Editorial: Por que acho que um ministro do Supremo também tem de ser impichado

  • Por Reinaldo Azevedo/Jovem Pan
  • 04/02/2016 17h45
Nelson Jr./SCO/STF Luís Roberto Barroso

Um grupo de 300 deputados assinou o que pode ser considerado um justo manifesto contra Roberto Barroso, ministro do Supremo, que, com efeito, teve um comportamento detestável no julgamento em que o tribunal decidiu o chamado “rito do impeachment”.

O texto foi protocolado na Procuradoria da Câmara e será enviado também ao Senado e ao Supremo. Os parlamentares pretendem reforçar politicamente os embargos de declaração encaminhados pela Presidência da Câmara em que, na prática, se contestam decisões tomadas naquele dia.

Considero o comportamento, o temperamento e as teses de Barroso o que de pior pode acontecer à corte suprema de um país. Penso que ele é excessivamente ideológico, brutalmente vaidoso e entende o Judiciário como um tutor do Legislativo. Já chego lá. Antes, à questão.

Por maioria, o Supremo considerou inválida a eleição da comissão do impeachment, que se deu por voto secreto. Quem abriu a divergência, contrariando o voto de Edson Fachin, foi justamente Barroso. Ele alegou que o Inciso III do Artigo 188 do Regimento Interno da Câmara não prevê voto secreto nesse caso. Ocorre que isso é mentira!

Lá está escrito, literalmente, que a eleição por escrutínio secreto se fará nesses casos, prestem atenção:
“para eleição do Presidente e demais membros da Mesa Diretora, do Presidente e Vice-Presidentes de Comissões Permanentes e Temporárias, dos membros da Câmara que irão compor a Comissão Representativa do Congresso Nacional e dos 2 (dois) cidadãos que irão integrar o Conselho da República e nas demais eleições”.

Eis aí. A expressão “demais eleições” compreende a comissão do impeachment. Barroso, no dia do julgamento, fez o que não se faz. Justificou a sua tese lendo tal dispositivo, mas, acreditem, NÃO O FEZ ATÉ O FIM E OMITIU A EXPRESSÃO “demais eleições”. Há um vídeo que evidencia essa leitura fraudulenta. Vejam:

Fui professor durante muito tempo. E de texto! Ouso inferir que Barroso sabia que o Regimento dizia o contrário do que ele afirmava ali. Por isso há dois momentos, quase fração se segundos, em que se entrega: um primeiro é de hesitação; o segundo o leva à interrupção abrupta da leitura.

Atenção! UM MINISTRO DO SUPREMO FAZ UMA LEITURA DE UM DIPLOMA LEGAL QUE FRAUDA A VERDADE. E essa fraude nem se dá em razão de algum salto interpretativo. E não consta que Barroso seja analfabeto.

Bem, é dispensável destacar que a leitura fraudulenta acabou contando com a colaboração de Teori Zavascki, outro que também sabe ler.

Em que vai dar?
Em que vai dar esse manifesto de protesto? Não sei! O caso é gravíssimo. O certo, e há motivos para isto, seria apresentar uma denúncia ao Senado, que é quem julga ministros do Supremo, por crime de responsabilidade, com vistas a seu impeachment.

Se um ministro do tribuna maior faz uma leitura deliberadamente enviesada de um Regimento e contribui para uma decisão que contraria a vontade manifesta da maioria da Câmaa, que remédio se deve aplicar a ele?

Como informa o site do Senado, “o processo de impeachment de um ministro do STF tem várias etapas e é bastante longo. Ao contrário do pedido de impedimento da presidente da República, que deve ter início na Câmara dos Deputados, a acusação contra membro do tribunal se inicia e se conclui no Senado. Se a denúncia for aceita pela Mesa, é instalada uma comissão especial de 21 senadores, que realiza diligências e inquéritos e decide sobre a pertinência ou não do pedido.

Caso o processo chegue a sua fase final, para votação em plenário, o denunciado deve se afastar de suas funções até a decisão final. É necessário o voto de dois terços dos senadores para que o impeachment se concretize e o acusado seja destituído do cargo. É possível também que ele seja impedido de assumir qualquer função ou cargo público durante um máximo de cinco anos.

Barroso, o exótico
Quando Barroso foi indicado para o cargo, resolvi ler um livro seu intitulado “O Novo Direito Constitucional Brasileiro – Contribuições para a construção teórica e prática da jurisdição constitucional no Brasil”. Na prática, o doutor defende que o Supremo, quando necessário, atue como Poder Legislativo. É um assombro. Há outras barbaridades lá que lembrarei em outros posts.

Barroso foi o grande propagandista no Supremo da tese da proibição da doação de empresas privadas a campanhas políticas. Outra tese, vejam a coincidência, que interessava ao PT. A maioria o seguiu. Resumo da ópera: as eleições de 2016 se farão, na teoria ao menos, sem a doação de empresas e sem financiamento público. Adivinhem quem vai entrar no jogada… Acertou quem respondeu: “o crime organizado”.

Pior: a tese da proibição foi patrocinada por ele quando advogava em favor da causa para o OAB. O texto da Ação Direta de Inconstitucionalidade que chegou ao Supremo era de sua lavra. Deveria, por decoro, ter-se declarado impedido, mas não o fez.

Vou voltar, sim, à atuação deste senhor e a algumas diabruras de seu livro.

Encerro este post afirmando de forma inequívoca, clara, insofismável: alguém que faz uma leitura de um diploma legal amputando a parte que desmoraliza a sua tese não pode ser ministro do Supremo. Cometeu, a meu ver, crime de responsabilidade e tem de ser impichado.

Ainda que me digam: “Ah, Reinaldo, isso não vai acontecer nunca!”. Pode até ser. Mas não significa que não seja o certo.

Afinal, o senhor Barroso é pago para fazer triunfar a lei e os códigos, não para desrespeitá-los.

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