Mortes por Covid-19 aumentam entre funcionários de presídios, que culpam o Estado e falam em abertura de CPI

Um terço dos óbitos por coronavírus registrados pela categoria aconteceram no mês passado; servidores citam baixa qualidade dos equipamentos de segurança: ‘Estado só fornece máscaras de TNT’

  • Por Lorena Barros
  • 01/04/2021 08h00 - Atualizado em 01/04/2021 22h23
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Assembleia Legislativa de São Paulo/Imagem de Arquivo policial penal de costas Policiais penais denunciam problemas e cobram o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) pela regulamentação da categoria

Alexandre Modafares tinha 43 anos, 19 deles dedicados ao sistema penitenciário de São Paulo, quando foi contaminado pela Covid-19 e morreu, deixando a esposa e dois filhos. Hugo Covolan, também servidor desde 1998, foi vitimado pela doença um dia após completar 43 anos, deixando três filhas pequenas. Assim como eles, Alex Rossini, de 44, Miguel Alves Filho, de 55, Maisa Vieira, de 53, morreram pela doença em março, quando pelo menos 24 óbitos de servidores penais foram registrados, valor que equivale a 34% de todas as 70 mortes registradas pela categoria desde o início da pandemia. No mês em que São Paulo bateu recordes diários de óbitos pela doença, as notas de pesar emitidas pelo Sindicato dos Funcionários do Sistema Prisional do Estado de São Paulo (Sifuspesp) foram quase que diárias.

Em um comparativo percentual entre as mortes dentro da categoria e na população do país, é possível ver que, enquanto o Brasil registrou quase 19% de todas as mortes por Covid-19 na pandemia no mês de março, entre os policiais penais, esse número correspondeu a 34% dos óbitos totais nesse mesmo período. A categoria aponta dois fatores como impulsionadores dos casos dentro das unidades prisionais: a baixa qualidade dos equipamentos de segurança distribuídos para os funcionários e a movimentação de presos, advogados e oficiais de justiça entre cadeias, mesmo com a proibição de visitas determinada em liminar no fim de fevereiro. “Existe uma superlotação e a gente precisa muito da máscara N95. O Estado só fornece para nós uma máscara de TNT que são os próprios presos que fabricam. Essa máscara não é legal, inclusive nós temos igual o caso de Araraquara, 244 presos confirmados com Covid. Como o servidor vai entrar lá dentro da unidade prisional com máscara de TNT?”, questiona o presidente do Sifuspesp, Fábio Jabá. Ele lembra que, além das 70 mortes totais e dos casos confirmados, há cerca de 30 servidores internados com Covid-19 em leitos de enfermaria e 14 em Unidades de Tratamento Intensivo (UTIs) no Estado.

duas máscaras de tnt, uma rosa e uma azul

Policiais penais afirmaram que só receberam máscaras de TNT para proteção individual

 

A transferência de detentos entre as prisões também ocorre sem qualquer teste para presença do vírus, o que pode ter potencializado as infecções no mês de março. Além disso, o afastamento de servidores considerados como grupo de risco faz com que o número de funcionários para as unidades prisionais seja ainda menor do que o habitual. “Hoje nós temos uma unidade isolada com 1.800 presos e apenas seis policiais penais de plantão”, afirma Jabá. A categoria fez reuniões com o deputado Carlos Giannazi (PSOL-SP) sobre a possibilidade de pedir a abertura de uma CPI para investigar a responsabilidade do Estado nas mortes pela doença. “Temos a missão de tentar honrar a morte desses companheiros e tentar ajudar as suas famílias, inclusive responsabilizando o estado de São Paulo pelas mortes. O Estado vai ter que se responsabilizar por elas. Ele está sendo omisso em cumprir sua função”, defende. A idade média dos policiais penais mortos pela Covid-19 no mês de março era de 49 anos. Eles engrossam as estatísticas do Estado de São Paulo, mais populoso e mais atingido pela Covid-19 no país. Até o momento, há mais de 2 milhões de casos confirmados e mais de 74 mil óbitos causados pela doença desde o início da pandemia na unidade federativa.

Cenário nacional

No Brasil, o levantamento de contaminações e mortes por Covid-19 dentro do sistema prisional engloba servidores e pessoas presas e é computado pelo Conselho Nacional de Justiça. Segundo dados mais recentes, do dia 24 de fevereiro de 2021, em todo o país foram registrados 293 mortes (139 de servidores e 154 de presos) e 67.262 casos (17.316 de profissionais e 49.946 de detentos) desde o início da pandemia. São Paulo, que para o CNJ tem mais trabalhadores do que presos com óbitos confirmado (57 em comparação a 40), é seguido por Roraima (com 10 servidores mortos pela Covid-19), Pará, Mato Grosso e Maranhão (com 9 mortos pela Covid-19 em cada unidade federativa).

Posicionamento da Secretaria de Administração Penitenciária

Em nota, a Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo informou que as 400 mil máscaras de TNT distribuídas até o momento são feitas com três camadas do material e “confeccionadas em oficinas devidamente higienizadas” seguindo um protocolo de higiene pessoal. O órgão afirmou, ainda, que além das de TNT, máscaras cirúrgicas e reutilizáveis adquiridas no mercado são distribuídas para os funcionários e apenados, assim como 68 mil do tipo N95/PFF2, o que totalizaria 6 milhões de objetos de proteção distribuídos desde o início da pandemia. “As máscaras N95 são utilizadas prioritariamente pelos agentes, médicos e equipe de saúde que estão em contato direto com custodiados suspeitos ou em tratamento contra a Covid-19. Além das máscaras, foram entregues aos presídios quase 3 milhões de luvas descartáveis, mais de 132 mil litros de álcool gel, 103 mil litros de sabonete líquido, entre outros insumos”, afirmou a SAP.

Sobre as transferências, a SAP informou que um rigoroso protocolo de segurança é cumprido para todas as novas inclusões em presídios, incluindo o cumprimento de quarentena e avaliação médica. A pasta também frisou que a letalidade entre os presos demonstra de forma positiva a efetividade das condições higiênicas adotadas pelos presídios. “A taxa de letalidade pela Covid-19 entre os presos está em 0,3% dos casos, muito menor do que a população externa ao presídio, o que demonstra a efetividade das medidas adotadas. Sobre os agentes, o sindicato não tem a indicação de que as contaminações tenham ocorrido no ambiente de trabalho.”

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