‘Cringe’ é um modismo como tantos outros, com grande possibilidade de cair em desuso logo
Palavra é uma maneira que os nascidos entre os anos de 1995 e 2010 encontraram para zoar a forma de falar e de se comportar daqueles que nasceram na geração anterior
Você também voou para o Google tentando descobrir o significado de cringe? A busca por esse termo aumentou de maneira exponencial. Em poucos dias, a procura ultrapassou a marca dos 500%. Da mesma forma, tentar saber qual é exatamente a faixa etária das gerações Y e Z virou febre entre os internautas, com o interesse superando os 700%. E não se preocupe se depois de ler aqui e ali, acabou descobrindo que, por mais que tentem explicar, o conceito de cringe continua meio nebuloso. Alguns dizem tratar-se de uma gíria que significa “vergonha alheia”, “vergonhoso” ou “constrangedor”. É uma maneira que os nascidos entre os anos de 1995 e 2010, que fazem parte da geração Z, encontraram para zoar a forma de falar e de se comportar daqueles que nasceram entre o final da década de 80 e os anos 90. Ocorreu aí um fato curioso. Assim como a torcida do Palmeiras, por exemplo, adotou o “porco” como símbolo do time para se contrapor aos adversários que faziam gozação, da mesma forma parte da geração Y passou a usar o cringe como autogozação, com a intenção de esvaziar os comentários sarcásticos da nova geração.
Quando você pensa que está entendendo bem o significado do termo, aparecem outras explicações dizendo que a palavra se originou do verbo inglês “to cringe”, com tradução não tão simples para o português; e também do adjetivo alemão “Krank”, que é conceituado como sendo algo não muito sadio. Mas vamos lá: ao consultarmos um dicionário inglês/inglês (Longman), vemos que cringe pode ter alguns sentidos como, por exemplo, dobrar-se e recuar, comportar-se sem autorrespeito com relação a alguém em uma posição mais importante ou de maior poder, ter um sentimento bastante desconfortável de vergonha ou de insatisfação. Observe que, dessa conceituação original até chegar à gíria utilizada atualmente aqui no Brasil, há uma enorme diferença. Ajudou ou atrapalhou um pouco mais? E o que é considerado cringe para essa geração Z? A lista é infindável, mas o que tem aparecido com maior frequência é: tomar café da manhã, gostar dos filmes e de coisas relacionadas à Disney, ser fã de Harry Potter ou de Friends. Na verdade, qualquer comportamento ou palavra que lembre a época anterior aos anos 2000 pode ser considerado cringe, dependendo da vontade de quem esteja analisando.
Se quer um conselho, não dê muita importância para essa discussão. Algumas pessoas ficam preocupadas em saber usar o termo cringe na hora certa e no contexto adequado. Outras têm receio de dizer algo ou se comportar de tal forma que possa ser tomado como vergonhoso. Pode ter certeza de que esse é um modismo, como tantos outros, com grande possibilidade de cair em desuso logo. Algumas palavras e expressões surgem e são usadas ad nauseam, e de um momento para outro somem. Houve época em que dizer “supimpa” para o que tivesse qualidade fazia parte do bom vocabulário. Hoje, a não ser quem esteja na faixa dos 60 ou 70 anos, talvez nunca tenha ouvido falar nesse vocábulo. Nos anos 1970, por causa da propaganda de um refrigerante, era comum dizer que alguém que estivesse fora de moda, ultrapassado, era boko-moko. Uma gíria de que quase ninguém mais se lembra. Dentro desse mesmo processo, hoje, podemos encontrar algumas palavras que viraram modismo. Como o uso da língua é dinâmico, muito provavelmente, irão ou desaparecer, ou perder sua importância, ou ainda agregar outros sentidos por conta de novos contextos. Por exemplo, termos como empoderamento, proativo, pertencimento, customizar são usados com tanta frequência que até acabam por enfraquecer o discurso.
Na vida corporativa é muito comum os profissionais adotarem alguns termos e expressões só para mostrar que estão atualizados, ou, usando um termo cringe, “na crista da onda”. Em certas situações é possível notar que a pessoa até faz esforço para encaixar determinadas palavras na construção das frases. Expressões como economia criativa, resiliência, ressignificar, sustentabilidade, etc. não participavam do vocabulário normal nas empresas, e agora são inseridas praticamente o tempo todo. Algumas se mostram úteis pois chegam a substituir ideias completas e se integram naturalmente ao vocabulário corporativo. Outras, ao contrário, na maioria dos casos, surgem e desaparecem sem que ninguém perceba. Não há mal nenhum em usar palavras novas, que estejam nas conversas do dia a dia. Só tome cuidado com o uso excessivo desses termos, para não ser visto como um novidadeiro artificial, e observe o momento em que o modismo começa a se tornar cansativo e até enjoativo. Nesse caso, resgate as velhas e boas palavras do estoque. Elas já passaram pelo controle de qualidade e demonstraram sua utilidade e vitalidade. Portanto, se você se assustou com o surgimento avassalador do cringe, fique tranquilo porque essa é mais uma daquelas que tem tudo para não pegar.
*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.
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