Bolsas de pós serão concedidas por IDH, nota e ‘áreas estratégicas para o governo’

De acordo com o presidente do Capes, as áreas estratégicas ainda estão sendo definidas, mas devem ficar com cursos como Medicina, Engenharias e Computação; áreas de humanas serão menos beneficiadas

  • Por Jovem Pan
  • 18/08/2019 15h28 - Atualizado em 18/08/2019 15h32
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Luis Fortes/MEC Novos critérios devem entrar em vigor ainda neste ano

O governo federal vai mudar o critério de concessão de bolsas de mestrado e doutorado no Brasil. O novo sistema de escolha levará em conta o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) dos municípios onde as faculdades estão localizadas, o teor das pesquisas e a nota obtida pelos cursos nos últimos anos. Além disso, terão prioridade aquelas que se encaixarem em áreas consideradas estratégicas pela gestão Jair Bolsonaro (PSL), como cursos de saúde e engenharias, e as bolsas de doutorado terão preferência em relação às de mestrado.

O ministro da Educação, Abraham Weintraub, afirmou que a distribuição de verba às universidades seguirá “critérios técnicos”. “Quem faz trabalho sério receberá. Quem não faz e não prestar contas vai receber menos”, disse.

O novo sistema de distribuição será anunciado oficialmente no próximo mês, mas as principais linhas foram antecipadas  pelo presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Anderson Correia. Vinculada ao Ministério da Educação (MEC), a Capes é a principal financiadora de pesquisas de pós do País.

Para Correia, a inclusão do IDH no cálculo é importante, já que a Capes tem função social, de desenvolvimento das regiões. “Você não pode dar o mesmo tratamento a um curso em São Paulo e outro em Altamira, no Pará.” Para ele, dar um peso maior para unidades instaladas em regiões mais pobres seria um mecanismo parar tentar reduzir as desigualdades.

Nos outros três aspectos que vão compor o sistema, o foco é investir em quem pode trazer melhores resultados. A ideia é que cursos que receberam notas muito baixas por vários anos não voltem a ter bolsas – esses também foram os primeiros penalizados este ano, quando o MEC suspendeu bolsas para cortar gastos.

A opção em concentrar esforços no doutorado, diz ele, mira maior impacto científico. “O mestrado dificilmente gera descoberta que chame a atenção internacional.”

As áreas estratégicas ainda estão sendo definidas, mas Correia sinalizou que cursos como Medicina, Odontologia, Engenharias e Computação devem estar no grupo considerado prioritário. Já as pesquisas do que ele classifica como de “humanas puras” serão menos beneficiadas. Nesse grupo, estão Filosofia e Ciências Sociais. “Priorizar uma área não é matar outra”, afirmou.

A gestão Bolsonaro já havia dado sinais de que o investimento na área de Humanas deixaria de ser prioridade, o que desencadeou críticas da comunidade científica. Em abril, a Associação Brasileira de Antropologia, a Sociedade Brasileira de Sociologia, a Associação Brasileira de Ciência Política e a Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais, em comunicado conjunto, afirmaram que as declarações indicavam desconhecimento sobre a ciência.

Verba bloqueada

Os novos critérios para distribuir bolsas devem ser aplicados já este ano. Weintraub acredita que parte dos recursos bloqueados começará a ser liberado no mês que vem e, até o fim do ano, de 80% a 90% do previsto no orçamento esteja disponível para a pasta.

A Capes teve R$ 300 milhões de um orçamento de R$ 4,25 bilhões bloqueados. Com isso, 6.198 bolsas foram canceladas.

Segundo o ministro, no entanto, bolsas ociosas vinculadas a cursos de baixo desempenho continuarão congeladas. Mas, se tiveram boa nota ou estiverem em área prioritária, o recurso será liberado.

A Capes diz que, se o cenário fiscal dos próximos anos permitir, quer ampliar o valor da bolsa de doutorado, cuja média é de R$ 2,2 mil mensais – valor considerado baixo pelo governo e insuficiente para atrair talentos.

Outro lado

Especialistas temem que a inclusão de novos critérios leve a uma “escolha ideológica” na distribuição de bolsas. Para eles, o país já tem sistema de avaliação da pós-graduação robusto, baseado na qualidade dos cursos.

“É importante que nenhuma área seja deixada de fora. Uma preocupação seria com a desassistência às Humanas, que em outros momentos também já foram excluídas, como no programa Ciências sem Fronteiras (criado na gestão Dilma Rousseff, que financiava intercâmbios no exterior). É perigoso que haja direcionamento ideológico”, alerta Simon Schwartzman, da Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior (Conaes).

Especialistas também questionam o uso do IDH como critério, já que a maioria das pós estão em áreas em que o indicador é mais alto. “Regiões com IDH muito baixo não têm programas de doutorado”, afirma João Cardoso Palma Filho, professor da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e ex-presidente da Câmara de Educação Superior do Conselho Estadual de Educação de São Paulo. E, para ele, se querem priorizar a bolsa para o doutorado, seria preciso mudar a estrutura de pós no país, que exige passagem pelo mestrado.

*Com Estadão Conteúdo

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