Onde estão as vacinas? O brasileiro está entregue à própria sorte
Parece até que o país dispõe de 500 milhões de doses de imunizantes para uso imediato, mas Manaus ainda agoniza, faltam UTIs e a vacinação total da população continua bem distante
Todo dia, toda hora, surgem notícias no Brasil informando que chegaram mais 8 milhões de doses de vacina. Ou 10 milhões. Os números mudam, mas são sempre milhões. No entanto, não é bem assim. Chegam, sim, os insumos para a produção da vacina, e isso demora meses. O Brasil não tem vacinas. A verdade é essa. Algumas vacinações estão ocorrendo em várias regiões do país, mas somente para dezenas de pessoas do grupo prioritário. Só dezenas. E muitas regiões brasileiras sofrem verdadeiro abandono, entregues à própria sorte, incluindo os profissionais da saúde. Tanto que o Conselho Federal de Medicina (CFM) decidiu também denunciar o descaso com o qual a pandemia sempre foi tratada pelo governo brasileiro, incluindo até os mortos. Não à toa, o ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, compareceu no Senado nesta quinta-feira, 11, para falar sobre a conduta do Planalto no enfrentamento à pandemia. Falou, falou, falou, falou e não disse nada. Usou aquele discurso que não explica coisa nenhuma.
O ministro foi questionado por vários senadores. O ministro mentiu. E chegou a dizer que o governo federal foi surpreendido. A palavra de Pazuello aumentou ainda mais a pressão do Congresso para a crianção da CPI da Pandemia. A situação brasileira é um horror. Não vamos nos enganar ou deixar que nos enganem. O Brasil desprezou a doença. A verdade é essa. Só essa. Que o governo assuma esse fato e o seu negativismo. Um pouco de hombridade não faz mal a ninguém. Manaus, por exemplo, continua sua agonia. Nem pense o caro leitor que o problema foi resolvido. Não foi. Muitos dos pacientes levados para outras capitais morreram com a doença. E o oxigênio continua a faltar. As notícias são quase todas ruins. A gente as vê o dia inteiro. Os problemas da capital amazonense são os mesmos de vários lugares, como Rondônia, por exemplo, onde o sistema de saúde entrou em colapso. A exemplo do que acontece no Amazonas, os doentes estão sendo transferidos para outros estados, na esperança de salvação.
Rondônia possui apenas 291 leitos de UTI. Todos estão ocupados. Os outros pacientes com Covid-19 ficam na calçada ou deitados nos corredores dos hospitais à espera da morte. É duro dizer assim, mas essa é a verdade de um país que deixa sempre tudo para depois. O governo estadual confessa que não tem o que fazer, pois falta tudo. Os hospitais não têm nem mesmo estrutura para receber mais médicos para auxiliar no atendimento, conforme diz o secretário da Saúde do Estado, Fernando Máximo. A única esperança para sair desse caos é a vacinação, que anda lentamente, quase parando. No domingo, 7, Rondônia recebeu 36 mil doses da CoronoVac, distribuídas nos 52 municípios. Com esse lote, a capital Porto Velho está vacinando os idosos com mais de 80 anos. Falamos do Norte, mas problemas semelhantes ocorrem em centenas de cidades brasileiras. Não adiantam os discursos oficiais passando uma ideia de que tudo está caminhando bem. Não está. Não existe vacina. Nem hospitais. Nem leitos. Nem UTIs. Parece que cada um está entregue à própria sorte.
A vacinação foi recebida como uma luz de esperança no mundo inteiro, menos no Brasil, onde se transformou em mais um problema a ser resolvido. Mas ninguém resolve coisa nenhuma. Há muitas coisas acontecendo ao mesmo tempo sem que o Ministério da Saúde se manifeste, como é sua obrigação. O Conselho Federal de Medicina (CFM) recebeu milhares de denúncias sobre as condições de trabalho que os profissionais da saúde têm de enfrentar na pandemia. Basta dizer que, de abril a dezembro de 2020, o CFM recebeu 2.600 denúncias, até sobre falta de sabonete e papel higiênico em dezenas de hospitais. Quer dizer: os esses profissionais não têm nem como lavar as mãos. Muitos médicos afirmam que as condições de trabalho são desumanas. Falta até roupa de cama. Dezenas de hospitais não dispõem de medicamentos básicos, como antibióticos e anti-inflamatórios, por exemplo. Alguns médicos estão comprando com o próprio dinheiro o material que necessitam para trabalhar no combate à Covid-19. Até álcool.
Convém lembrar que, desde o início da pandemia, 465 médicos morreram vítimas da doença. Entre enfermeiros, o número de mortes chega a 566. Voltando a Manaus, o Tribunal de Contas da União deu dez dias para a Secretaria da Saúde do município explique o que de fato aconteceu e se a prefeitura foi pressionada pelo Ministério da Saúde a atender os doentes com cloroquina, hidroxicloriquina e ivermectina, os medicamentos do presidente da República, que insiste no tratamento como essas drogas. O ministério criou um protocolo que permite o uso desses medicamentos pelo SUS. O TCU tomou a decisão com base em pedido do Ministério Público de Contas. Fora isso, de acordo com levantamento do Imperial College de Londres, que monitora a doença em vários países, a disseminação da Covid no Brasil continua sem controle. Não há desaceleração de contágio. Esses dados se referem à semana fechada na segunda-feira, 8.
A projeção brasileira só é superada pelo México, o terceiro país no mundo com maior número de mortes. Os 15 estados com tendência de alta são o Acre, Alagoas, Bahia, Ceará, Espirito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Paraíba, Piauí, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo. Ao mesmo tempo, o noticiário brasileiro diz toda hora que chegaram os insumos para a produção de vacinas. Toda hora. Toda hora. Dá até a impressão de que o Brasil dispõe de mais 500 milhões de vacinas para uso imediato. Mas de imediato não existe nada. É tudo para depois. E esse “depois” representa meses de espera. Mas, no fundo, o que poderíamos esperar com o desleixo sempre demonstrado para esse problema que atinge o mundo. Pensando bem, está tudo correto.
Comentários
Conteúdo para assinantes. Assine JP Premium.