Só a ingenuidade justifica o investimento arriscado que fiz nos anos 1980

Graças a essa ingenuidade, entretanto, é que hoje colho os frutos de uma empreitada na qual só eu acreditei

  • Por Reinaldo Polito
  • 30/05/2024 09h30
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Freepik aulas freepik Para que as pessoas conhecessem a qualidade do meu trabalho, ministrava dez aulas gratuitas no início de cada curso

Vou contar uma história pessoal. Um relato que tem por objetivo incentivar aqueles que gostariam de empreender, de levar uma ideia à frente, mas estão com receio de dar o primeiro passo. Tomara que possa ajudá-los. Nos anos 1980 eu era mais ingênuo do que sou hoje. Sim, passam as décadas e continuamos a aprender todos os dias. Quantos de nós, no aconchego do travesseiro, às vezes, pensamos indignados: como pude agir assim?!

Frutos de uma ingenuidade

Graças a essa ingenuidade, entretanto, é que hoje colho os frutos de uma empreitada na qual só eu acreditei. Não houve uma pessoa sequer que me dissesse: você está certo, vá em frente. Siga o seu caminho, pois ele dará bons resultados. Não, nenhuma palavra de incentivo. Sabe por quê? Porque eram pessoas sensatas. Sabia que para projetar bem o meu curso precisaria ser conhecido no mercado. De nada adiantaria desenvolver o melhor programa de oratória se ninguém soubesse da sua existência. Por isso, tracei um plano estratégico muito questionável. Investiria 90% da minha receita em propaganda.

Números impressionantes

Eu desenvolvia três cursos por ano. Cada curso era composto de cinco turmas. Para ser rentável, precisaria por volta de 150 a 200 alunos. Ou seja, só nos cursos regulares seriam anualmente 450 a 600 alunos. A receita era complementada com aulas particulares, cursos in company e palestras. Para que as pessoas conhecessem a qualidade do meu trabalho, ministrava dez aulas gratuitas no início de cada curso. Para ter o número de alunos necessários, era preciso que cerca de 2 mil interessados se registrassem para essas aulas. Desses que marcavam para assistir à aula, 600 compareciam. E desses 600, 150 a 200 se matriculavam.

O risco da greve

Como conseguir esse número de pessoas interessadas em assistir às aulas de apresentação gratuitas? Só na base da propaganda agressiva. Enviávamos mais de um milhão de folhetos pela mala direta. Exigia muito dinheiro. Era preciso elaborar a arte, confeccionar os folhetos, comprar as etiquetas, pagar a etiquetagem e os Correios. Ah, e torcer para que os carteiros não entrassem em greve na época da divulgação.

O investimento maior, entretanto, eram os anúncios nos jornais. Programávamos de três a quatro anúncios de página inteira, em local nobre, que eram as páginas 7 ou 9, na Folha e no Estadão. Fiz um levantamento rápido para saber quanto custaria uma campanha dessa hoje.

Números atuais

Quase caí das pernas. Cada anúncio, no Estadão, de 460 a 600 mil; e na Folha, de 460 a 570 mil. Como era cliente regular, conseguia 50% de desconto. Mesmo assim, em conta rápida daria hoje o montante aproximado de 1,8 milhão. Mais uns 200 mil da mala direta, o investimento final chegaria a 2 milhões. Depois de tantos anos, esses números poderiam agora ser hipotéticos. Vou tentar pôr no papel em conta de caderneta. Cada aluno pagava por volta de US$ 2 mil. Em valores de hoje daria uns R$ 10 mil. É só multiplicar 200 por 10 mil para ver que não sobrava nada. A conta não fechava.

Por isso, era preciso complementar a receita com cursos in company, palestras e alunos particulares. A propaganda ajudava muito nessa receita “marginal”. As empresas resolviam fechar turmas por causa dos anúncios. Noves fora nada, 90% do que recebíamos iam para a publicidade. Tinha de trabalhar os três períodos do dia, das 8h30 até às 23h. Além de sábado de manhã e à tarde. Nunca cansava. Ficava feliz em ver as salas lotadas. Nada me dava mais prazer que ensinar o que sabia.

Lembrança de décadas

Com o restante, pagava os funcionários, comprava novos equipamentos, fazia manutenção e um caixa para as emergências. Essa prática durou mais de uma década. Diziam, em tom de ironia, que concorríamos com as Casas Bahia na propaganda. Deu certo. Como consequência, construí a mais renomada escola de oratória da América Latina, e uma das maiores do mundo. Hoje, passados 40 anos, algumas pessoas comentam comigo: puxa, eu me lembro daqueles anúncios de página inteira nos jornais. Eram de impressionar.

Zero de propaganda

Graças a esse investimento na marca, atualmente não preciso mais gastar nenhum tostão com propaganda. Mais de 90% dos nossos alunos vêm ao curso por indicação de ex-alunos e por informações de que o curso tem qualidade. Os outros nos procuram por causa das redes sociais, entrevistas, palestras e dos livros que publicamos. São 35 meus e 10 da minha filha Rachel.

Foi um risco que só com a minha ingenuidade da época estaria disposto a correr. Poderia ter dado errado, mas foi uma iniciativa bem-sucedida. Por isso, quando alguém me procura todo entusiasmado com um projeto, jamais tento demovê-lo da ideia. Peço apenas que meça bem as consequências, mas que vá em frente com o seu plano. Comento que o ingrediente principal ele já tem – a disposição, a fé e o envolvimento para empreender. E você, tem algum sonho? Siga pelo Instagram: @polito

*Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião da Jovem Pan.

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