Macron joga com oposição para testá-la frente ao eleitorado, mas estratégia afeta sua governabilidade

Mesmo se for derrotado, líder francês permanece no poder até o fim do mandato e pode volta a dissolver o Parlamento

  • Por Sarah Américo
  • 16/06/2024 07h26 - Atualizado em 17/06/2024 17h22
DONATO FASANO/EFE/EPA emmanuel macron Macron dissolveu a Assembleia Nacional após perder eleições no Parlamento Europeu

Há uma semana, o presidente francês Emmanuel Macron surpreendeu a todos dissolver o Parlamento e convocar eleições na França para o final de junho, após ser derrotado nas eleições para o Parlamento Europeu. A repercussão sobre essa decisão ficou dividida entre: teria ele acertado em sua escolha ou foi um tiro no próprio pé. Os especialistas se dividem entre a resposta. À Jovem Pan, Natalia Fingermann, professora de Relações Internacionais no Ibmec SP, não se passa de um cálculo político de Macron. “Se a oposição leva, ela vai ter que se mostrar frente ao eleitorado qual é a sua capacidade de ação para governar as questões internas da França”, fala a especialista, que também destaca que daqui a um ano o líder francês pode dissolver o Parlamento mais uma vez e convocar novas eleições. “A oposição pode garantir maior número de assentos, mas daqui um ano ele pode convocar eleições novamente e talvez garantir uma melhor situação no Parlamento, possibilitando que ele conquiste mais poder”. Mesmo que Macron seja derrotado pela direita nas eleições, ele ainda continua seu mandato como presidente, porque o sistema na França é semipresidencialista, então ele pode ter minoria no Parlamento, mas segue como presidente do país.

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Macron está jogando. “Ele está mandando as cartas do jogo, porque talvez ele tenha decidido isso se aproveitado do fato de que a oposição estava despreparada para isso”, fala a professora, que também destaca que a decisão não foi do nada porque já se tinham projeções antes das eleições para o Parlamente Europeu de que o partido de extrema direita, de Marine Le Pen, estava liderando as pesquisas. “Ele previu esse cenário e sabia que quem iria dar as cartas ela ele, enquanto a oposição não estava preparada para um cenário como esse”, acrescenta. Christopher Mendonça, cientista politico e professor de relações internacional do Ibmec Belo Horizonte, vê a decisão de Macron com outra perspectiva. “Ele deu um tiro no próprio pé, porque isso acabou afetando a própria governabilidade. Ele não deveria ter feito isso, embora seja dentro da lei, é legal, mas não é moral”, fala o professor, que também lembra que a capacidade de governabilidade de Macron já estava afetada pelas manobras políticas que adotou nos últimos anos, o que fez com que ele perdesse credibilidade.

Marine Le Pen

Marine Le Pen foi derrotada por Emmanuel Macron pela segunda eleição consecutiva │EFE/EPA/IAN LANGSDON

No ano passado, para conseguiu aprovar o projeto de aumento da idade de aposentadoria, Macron apelou para o artigo 49.3 da constituição, e agora ele dissolveu o Parlamento, duas ações que são legais na França, porém, que coloca em risco a credibilidade do líder. Para o professor, Macron terá bastante dificuldades nessas eleições e Marine Le Pen, depois de perder duas vezes para o centrista, deve chegar ao poder. “A direita ela está mais organizada, principalmente por causa da Le Pe, presidente do partido que chama Frente Nacional, que agora chama Reunião Nacional, que está bem estabelecido, então ela tem mais chances de ir para frente”, fala o professor, que já prevê um cenário ainda pior para o atual líder francês se ele não ganhar. “Se ele for derrotado, aí que a coisa fica mais complicada ainda. Ele teria muita dificuldade para continuar governando e não sei como é que ele ia fazer”, concluí.

Apesar de hoje Le Pen aparecer como a ‘favorita’, a professora Natalia Fingermann destaca que apesar da extrema direita ter levado a melhor nas eleições para Parlamentou Europeu, o cenário pode ser diferente quando se fala em eleições nacional, como aconteceu em Portugal, em que a direita venceu em março, mas no último final de semana não conseguiu um bom posicionamento. “A eleição do Parlamento Europeu não reflete automaticamente no voto das eleições nacionais. Então a gente não pode esperar o mesmo percentual nas duas votações. Então esse resultado é duvidoso, não dá para saber exatamente como vai ser”, fala a especialista, que também destaca que muita gente que muitas pessoas votam no Parlamento Europeu com uma forma de protesto, o que muda quando se pensa na questão doméstica. “Existem várias questões envolvidas que não dá para dizer se ela está realmente com vantagem. Eu diria que uma conta com vantagem porque ele que determinou as eleições em três semanas. Então ele tem uma vantagem no jogo político aí. O resultado continua em aberto”, conclui. As eleições na França estão marcadas para acontecer no dia 30 de junho, primeiro turno, e 7 de julho, segundo turno.

Algo que se tornou ‘comum’ na Europa nos últimos anos, é a dissolução do Parlamento. No ano passado, Pedro Sánchez, primeiro-ministro da Espanha, teve essa mesma decisão para conter o avanço da extrema direita. Ele perdeu, mas depois conseguiu se manter no porquê o vencedor não conseguiu formar governo. O Reino Unido também passou pela mesma situação recentemente. Rishi Sunak, premiê britânico, tomou a mesma decisão de Sánchez, porém, nesse caso, para conter a esquerda. As eleições vão acontecer no dia 4 de julho. Fingermann explica que essa é uma prática muito comum em sistemas parlamentaristas.

Impacto das eleições do Parlamento Europeu

eleições parlamento europeu

Apesar da força mostrada pela extrema direita nas eleições para o Parlamento Europeu, a formação seguiu a mesma. O Partido Popular Europeu (PPE, direita) continuaria como a principal força política, com 181 assentos; os social-democratas alcançariam 135 e os liberais do Renew, 82; formando um grande bloco de 389 cadeiras. Mas a vitória da extrema direita na Alemanha e França chamam atenção. “Mostram uma insatisfação popular com o sistema democrático. A população entende que uma das respostas que a extrema direita dá, é focar nos gastos, acabar com a guerra da Ucrânia e colocar barreiras para a imigração”, fala. “Então, hoje a gente tem uma Europa que está com um problema econômico, né, 20% da população europeia, se não me engano, ou 21%, vive hoje”, acrescenta. Para Christopher Mendonça, os resultados são um sinal de que “as questões identitárias estão mudando, mas nesse aspecto a gente também percebe que a esquerda está perdendo força, não é a direita que está ganhando”, fala o especialista, acrescentando que ela não está conseguindo trazer para a realidade o que prometeram.

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