Fanatismo cego boicota até campanha da CNBB que prega fraternidade, diálogo e amor

Grupos de ódio não sabem lidar com uma ação que critica duramente a violência contra as mulheres, negros, indígenas e LGBTQI+, além de desaprovar a conduta negativista e o descaso no combate à Covid-19

  • Por Álvaro Alves de Faria
  • 22/02/2021 11h58 - Atualizado em 22/02/2021 14h33
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EFE/EPA/VATICAN MEDIA Papa Francisco acenando O papa Francisco, autoridade maior da Igreja Católica, é uma das vítimas dos grupos de ódio pela visão de mundo progressista

Os tempos são outros. Bem outros. Os inimigos da harmonia estão em todo lugar com atitudes negativistas nunca vistas no Brasil. Há grupos extremistas – isso não falta – que já começaram a boicotar a Campanha da Fraternidade de 2021, promovida pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil e Conselho Nacional das Igrejas Cristãs. O tema da campanha deste ano desagradou aqueles que fazem tudo por uma desordem, em nome de um conservadorismo que este país não aguenta mais. O tema é: “Fraternidade e Diálogo: Compromisso de Amor”. A campanha critica duramente a violência contra mulheres, negros, indígenas e LGBTQI+, além de desaprovar a conduta negativista e o descaso no combate à Covid-19. Claro que isso não iria agradar grupos espalhados no país que usam a democracia para destruir a própria democracia. Trata-se de uma “mentalidade polarizada”, no dizer de dom Joel Portella Amado , secretário-geral da CNBB, para quem isso está ocorrendo no mundo inteiro. Uma avaliação simplista demais.

Atrás dessas primeiras manifestações, existe, sim, muito ódio que tem comando. Dom Joel observa que num tempo de fanatismo, o equilíbrio entre a e a ciência tem sido muito difícil. E mais: a indiferença para com o outro está se tornando um estilo de vida, o que é verdade, já que os dias são de um egoísmo cada vez mais intenso. Basta ver, por exemplo, a questão dos fura-filas na vacinação contra a Covid-19, em que a vida do outro não importa. Num questionário por escrito respondido ao jornal “O Globo”, do Rio de Janeiro, o secretário-geral da CNBB afirmou que os temas das Campanhas da Fraternidade são escolhidos sempre com uma antecedência de pelo menos dois anos. Observou que a Igreja Católica traz no seu DNA a defesa da vida como condição irrenunciável. O tema deste ano quer mostrar que não é possível construir um país de indiferentes. A indiferença mata, especialmente pela omissão e os braços cruzados diante da dor das pessoas. Exatamente. É o que mais acontece hoje. É cada um por si.

Poucos são ainda aqueles que auxiliam o outro a viver nesta verdadeira barbárie para a qual o mundo caminha atualmente. Dificilmente se pratica um gesto de caridade. E não poderia ser diferente com a política atual em vários países, também no Brasil, onde a ordem parece ser negar tudo. Veja o caso da Covid-19, como a doença foi tratada desde o início, com descaso e discursos obscurantistas. A Campanha da Fraternidade é uma iniciativa que merece respeito. Se é que ainda existe respeito entre as pessoas. Num tempo assim difícil, a CNBB pode ser chamada de uma entidade romântica, além de religiosa. Machado de Assis (1839-1908), escreveu que lágrimas não são argumentos. É possível que não sejam. Mas há um momento em que não existe nenhum argumento senão a lágrima e o pedido de socorro numa sociedade que caminha sem rumo ou se aventura a seguir “lideranças” que negam a realidade das coisas com a linguagem da violência, uma certa intimidação que encosta o outro na parede. É como um fuzilamento. Não há escapatória porque o tiro é no coração. É esperar o disparo e cair.

A participação da Igreja nas questões políticas data de séculos, sempre ao lado dos mais fracos. Na história recente brasileira, a CNBB se notabilizou por uma presença sempre firme. Mas não foi assim no golpe militar de 1964, quando parte do clero apoiou o movimento. Ao longo do tempo, mudou sua posição, que se resume numa única frase do documento “Por tempos novos, com liberdade e democracia”, que a CNBB publicou quando o golpe completou 50 anos: “O regime de 21 anos fez do Brasil o país da dor e da lágrima”. A entidade reafirmou o compromisso com a defesa de uma democracia participativa com justiça social para todos. Por fim, chamou a ditadura de “um dos períodos mais sombrios da história brasileira”. Que siga a Campanha da Fraternidade aos tropeços, como tem sido nos últimos anos. E neste ano, particularmente, será pior, porque os inimigos já não se escondem. Estão em todo lugar. Especialmente com relação à posição da confederação dos bispos diante da conduta do governo na pandemia. Ser generoso, por exemplo, é um comportamento que praticamente não existe mais. O mesmo ocorre com a solidariedade. Infelizmente, o mundo se tornou nisto que vivemos todos os dias.

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