“Enchia mochilas de dinheiro”, diz motorista de ex-diretor da Dersa

  • Por Estadão cOnteúdo
  • 20/07/2018 12h08 - Atualizado em 20/07/2018 12h52
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Eduardo Saraiva/A2IMG Eduardo Saraiva/A2IMG Operação Pedra no Caminho, que mira supostos desvios de R$ 600 milhões da Dersa, em obras do Rodoanel Trecho Norte.

Às 5h45 do dia 21 de junho, Pedro Alcântara Brandão Filho, 54 anos, motorista, morador da Avenida Irecê, no bairro da Guarapiranga, na zona sul de São Paulo, foi surpreendido pela PF batendo à sua porta. “Eles vieram com mandado de busca, né? Aí, o delegado se identificou, falou o que precisava e, aí quando falou que era da Operação Lava Jato… Quero dizer, Lava Jato não, né? Da Dersa, né?”.

Ele era um dos alvos da Operação Pedra no Caminho, que mira supostos desvios de R$ 600 milhões da Dersa, em obras do Rodoanel Trecho Norte. Logo que entraram, todavia, os federais perceberam que não encontrariam a bagatela com o motorista. “Viram que era uma casa humilde, aí eles pediram desculpa e o delegado virou para mim e falou: É, o senhor entrou como laranja”, afirmou.

Braço da Lava Jato em São Paulo, a Pedra no Caminho levou para a cadeia dois ex-dirigentes da Dersa: Pedro da Silva e Laurence Casagrande Lourenço, que chegou a ser secretário de Transportes e Logística do governo de Geraldo Alckmin (PSDB). O motorista diz ter trabalhado para a mulher de Pedro da Silva. “Eu levava as crianças”, conta, referindo-se aos filhos do casal.

Os investigadores queriam saber por que o motorista, que tirava R$ 2 mil por mês, fez depósitos de até R$ 50 mil nas contas de Pedro da Silva – o ex-diretor chegou a girar R$ 50 milhões, segundo dados bancários. É que além das crianças, explicou Pedro, ele supostamente também transportava “valores altos” para o casal. “Já cheguei a encher mochilas”, contou.

O motorista relatou que era orientado a informar aos bancos que a dinheirama – em 12 depósitos, foram R$ 253 mil pelas mãos do motorista – tinha como origem a venda de gado do casal e que a recebia das mãos da mulher de Pedro da Silva, Adriane. “E na declaração eu colocava que era referente à venda de gado, mas eu não sabia que origem era, né?”. “Eu fui como laranja nessa história”, afirma.

Veja abaixo os principais trechos da entrevista: 

O Sr. trabalhava para ele?

Isso. Eu fui motorista da esposa dele.

Por quanto tempo?

Eu trabalhei 3 anos e 8 meses. Quatro anos. De 1994 a 1998. Quando ele era presidente da Dersa.

Como era a sua relação com ele?

Eu o via muito pouco. Era mais de fim de semana. Sábado.

Qual era o serviço que o Sr. prestava para a esposa dele?

Eu levava as crianças para a escola.

No relatório das investigações, o Sr. conhece as empresas SCJ Agro e Star Bar?

A Star Bar seria um bar e restaurante, que era dele também, mas era mais a esposa dele que comandava. E a SCJ é uma fazenda que ele tem lá em Bofete.

Ele usa comercialmente essa fazenda?

Eu creio que sim. ele cria gado.

Tem um relatório da investigação que ele mostra que, por exemplo, o Sr. como depositante de valores em espécie…

Isso, isso, valores altos!

Do que se tratavam esses depósitos?

Foi isso que a polícia perguntou para mim, né? Era um dinheiro que a esposa dele me dava e eu nunca cheguei a perguntar. Eu levava, era só portador do dinheiro. Nunca perguntei.

A esposa te pedia? Ela te entregava o dinheiro?

Isso. Entregava

Em que tipo de recipiente?

Não era em envelope, não. Era dentro de pastas, mochilas. Já cheguei a encher mochila, porque o valor era muito alto.

E o Sr. não conhecia a origem disso?

Ela só falava que era da fazenda, mas eu não perguntei. Eu só perguntei uma vez porque eu fui depositar na Caixa Econômica e eles pediram meu CPF. Eu perguntei. Estranhei e falei para ela. Falei: Olha, dona Adriane, eles pediram meu CPF. E ela respondeu: não, isso é só para controle mesmo porque o Sr. é portador do dinheiro. Aí, não deu em nada, mas eu fiquei com medo, assim, né? Era muito dinheiro, né? Valores altos! Ela falou uma vez que era folha de pagamento lá da Fazenda. Não perguntava mais nada, né?

Como o Sr. levava o dinheiro?

Eu levava de carro. A gente tinha que procurar direto o gerente do banco. Várias vezes, eles me perguntavam. E eu falava que era da fazenda, referente à venda de gado. Porque eu tinha que fazer uma declaração. E na declaração eu colocava que era referente à venda de gado, mas eu não sabia que origem era, né?

Depois que deixou de trabalhar, sofreu ameaças?

Não, não tenho nada contra eles.

Muita gente aparece depositando valores altos. O Sr. conhece essas pessoas?

Essa menina aí era secretária da fazenda, essa Juceleine, e o Sr Valmir dos Santos era Administrador da fazenda. Inclusive ele que depositou mais dinheiro, né? Só tive contato com a menina da fazenda que eu que eu tive com ela, mas não a conheço.

O Sr. foi alvo de busca e apreensão. Como foi?

Meu celular ficou preso com eles. Eles disseram que depois de um mês eles devolveriam, para saber se eu tinha contato com alguma coisa, né? Mas, graças a Deus, eu fui como laranja nessa história.

E como foi acordar com a PF na sua porta?

Pra mim foi uma surpresa, porque eu tenho 54 anos de idade e nunca passei por isso na minha vida. A Polícia chegar dentro da minha casa às 6 horas da manhã, 15 para as 6. Eles vieram com mandado de busca, né? Aí, o delegado se identificou, falou o que precisava e, aí quando falou que era da Operação Lava Jato… Quero dizer, Lava Jato não, né? Da Dersa, né? Entraram na minha casa, viram que era uma casa humilde, aí eles pediram desculpa e o delegado virou para mim e falou: É, o Sr. entrou como laranja. Aí eu expliquei para ele que eu trabalhei para ele, ele me pedia para fazer esses depósitos, mas eu nunca perguntei do que era, né?

Defesas

o advogado Cássio Cubero, que defende Pedro da Silva, foi procurado pela reportagem e se manifestou. “A fundamentação para a prisão é insubsistente, pois não há qualquer risco às investigações, pelo fato do Sr. Pedro ter sido exonerado há mais de trinta dias e também porque as provas já foram colhidas. O Sr Pedro faz jus a liberdade provisória pois manifestou demoradamente em seu depoimento, contribuindo totalmente para elucidação dos fatos, as empresas que tem ou que teve, foi sempre em nome próprio e a alegação de que algumas seriam fantasmas cai por terra com simples pesquisa no TRT ou no TJ-SP, onde se constata vários processos trabalhistas, cobrança e outros”.

“Estamos reunindo documentação necessária para comprovar os lastros financeiros relacionados as empresas, o Sr. Pedro sempre foi empreendedor, sempre em nome próprio, jamais usou nome de terceiros para empreender, justamente por se tratar de atividade licita. Já trabalhou com eventos, farmácia, bar, restaurante e produção rural, hoje desenvolve apenas a atividade de produtor rural, venda e compra de gado e leite”.

O presidente nacional do PSDB, Geraldo Alckmin, reitera seu total apoio às investigações. Se houve desvio, Alckmin defende punição exemplar. Caso contrário, que o direito de defesa prevaleça. Com relação ao caso mencionado pela reportagem, o ex-governador de São Paulo reforça que todas as informações solicitadas foram prestadas pela Dersa ao TCU, que ainda não julgou o caso.

A Dersa – Desenvolvimento Rodoviário S/A também se manifestou. Disse, em nota, que a empresa e o Governo de São Paulo “são os maiores interessados acerca do andamento do processo. Havendo qualquer eventual prejuízo ao erário público, o Estado adotará as medidas cabíveis, como já agiu em outras ocasiões”.

Por Luiz Vassallo

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