Parcelar os precatórios para gastar tem nome: pedalada fiscal

Pode não ser ilegal como a operação original, já que seria autorizada pelo Congresso, mas o efeito nas contas públicas é o mesmo

  • Por Samy Dana
  • 04/08/2021 18h20
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Itaci Batista/Estadão Conteúdo Avanço de dois pontos percentuais em preços monitorados puxou revisão de alta da inflação em 2021 Na última sexta-feira, Paulo Guedes chamou de meteoro o gasto de R$ 89 bilhões que a União deve ter com os precatórios em 2022

As pedaladas fiscais foram um truque contábil usado no governo de Dilma Rousseff, que atrasava repasses aos bancos para ter um resultado melhor nas contas públicas. Na superfície, estava cumprindo as regras, enquanto maquiava gastos. Era uma prática que, dadas as consequências – a recessão de 2015 e 2016 – devia ser banida pelos governantes, mas que tem sido revivida sempre que o governo quer gastar mais. Na última sexta-feira, o ministro da Economia, Paulo Guedes, chamou de meteoro o gasto de R$ 89 bilhões que a União deve ter com os precatórios em 2022. São dívidas do governo, que perdeu sentenças judiciais já sem direito a recurso. A conta entra numa fila de pagamentos. No ano que vem, segundo o ministro, foi informado pelo Poder Judiciário que deverão ser pagos R$ 35,2 bilhões a mais do que este ano, quando a conta foi de R$ 54,75 bilhões. Um aumento de 60%.

Dado o tamanho do gasto, realmente seria um verdadeiro meteoro nas finanças públicas, que levou o governo a apresentar a líderes do Congresso uma proposta para alterar as regras e limitar o valor a ser pago por ano a 2,6% da receita corrente anual (o saldo da arrecadação de impostos menos as transferências obrigatórias). Reduziria os pagamentos em R$ 20 bilhões anuais. Outros R$ 20 bilhões viriam do parcelamento das maiores dívidas – acima de R$ 66 milhões – em dez vezes. No total, seriam economizados R$ 40 bilhões. Um alívio para as contas públicas, se o governo não quisesse gastar todo este valor na nova versão do programa Bolsa Família, pagando R$ 300 mensais a 17 milhões de pessoas. Ou seja, uma pedalada fiscal para financiar a vitrine da campanha de reeleição do presidente Jair Bolsonaro.

Manobra parecida foi tentada em setembro de 2020 e a reação do mercado financeiro levou o Ministério da Economia a recuar. Ontem, a notícia do que estava sendo tramado em Brasília engoliu quase toda a alta que o Ibovespa vinha tendo no dia. Pode não ser ilegal como as pedaladas fiscais originais, já que seriam autorizadas pelo Congresso, mas o efeito nas contas públicas é o mesmo. É válida a discussão sobre um limite para o quanto o governo pode pagar de precatórios sem prejudicar os serviços públicos e os programas sociais. E a esta altura, restam poucas dúvidas sobre a importância do Bolsa Família no combate à desigualdade. O problema é querer dar um drible no teto de gastos, adiando pagamentos para aumentar as despesas em ano eleitoral. O débito continuará existindo, encarecendo a dívida pública e pagando juros. Por isso, o programa tem que ser financiado dentro do Orçamento.

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