Relator da ONU diz que governo brasileiro não deu aval para inspeção em barragens
O governo brasileiro não autorizou a viagem de um relator da Organização das Nações Unidas (ONU) para avaliar a situação de barragens e do meio ambiente, após o desastre de Mariana (MG) em 2016. Baskut Tuncak contou que “em várias ocasiões” solicitou sinal verde para que visitasse a região para examinar os riscos de potenciais novos desastres.
Não houve a autorização e um novo desastre aconteceu. A barragem do Córrego do Feijão, da mineradora Vale, se rompeu na tarde da última sexta-feira (25), deixando – até o momento – 60 mortos em Brumadinho (MG). A onda de rejeitos de minério de ferro atingiu a área administrativa da empresa e a comunidade da Vila Ferteco.
Tradicionalmente, o Brasil adota uma posição de manter convite aberto a todos os relatores da ONU que queiram visitar o território nacional. A princípio, portanto, todos são autorizados a viajar ao País para a realização de missões. Mas, na prática, isso ocorrem apenas quando o governo oferece uma data para receber o relator.
“Fiz repetidos apelos ao governo para que eu fizesse uma avaliação independente da situação”, declarou Tuncak. “Fizemos muitos pedidos e tivemos reuniões com a missão do Brasil em Genebra [na Suíça], mas não tivemos uma resposta e não recebemos um convite”, disse. Isso aconteceu ainda no governo de Dilma Rousseff.
Após o impeachment da petista, o relator da ONU enviou uma carta oficial, no dia 7 de agosto de 2018, solicitando a visita ao presidente Michel Temer. Como não houve resposta, ele voltou a enviar carta em 7 de dezembro de 2018, já com o governo em transição. O texto foi direcionado à embaixadora do Brasil na ONU, Maria Nazareth Farani Azevedo.
Nessa carta, Baskut Tuncak, “reitarava” o interesse em realizar uma inspeção e sugeria que a viagem ocorresse em 2019. Mais de um mês depois, segundo relatou, não houve resposta e a viagem jamais foi marcada. Questionado, Ministério das Relações Exteriores não se manifestou sobre os motivos para não dar aval à visita.
Sem nenhum retorno, Tuncak ainda enviou ao governo brasileiro uma carta confidencial, em setembro de 2018, solicitando informações sobre o que estava sendo feito para dar uma resposta às vítimas de Mariana e para garantir a proteção de outras comunidades. Em novembro, uma resposta acabou sendo dada pelo Itamaraty.
“Naquele momento, havia uma enorme insatisfação sobre a forma pela qual a crise de 2015 estava sendo lidada. Mas aquela comunicação [do governo] não foi uma resposta satisfatória e não dizia absolutamente nada sobre a proteção das populações em outras regiões e nem prevenção”, apontou o relator da Organização das Nações Unidas.
Baskut Tuncak ainda criticou abertamente as medidas tomadas por diferentes governos brasileiro e pelo atual presidente Jair Bolsonaro de acenar para uma redução dos controles ambientais no País. “Diante do que vemos, das mortes e dos problemas ambientais, essas medidas são verdadeiros choques à consciência”, atacou.
“Logo depois de Mariana, projetos de lei foram apresentados no Brasil relaxando os controles em áreas de mineração e em controles ambientais. Essa é uma tendência que vemos também no atual governo.” Segundo ele, entre o desastre de Mariana e a atual crise, “não houve um esforço real para reforçar a proteção” relativa a barragens.
“Uma vez mais, temos a mesma empresa envolvida [Vale] e famílias mortas”, lamentou. Tunkat rejeita a tese de que apenas a Vale tenha de ser responsabilizada por mortes e danos ambientais. “Cabe ao governo proteger sua população. Não é apenas uma questão da empresa. A responsabilidade também precisa ser das autoridades”, completou.
*Com informações do Estadão Conteúdo
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