vieira não é brasileiro de nascimento. Nasceu em Lisboa no dia 6 de fevereiro de 1608 e veio ainda criança para o Brasil, antes de completar oito anos. Aqui iniciou os estudos no colégio da Companhia de Jesus, na Bahia. Em 1623, depois de ouvir uma pregação do Padre Manuel do Carmo sobre as penas infernais, se encantou e decidiu naquele momento que seria sacerdote. Com 15 anos de idade entrou para a Companhia de Jesus e ingressou no Colégio dos Jesuítas aos 17 anos, tendo ali a oportunidade de professar.

Desde muito jovem, aos 18 anos, atuou como professor de retórica em Olinda. Permaneceu depois na Bahia para concluir os estudos de Filosofia e Teologia. Foi ordenado padre em 1635 e proferiu os primeiros sermões em 1640, sendo o mais conhecido “Sermão contra os holandeses – Bom sucesso das armas de Portugal contra a Holanda”. Morreu em Salvador, na Bahia, em 18 de julho de 1697. É de sua autoria a melhor e mais importante aula de oratória que se conhece. Em 1655, Vieira proferiu o Sermão da Sexagésima. Ensinou com essa pregação como os padres deveriam falar em público. Tudo o que desejarmos saber sobre o orador, sobre os ouvintes e sobre o tema está nesse sermão. Vieira discorre nesses seus ensinamentos aspectos relevantes da comunicação como as cinco “circunstâncias”: a Pessoa, o Estilo, a Ciência, a Matéria e a Voz. Entre as orientações dadas pelo pregador nesse sermão estão, de forma sucinta, os seguintes conceitos: para falar ao vento, bastam palavras; para falar ao coração, são necessárias obras. O estilo há de ser muito fácil e natural. O sermão há de ter um só assunto e uma só matéria. O que sai só da boca, para nos ouvidos; o que nasce do juízo penetra e convence o entendimento.  E como os brados no mundo podem tanto, bem é que bradem algumas vezes os pregadores, bem é que gritem.

Se as suas palavras fossem seguidas hoje, acredito, as mazelas do nosso país poderiam ser rapidamente sanadas. Consideremos o que Vieira diz ao tratar da coerência: “Sabem, Padres pregadores, por que fazem pouco abalo os nossos sermões? Porque não pregamos aos olhos, pregamos só aos ouvidos. Por que convertia o Batista tantos pecadores? Porque assim como as suas palavras pregavam aos ouvidos, o seu exemplo pregava aos olhos”. Esse lema, sem dúvida, é princípio que deveria ser seguido por todos, ou seja, falar e agir de acordo com as palavras. Vemos a incoerência de alguns políticos, por exemplo, que fazem discursos eloquentes, com promessas assentadas em bons princípios, mas que em pouco tempo agem de forma totalmente distinta da que foi pregada. Provam com suas atitudes que suas palavras foram vazias, sem consistência, sem compromisso. Essa distância entre as palavras e as ações não são privilégio apenas do nosso tempo. Vemos que Vieira, já em 1655, pregando àqueles que deveriam dar o exemplo, que eram os padres, alerta que eles estavam pregando apenas aos ouvidos, e não aos olhos. E pede que sigam o exemplo do Batista, que com suas palavras pregava aos ouvidos e com seu exemplo pregava aos olhos. Como até hoje não encontrei uma única pessoa que não concordasse com essas palavras, embora haja tantas que se comportam de forma diversa, podemos continuar alimentando a esperança de que um dia surjam mais indivíduos que não preguem apenas ao vento, mas que passem também a ser e a agir de acordo com suas pregações. Siga pelo Instagram: @polito

*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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