Preconceito e custos de tratamento ainda impedem atletas trans de se firmarem no esporte

Atletas trans são autorizados pelo COI a competir em modalidades olímpicas; desde a estreia de Tifanny Abreu no vôlei brasileiro discursos contrários à decisão ganharam força na sociedade

  • Por Jovem Pan
  • 29/01/2021 12h00
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Debate dos transexuais no esporte no Brasil começou com Tifanny Abreu

O debate sobre a participação de atletas transgênero no esporte de alto nível é alvo de debates desde a estreia de Tifanny Abreu no vôlei brasileiro. Desde 2017, quando a atleta ganhou o aval da Federação Internacional de Voleibol para atuar na Superliga Feminina Brasileira, discursos contrários à decisão ganharam força no país. Projetos de Lei como o de nº 2639/19, de autoria do deputado federal Sóstenes Silva Cavalcante (DEM-RJ), que estabelecia que o sexo biológico deveria ser o único critério para a definição do gênero em competições esportivas nacionais, foram apresentados para que os atletas não fossem incluídos no esporte. E não é apenas o preconceito que impede atletas trans de se firmarem no esporte nacional e até mesmo internacional. Nesta sexta-feira, 29, é comemorado o Dia da Visibilidade Trans. Instituída em 2004, a data tem como objetivo principal buscar conscientização, cidadania e respeito aos transexuais em meio a sociedade.

Para o gestor esportivo Cristiano Barros Homem Del Rei, a dificuldade também está nos altos custos dos tratamentos hormonais exigidos. “A dificuldade de entendimento desta necessidade e os valores financeiros exigidos no controle hormonal nos últimos 12 meses que antecederam sua entrada em uma competição, e a continuidade deste controle enquanto houver o interesse de continuar competindo, são fatores dificultadores da inclusão. Quantas “Tifannys” existem, mas por alguma razão não encontram espaço para competirem?”, disse em entrevista à Jovem Pan.

Não basta apenas se declarar transsexual para competir em modalidades esportivas, os atletas precisam seguir uma rígida cartela de exigências para serem regulamentados e considerados aptos para competições. Segundo as regras do Comitê Olímpico Internacional (COI), o atleta deve se identificar como transgênero há, pelo menos, 4 anos e estar há um ano em hormonioterapia, com níveis de testosterona menor que 10 nmol/L. No caso dos homens trans, a testosterona tem que estar dentro dos níveis de referência para homens e eles devem ter uma declaração que fazem este tratamento para transição de gênero.

Para Del Rei, a única forma de mudar esse cenário e proporcionar mais inclusão no esporte é trabalhar a conscientização em torno do tema. “Não acredito em outra alternativa. E quando falo em conscientização, incluo todos os players da cadeia produtiva do esporte, o que serve também para as atletas trans que almejam entrar no ambiente competitivo feminino e entender quais a regras para que isso seja possível, bem como das atletas nascidas do gênero feminino na compreensão desta inclusão”, explicou. Investir na comunicação e seminários científicos para desmistificar as chamadas “vantagens fisiológicas” dos atletas trans também parece ser um caminho para o gestor esportivo. “Ainda há a necessidade de muita discussão sobre esse tema”, finalizou.

Apesar do caso de Tiffany ter ganhado notoriedade ao longo dos anos, ela não é a única atleta trans no esporte mundial. Nos anos 1970, a tenista Renée Richards foi pioneira sendo a primeira transexual a disputar um torneio profissional de tênis, alcançando a 20ª posição no ranking mundial em 1977. Em 2012, Fallon Fox estreou como lutadora no MMA. Em 2015, Chris Mosier foi o primeiro transgênero a se classificar para o Mundial de duatlo (ciclismo e corrida) pela equipe dos Estados Unidos. E em 2017, Laurel Haubbard conquistou a medalha de prata no levantamento de peso no Campeonato Mundial em Anaheim, na Califórnia. Apesar de casos pontuais de sucesso, todos os atletas trans sofreram com a rejeição dos companheiros de modalidade. A ex-lutadora Ronda Rousey, por exemplo, se recusou a lutar contra Fox no octógono do UFC, assim como a brasileira Beth Correa. No vôlei, algumas atletas e ex-atletas já questionaram a presença de Tiffany na Liga.

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