Moro precisa acertar a sintonia fina do discurso para conquistar votos

O sonho de Moro era o de ocupar uma cadeira no Supremo Tribunal Federal (STF); como Bolsonaro teria direito a fazer duas indicações, deixou a entender que uma delas poderia ser para o seu ministro

  • Por Reinaldo Polito
  • 16/12/2021 10h00
ALEX SILVA/ESTADÃO CONTEÚDO Ex-ministro da Justiça, Sergio Moro, discursa durante lançamento de seu livro Moro terá de aprender a falar com a massa de eleitores, e essa é uma linguagem que tem suas peculiaridades; somente quem está habituado às campanhas políticas é que conhece o caminho para tocar o coração e a mente dos eleitores

Quando Moro atuava como juiz da primeira vara em Curitiba, conquistou a simpatia da população. Afinal, estava em suas mãos a oportunidade de o país ver de uma vez por todas os graúdos indo para a cadeia. Por isso, virou herói nacional. Boa parte dos brasileiros queria vê-lo ocupando funções mais importantes que aquela de juiz de primeira instância. Bolsonaro deu o que parecia ser uma tacada de mestre. Com a ajuda do ministro Paulo Guedes, fez o convite para que Moro ocupasse o cargo de ministro da Justiça e Segurança Pública. Logo nos primeiros meses Moro descobriu que o jogo político era mais pesado do que supunha. Ao apresentar o projeto do pacote anticrime, percebeu que os deputados não estavam interessados no assunto. E foi atropelado. O então presidente da Câmara, Rodrigo Maia, desqualificou o ex-juiz de forma grosseira e desrespeitosa. Afirmou que ele era apenas um “funcionário de Bolsonaro”, e que as medidas anticrime caminhariam na hora em que julgasse necessário. Conseguiu algum sucesso na redução da criminalidade e na apreensão de drogas e contrabandos, mas foi fustigado com as acusações da “vazajato”. Esse foi um período difícil, tanto que precisou da ajuda da popularidade de Bolsonaro para não deixar que a sua imagem fosse prejudicada.

O primeiro sinal de atrito dele com o presidente ocorreu no momento em que Bolsonaro acenou com a possibilidade de dividir o seu ministério em dois, um da Justiça e outro da Segurança Pública. Foi uma espécie de balão de ensaio só para ver a reação das pessoas. Diante da resposta negativa da população, o chefe do Executivo deixou o dito pelo não dito e colocou uma pedra sobre o assunto. O sonho de Moro era o de ocupar uma cadeira no Supremo Tribunal Federal (STF). Como Bolsonaro teria direito a fazer duas indicações, deixou a entender que uma delas poderia ser para o seu ministro. Quando tudo parecia caminhar dentro da normalidade, eis que uma tempestade balança as estruturas de Brasília. Moro deixa o cargo de ministro e sai atirando para todos os lados, acusando o presidente de tentar interferir na Polícia Federal. Sua saída do cargo ocorreu em um momento ruim para o país, pois vivíamos o auge da pandemia. No começo, os bolsonaristas criticaram Bolsonaro pela saída do ministro. Ouvia-se aqui e ali que o governo havia terminado. Com o tempo, tudo foi se acalmando e passaram a identificar Moro como um traidor.

Para muitos, as acusações recorrentes que faz ao presidente vêm de encontro ao que costumava dizer na época em que esteve no ministério, já que durante todo o tempo em que permaneceu no governo nunca fez uma única crítica ao chefe do executivo. Agora se filiou ao Podemos e lançou sua pré-candidatura à presidência. A sua história como juiz bem-sucedido começa a ser questionada. Passou a ser acusado de atuar de forma seletiva, não investindo contra alguns políticos. Talvez sejam narrativas criadas, mas que começam a se cristalizar no imaginário popular.
Por enquanto pesam algumas denúncias leves contra ele: de ser traidor, de não ter acusado alguns políticos e de ser artificial em seus discursos. Na verdade, é muito pouco para quem concorre a um cargo de tamanha relevância. São acusações insignificantes quando comparadas às que recaem sobre Lula. De todos os candidatos da chamada terceira via, Moro foi o que largou melhor. As últimas pesquisas mostram que, fora Lula e Bolsonaro, é o candidato com mais chances de chegar ao segundo turno. Será uma longa caminhada.

Moro terá de aprender a falar com a massa de eleitores. Essa é uma linguagem que tem suas peculiaridades. Somente quem está habituado às campanhas políticas é que conhece o caminho para tocar o coração e a mente dos eleitores. É uma espécie de discurso populista, mais ou menos apelativo, mas que passe a ideia de autenticidade. Acertar essa sintonia fina não é fácil. Exige estudo, prática e muita sensibilidade. Moro está só ensaiando. Resolveu eleger Bolsonaro como alvo predileto, pois imagina que essa atitude poderá conquistar votos dos bolsonaristas descontentes. Por outro lado, fica estranho não abrir a boca para atacar Lula depois de tudo o que descobriu sobre o ex-presidente. Também é meio esquisito ele não se rebelar contra o STF. Se é tão poderoso como deseja demonstrar, como não apontar os erros e injustiças que alguns membros dessa Corte cometeram contra ele? Vamos acompanhar.

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*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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