Será que Moro consegue emplacar com seu jeito de falar?

Uma coisa é sentar na cadeira do juiz e se valer da autoridade do cargo para conseguir o que deseja; outra, diferente, é comer pastel de vento e tomar café frio no boteco

  • Por Reinaldo Polito
  • 02/12/2021 10h00 - Atualizado em 02/12/2021 10h04
BRUNO ROCHA/ENQUADRAR/ESTADÃO CONTEÚDO Sergio Moro de máscara acenando ao público presente na sua filiação ao Podemos Sergio Moro deve ser candidato à presidência em 2022

Você acredita em pesquisas? Eu acredito. Os levantamentos e análises são realizados com amparo científico largamente comprovado. Sim, pesquisa é coisa séria. Só que se falarmos em pesquisas eleitorais, a história muda um pouco de figura. Se formos nos basear nos dados apresentados pelos institutos nas eleições de 2018, dá para ficar com a pulga atrás da orelha, pois todos erraram feio. Para eles, Bolsonaro seria derrotado por qualquer candidato que chegasse ao segundo turno. A maioria dizia que ele nem passaria da primeira fase. A partir daí, podemos deduzir que qualquer resultado apresentado neste momento, quando estamos a um ano do pleito presidencial, pode ser visto como peça de ficção. Por outro lado, é o que temos para hoje. Mesmo sabendo que a pesquisa se limita a uma fotografia deste instante, vamos imaginar que os números sejam verídicos e indiquem uma tendência. Nessa hipótese, Moro é o candidato com mais força para enfrentar Lula no segundo turno. Pois é: de acordo com os levantamentos divulgados, Bolsonaro seria destroçado pelo petista.

Independentemente dessas projeções, o que vale mesmo em uma campanha é a capacidade de o candidato se comunicar. E saber se comunicar não significa apenas saber falar. A boa comunicação envolve uma série de requisitos, como, por exemplo, fazer uma leitura correta das aspirações dos eleitores; usar a emoção na medida certa para ser visto como autêntico, e não como um simples ator; encontrar as palavras que, além de identificar seus pensamentos, possam também ir ao encontro dos sentimentos da população; e, acima de tudo, coerência entre o discurso e o comportamento do candidato. Embora Bolsonaro sempre seja criticado por causa da sua comunicação, a verdade é que quase ninguém domina esse conjunto de fatores como ele. Era desconhecido, um insignificante deputado do baixo-clero, tosco, sem coligação política, com apenas 8 segundos de televisão, atacado pela grande imprensa, que só o ridicularizava. Dependeu das ‘tias do zap’ nas redes sociais.

Chega a ser engraçado quando nos lembramos de como os seus programas eram produzidos: uma mesa rústica com uma jarra de suco artificial, um cenário mostrando a bandeira brasileira fixada na parede com fita isolante, uma raquete para matar mosquitos… e ele ali, sem nenhum aparato técnico, contando apenas com um simples celular. Apesar de toda essa precariedade, venceu as eleições porque soube se comunicar. Ele não desaprendeu. Ao contrário, está ainda mais experiente e bem informado. Se antes precisava recorrer ao “Posto Ipiranga”, o Paulo Guedes, hoje já fala com desenvoltura sobre inflação, taxa de juros, balança de pagamentos, comércio externo e tantos outros temas. Se participar de debates, terá respostas na ponta da língua para essas questões.

Lula também é um encantador de serpentes. Mesmo que alguns aleguem que as pesquisas estejam sendo “benevolentes” com ele, temos de concordar que a “jararaca” está viva. Cortaram o rabo dela com todas as acusações e condenações que sofreu, mas a cabeça da cobra ainda está se debatendo. Envelhecido, sem a rapidez de raciocínio que possuía em outras campanhas, com todos os flancos vulneráveis para ser atacado, continua como o grande líder da esquerda. E Sergio Moro? Mesmo que tenha aprendido a se expressar em público com mais eficiência, diante dessas raposas da política terá dificuldade para sobreviver. Tem o respaldo dos anos em que atuou como juiz combatendo os crimes da Lava Jato, mas só esse crédito não o levará à cadeira presidencial. Terá de saber como lidar com o povão. E não vai adiantar copiar o desempenho dos candidatos mais experientes, como Bolsonaro e Lula. Precisará descobrir o seu próprio estilo de comunicação para se tornar vitorioso.

O caminho é longo. Ele é inteligente e muito bem-preparado. Se arregaçar as mangas e se dedicar a esse árduo aprendizado, poderá até surpreender. Precisa correr. Deve se conscientizar de que agora não é mais um juiz, nem um ministro, nem um blogueiro – é um candidato com salário pago pelo partido, que precisa a cada dia convencer um eleitorado que talvez ainda nem saiba a que efetivamente aspira. Essa é a chave – ter essa sensibilidade para dizer ao povo o que ele precisa, e acertar no diagnóstico. E depois mostrar sua competência para resolver esses problemas. Será que consegue? Ah, e ainda combinar com os russos para que não o ataquem. Não poderá pedir aos adversários que peguem leve com ele pelo fato de ser apenas um principiante que acabou de entrar na arena. Assim que colocar a cabeça para fora já começará a levar bordoada. Vamos ver se aguentará a contenda. Por suas atitudes, parece que nem ele ainda sabe qual será a sua reação quando estiver frente a frente com essas feras. Em pouco tempo saberemos. Siga pelo Instagram: @polito.

*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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