Coordenador da Lava Jato diz que suspeição de Moro é ‘surpreendente’ e ‘sem precedentes’
Em entrevista ao Jornal da Manhã, o procurador criticou o que chamou de ‘decisões bruscas’ que alteraram do dia para noite ‘entendimentos consolidados’
O coordenador interino do Núcleo Lava Jato do Grupo de Ação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) no Paraná, Roberson Pozzobon, comentou nesta sexta-feira, 25, a decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, que estendeu a suspeição do ex-juiz Sergio Moro para todos os processos em que atuou contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Em entrevista ao Jornal da Manhã, Pozzobon criticou o que chamou de “decisões bruscas” que alteraram do dia para noite “entendimentos consolidados”. “Eu também vejo uma certa ausência de deferências a decisões de primeiro grau, segundo grau e, as vezes, de terceiro grau em questões que já foram decididas por vários outros juízes e ministros. A suspeição do Moro é questionada por centenas de réus e advogados em todos os graus de jurisdição desde o início da operação. E, em todas as vezes, se reconheceu que não havia suspeição”, disse o coordenador, que defende que nunca houve motivos para a suspeição do ex-juiz. “Quando juiz, o Moro sempre se portou de forma equidistante, manteve respeito, deferência, indeferiu várias provas do Ministério Público e absolveu várias pessoas. Então essa ideia de que havia uma suspeição muito nos surpreendeu e surpreendeu, eu acredito, boa parte da população brasileira, porque a condenação do ex-presidente Lula já havia sido confirmada por 10 juízes”, completou.
O ministra Cármen Lúcia, que antes estava a favor de Moro, mudou o voto sob a justificativa de que existiam elementos novos que provavam a parcialidade dele. Pozzobon, no entanto, acredita que não houve nenhum “fato novo” que sustentasse a suspeição do ex-juiz. “O que eu vi foram fatos errados que foram trazidos no debate do Supremo. Talvez por má fé de algumas pessoas que queriam defender o ex-presidente Lula a qualquer custo. Foi levantado mais de uma vez no Supremo que a Lava Jato teria interceptado escritórios de advogados do Lula. Isso nunca aconteceu”, afirmou o procurador. “O que aconteceu em 2016 foi que as duas empresas de palestras de Lula tinham cadastrado um telefone na Receita Federal. No intuito de investigar, o MPF e a polícia solicitaram a interceptação desses terminais. Nessa interceptação, pegamos ligações de pessoas do entorno que estavam sendo investigadas. E, depois que houve a deflagração da fase que culminou nas buscas e apreensões relacionadas ao ex-presidente, foi alterado, na Receita Federal, o número de telefone, que deixou de ser atribuído à empresa de Lula e passou a ser atribuído ao escritório de advocacia. Depois disso, começaram a propagandear que a Lava Jato tinha interceptado o escritório deliberadamente. Esse não era um fato novo”, justificou.
O coordenador interino da Gaeco teme que as mudanças resultem na devolução dos mais de R$ 6 bilhões que foram recuperados pelos cofres públicos através dos acordos de leniência celebrados pelo MPF no âmbito da Lava Jato. “Eu não duvido [que os R$ 6 bilhões tenham que ser devolvidos]. A gente corre no Brasil um ciclo de quatro instâncias para cumprir uma pena, o que é absurdo. Quando você está chegando ao fim do processo, depois de passar uma condenação e ela ser confirmada em três jurisdições, ela é anulada. Isso surpreende muito”, ponderou. “Se forem devolvidos, os corruptos não precisariam nem pagar os impostos na transmissão de valores dos paraísos fiscais para o Brasil. Isso seria absolutamente absurdo e sem fundamento. A corrupção aconteceu, está provada em centenas de processos para cada um que queira ler, com muitas provas. No caso específico da corrupção na Petrobras, a gente conseguiu comprovar documentalmente, em vários casos, a corrupção. Devolver esse dinheiro seria algo sem precedentes. Mas no Brasil, infelizmente, tem ocorrido coisas absolutamente sem precedentes”, criticou Pozzobon.
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