Dilma não tem desculpa: foi alertada para o risco de esculhambação
E a Operação Zelotes também bate à porta de Dilma Rousseff. Como? Vamos ver. Antes, algumas considerações.
O Brasil nunca foi exemplo de administração pública, em nenhum governo. Houve, no entanto, aqueles que procuraram criar mecanismos e modos de conter a corrupção e os que fizeram o contrário. Os petistas costumam se orgulhar, de maneira besta e improcedente, dos múltiplos casos hoje em investigação. Tentam tomar isso como evidência de que, então, há rigor e transparência.
É evidente que se trata de uma bobagem. O que se tem é a demonstração da desmedida da corrupção. Por quê? Porque o PT esfrangalhou o estado brasileiro e o que havia de mecanismos, já tão pouco rígidos, para afastar os larápios dos negócios do estado.
Vocês todos sabem que está em curso a Operação Zelotes. Entre várias práticas corruptas, duas sobressaem na apuração: a quadrilha montada para usar o Carf, órgão da Receita Federal ao qual se pode recorrer contra multas, como instrumento de cobrança de propina e, tão ou mais agrave, a venda de Medidas Provisórias. Ou por outra: MPs editadas pelo governo, de Lula e de Dilma, obedeceriam a interesses que mobilizavam uma milionária máquina de lobby, que pagava propina a funcionários públicos.
Já se sabe que uma MP que beneficiou o setor automobilístico em 2009 com isenções ao longo de anos que chegaram a R$ 1 bilhão pôs para funcionar uma maquinaria de interesses que pagou R$ 32 milhões em “comissão” a lobistas. A Polícia Federal investiga evidências de que funcionários públicos e petistas graúdos podem ter recebido propina.
Muito bem: há duas semanas, a presidente Dilma foi intimada a depor como testemunha na Operação Zelotes. Mandou dizer que não tem nada a informar porque desconhece qualquer evidência de que MPs tenham servido ao tráfico de influência. Pois é… Assim seria se assim se fosse. Mas não é.
Reportagem da VEJA desta semana traz a público um e-mail enviado em 2009 à então ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, e a seu braço-direito, Erenice Guerra — esta também investigada na Zelotes —, alertando para o fato de que o Ministério da Fazenda, cujo titular era Guido Mantega, despachava diretamente com Lula a emissão de decretos e de Medidas Provisórias, sem o prévio exame da Casa Civil. Foi enviado por Luiz Alberto dos Santos, que foi subchefe da pasta entre 2003 e 2014.
Santos concede entrevista à revista e deixa claro que os critérios mais comezinhos de administração pública eram solenemente desprezados. Diz com todas as letras: “Ao não se seguir o rito técnico de análise da matéria, o risco de ocorrer uma decisão manipulada e vinculada a interesses é muito maior”.
Nesse ponto, alguém poderá dizer: “Ora, a então ministra Dilma Rousseff não tinha nada com isso, certo? Afinal, era atropelada”. Pois é… Assim seria se não tivesse sido advertida. Mas foi. Escreveu Santos para Dilma e Erenice: “A se manter a prática de o Ministério da Fazenda despachar com o presidente e enviar para publicação Decretos e Medidas Provisórias com prazo NULO para exame, se tornará impossível exercer nossa função de examinar o mérito das matérias e fazer a discussão mínima sobre seus impactos e efeitos”. O e-mail foi enviado no dia 24 de novembro de 2009.
Tudo inútil. Dilma não e mexeu. Quando chegou à Presidência, Mantega continuou na Fazenda, e se manteve a prática de alijar o corpo técnico da Casa Civil do exame dessas matérias.
As desonerações decididas pelas duplas Lula-Mantega e, depois, Dilma-Mantega respondem por parte do desastre fiscal em curso no país. Agora está claro: decisões foram tomadas ao arrepio de qualquer análise técnica mais acurada, enquanto uma quadrilha, disfarçada de lobistas, atuava para obter e pagar benefícios ilegais.
Ainda que nenhum alto funcionário do governo tivesse se corrompido — há anotações de lobistas, sob investigação, que sugerem o contrário —, o documento que vem à luz indica a esculhambação vigente na gestão de Lula e que permaneceu na da presidente Dilma. Ou por outra: ainda que se pudesse descartar a hipótese de crime, e não se pode, sobraria a prática sistemática de ignorar os princípios fundamentais da boa gestão pública.
E, sim, é evidente que, disso ao menos, Dilma sabia. E está provado que sabia.
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