Sem sucesso na articulação, Lula já começa a ver com quantos paus se faz uma canoa

Petista liberou milhões em verbas, ofereceu cargos em todos os escalões do governo, mas não consegue formar uma base consistente que o ajude a levar em frente seus projetos

  • Por Reinaldo Polito
  • 18/05/2023 09h00 - Atualizado em 18/05/2023 12h09
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FREDERICO BRASIL/THENEWS2/ESTADÃO CONTEÚDO Lula Articulação política do governo Lula 3 patina no início do mandato

Governar com a Constituição debaixo do braço não é tarefa simples para nenhum presidente. José Sarney foi profético: “A inclusão de todas as reivindicações corporativas tornou o país ingovernável, fazendo da Constituição Federal algo mais grave que um Frankenstein”. Acertou na mosca! Lula se elegeu imaginando que tudo seria como dantes no quartel-general …. E começou seu terceiro mandato convicto de que iria surfar em ondas serenas e confortáveis, como se estivesse em voo de cruzeiro. Que nada! Já nos primeiros momentos, percebeu que tinha pela frente nuvens espessas e tempestade brava. Tentou se relacionar com a Câmara dos Deputados exatamente como se comportou no passado. Bateu com o nariz na porta. Experimentou do mesmo veneno que Bolsonaro foi obrigado a engolir nos seus quatro anos de mandato.

E olha que Lula tem uma vantagem. Embora encontre resistências na Câmara, por outro lado tem em Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, um verdadeiro “brother”. Pacheco não hesitou, por exemplo, em acatar a “sugestão” do ministro Barroso para abrir a CPI da Covid-19. Não só deu sinal verde para iniciar, como também para que fosse prorrogada. Foi um bombardeio feroz contra o então presidente da República. Agora não. Para ler o relatório de abertura da CPMI de 8 de janeiro foi um parto. Viaja, adia, prorroga. Deu o tempo que Lula precisava para fazer alguns acertos com a base aliada.

Quando Bolsonaro estava no poder, seus críticos viviam censurando sua falta de habilidade para articular com os deputados e senadores. Alguns diziam que ele não tinha diálogo construtivo com os parlamentares. Afirmavam que não se dedicava a construir uma relação harmoniosa com o Legislativo. Embora fosse sua promessa de campanha não abrir os cofres e os cargos para facilitar negociações com os congressistas, foi censurado por cumprir o que prometera. Contando com impressionante apoio popular – eleitores que votaram nele exatamente para fazer frente ao sistema – não queria se render às pressões dos deputados e senadores. Por isso, não conseguia aprovar boa parte de seus projetos, e por esse motivo foi espinafrado pelos oponentes. Quando resolveu abrir diálogo mais próximo com o Centrão para garantir maior governabilidade, continuou sendo apedrejado por ter mudado. Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come.

Na verdade, o ex-presidente não tinha muito o que fazer. Mal escapava de Rodrigo Maia e já caía no colo de Davi Alcolumbre. Ou alguém já se esqueceu da canseira que o senador amapaense deu para sabatinar André Mendonça, indicado por Bolsonaro ao cargo de ministro do STF?  E quando pensou que estivesse livre daquele presidente do Senado, eis que surge outro Rodrigo para azucrinar a sua vida, o Pacheco. Maia atuou como um ferrenho adversário de Bolsonaro. Não perdia oportunidade para criticá-lo. Sua gaveta vivia abarrotada de propostas do governo. Deixou caducar cerca de metade dos projetos encaminhados. Permitiu que expirassem propostas simples como, por exemplo, a criação da Carteira de Identificação Estudantil gratuita. A MP do Mandante, que concedia ao clube mandante o direito de negociar livremente a exibição do jogo. O fim da obrigatoriedade de publicação de balanços de empresas de capital aberto em jornais impressos. E até as mais complexas como, por exemplo, desfazer-se de ativos da Caixa Econômica Federal.

Sem exagero, para enfrentar Alcolumbre e os dois Rodrigos, Bolsonaro teve de comer o pão que o diabo amassou. Agora, Lula está vendo com quantos paus se faz uma canoa. Já liberou milhões em verbas, ofereceu cargos em todos os escalões do governo, mas mesmo assim não consegue formar uma base de sustentação consistente que o ajude a levar em frente seus projetos. Suas excelências gostam de um agradozinho, mas sentem que as propostas que surgiram até aqui são ruins demais. Além da resistência à má qualidade dos projetos, com a atuação intensa das mídias sociais, sabem que se embarcarem nessa nau desgovernada sem uma boa explicação, poderão perder parte importante do eleitorado. Está todo mundo de olho.

Portanto, Lula terá de se reinventar. Se continuar com a mesma cabeça com que governou o país nas suas duas primeiras gestões, pode até comer castanha com Dona Janja neste Natal no Palácio da Alvorada, mas a oposição fará de tudo para que esse banquete não se repita nos próximos anos. Siga pelo Instagram: @polito

*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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