Brasil está melhor que muitos países desenvolvidos na questão ambiental, afirma Nestor Forster

O embaixador brasileiro em Washington (EUA) enviou uma carta de repúdio ao deputado americano que criticou a condução do governo Bolsonaro da preservação da Amazônia

  • Por Jovem Pan
  • 22/10/2021 10h56 - Atualizado em 22/10/2021 11h20
Divulgação/Itamaraty Nestor Forster - embaixador Nestor Forster é o embaixador brasileiro em Washington, nos Estados Unidos

O embaixador brasileiro em Washington, capital dos Estados Unidos, Nestor Forster, enviou uma carta de repúdio ao deputado americano democrata Hank Johnson Jr., que fez uma série de críticas ao Brasil e ao governo de Jair Bolsonaro (sem partido) em uma primeira carta, assinada por outros 62 deputados e enviada ao presidente Joe Biden, solicitando uma  pressão contínua ao Brasil pelo aumento do desmatamento e degradação ambiental da Amazônia. Em entrevista ao Jornal da Manhã, o embaixador comentou o assunto e as relações mantidas entre os países a partir das relações diplomáticas exercidas. Segundo ele, diferentemente, dos debates políticos, os embaixadores devem baixar o tom da conversa e permitir que o diálogo seja feito com dados concretos. Nestor Forster defendeu ainda que o Brasil ocupa, hoje, um lugar no qual muitos países desenvolvidos gostariam de estar no questio da preservação ambiental.

“O nosso esforço é de tentar baixar o tom para que a realidade possa falar por si. De certa forma, é isso que a gente procura fazer. Nós não podemos entrar no debate político, partidário, enfrentando representantes democraticamente eleitos. Esse não é o nosso papel de forma alguma. O que nós fazemos é procurar trazer a discussão para o nível da discussão de políticas públicas, sempre baseando em dados e em fatos. Veja, por exemplo, os ataques que se faz ao Brasil na questão do meio ambiente. Se a gente baixa a fumaça, como eu tenho dito aqui, e olha para os fatos, a gente vê que o Brasil tem um perfil de potência ambiental no planeta. O Brasil está hoje, em 2021, onde muitos países mais desenvolvidos, mais avançados, muito mais ricos do que nós, querem estar em 2030, 2050, sabe-se lá quando. O Brasil é um país que tem dois terços do seu território ainda coberto com vegetação nativa. Que país tem isso hoje em dia? Toda a energia consumida no país, 48% vem de fontes renováveis, sejam biocombustíveis, sejam fontes hídricas. No setor de energia elétrica, esse número vai pra 85%. De novo, que país tem isso? Não quer dizer que não tenhamos desafios, enfrentar a questão do desmatamento, como está sendo enfrentada desde o início desse governo, questão que começou lá atrás, em 2013, desde quando começou essa tendência difícil de crescimento do desmatamento. Começa agora a ter uma pequena inclinação pra baixo. Os dados que vieram aqui em agosto mostraram uma redução de 32% do desmatamento na Amazônia, em setembro também tivemos dados bons sobre redução de queimadas, significativos na comparação ano a ano. Tudo isso ainda são dados preliminares, precisamos confirmar, mas mostram que alguma coisa séria está sendo feita”, comentou Forster.

Sobre a carta enviada ao deputado americano, o embaixador brasileiro ainda explicou o motivo de ter enviado a ele e não ao presidente Joe Biden. “A carta original, do deputado democrata de Illinois, era quase um abaixo assinado firmado pela chamada ala progressista do Partido Democrático, a ala mais à esquerda, ou à extrema esquerda em alguns casos. Essa carta foi dirigida ao presidente Joe Biden. Não é o meu papel me dirigir diretamente ao presidente Joe Biden, como se fosse uma discussão interna doméstica. Então, nós tivemos o cuidado de responder ao signatário da carta e mandamos uma cópia a cada um dos demais cossignatários, além de encaminharmos uma cópia ao assessor de Segurança Nacional da Casa Branca, o senhor Jake Sullivan”, disse.

Segundo o embaixador, esse tipo de atividade, envio de cartas e posicionamentos é comum na atividade diplomática, mas de maneira diferente da usual na política interna brasileira, com ataques. “Nós da embaixada, no Itamaraty, procuramos trabalhar em um tom um pouco mais sereno, próprio da diplomacia, de quem vive de buscar o diálogo e o entendimento. É difícil que haja uma retratação formal [dos deputados americanos], porque nós vemos como o nosso papel é tentar estabelecer uma base factual para a conversa. Veja que nós terminamos a carta, essa e tantas outras, sempre nos colocando à disposição para tratar de outros preocupações e esclarecer pontos que tenham ficados obscuros. Esse é o nosso papel como diplomatas. Quando as pessoas querem insistir na retórica política, estridente, barulhenta, ruidosa correm o risco, às vezes, de ficar falando sozinhas porque não é possível a conversa civilizada”, afirmou Forster.

Ainda segundo o representante do Brasil em Washington, a movimentação feita não é uma ação isolada, mas um trabalho permanente da rede de embaixadores brasileiros em todo o mundo. Ele destacou também as novas dificuldades na diplomacia, que, com o advento da internet e de uma comunicação cada vez mais instantânea, passa a ser vista de maneira mesclada com assuntos partidários. “Tudo isso é muito natural num ambiente democrático, o que me parece ser novo nesse fenômeno, e é o que traz desafios bastante grandes para diplomatas, é que, antigamente, nós tínhamos uma divisão um pouco mais nítida entre aquilo que é da esfera da política interna, da política partidária, dos debates no parlamento, do dia a dia da política que está nas manchetes, e, de outro lado, a visão mais de longo prazo, a visão com maior perenidade, que é própria da política externa. A política externa lida com temas que são permanentes para o país. O interesse nacional não é algo que muda ao sabor dos ventos. Há questões de geografia, de geopolítica, de recursos naturais, de história, de tradição diplomática que são dados com os quais trabalhamos, que não se pode simplesmente dar um cavalo de pau aqui e ali. O advento da internet, as comunicações instantâneas, nos levam a uma situação em que muitas vezes há essa tensão, que é natural, entre o que é a política doméstica e o que é a política externa, isso fica mais evidente. Nessas horas, a gente tem o papel de apontar que o que está em discussão é algo maior do que este ou aquele ponto, são alianças entre países, uma amizade histórica secular, valores e princípios com partidos que orientam a nossa ação”, explica.

Questionado sobre o anúncio do secretário de estado dos EUA, de um pacto contra o desmatamento na Amazônia, o embaixador afirmou que não é uma interferência do país em questões brasileiras, mas uma ponta de uma colaboração internacional bilateral entre as duas nações. “Eu tive o privilégio de buscar, encarregado pelo próprio presidente Bolsonaro, essa interlocução aqui, junto ao novo governo Biden, lá atrás, no início do governo. E estabeleceu-se um excelente diálogo entre um enviado especial para a mudança do tema, o ex-secretário de Estado John Cary, os nossos chanceleres, o nosso ministro do Meio Ambiente. Há um grupo de trabalho tratando disso, explorando formas do Brasil e dos Estados Unidos cooperarem tanto no plano bilateral, quer dizer, o que os americanos podem nos oferecer para ajudar a combater o desmatamento e, mais importante, para trazer oportunidades econômicas na bioeconomia dos 25 milhões de brasileiros que moram na região amazônica. Ao mesmo tempo, cooperarmos para essa agenda multilateral para a reunião de mudança do clima que começa daqui a menos de duas semanas lá em Glasgow, na Escócia. Nós estamos trabalhando juntos, não quer dizer que coincidamos em todos pontos, mas mas há um desejo comum, partilhado pelo Brasil e pelos Estados Unidos. E aqui não é só governo não, é um esforço da sociedade, a gente vê as organizações da sociedade civil muito engajadas nisso também, é um esforço comum aqui de enfrentar problemas que são comuns”, finalizou.

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