‘Não é realista pensar que o governo vai chegar ao déficit zero em 2024’, afirma ex-ministro da Fazenda

Em entrevista à Jovem Pan, Paulo Haddad avalia que dificuldades para formulação do orçamento estão ligadas a problema estrutural que engloba muitas demandas de despesas e uma arrecadação que não consegue acompanhar essas necessidades 

  • Por Tatyane Mendes
  • 03/09/2023 07h00 - Atualizado em 03/09/2023 11h56
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Antonio Cruz/Agência Brasil Paulo Haddad Paulo Haddad foi Ministro da Fazenda durante o governo de Itamar Franco, entre 1992 e 1993

A execução do Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2024 se apresenta como um dos grandes desafios para o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A medida tem como principal objetivo garantir que as contas públicas terminem o ano com déficit zero, ou seja, que os gastos sejam iguais à arrecadação. A meta é vista como ambiciosa por alguns especialistas, inclusive o ex-ministro da Fazenda Paulo Haddad, que exerceu o cargo durante a gestão de Itamar Franco. Ele afirma que a inclusão da medida no projeto de orçamento é um compromisso intencional, mas não é realista. “É o governo falando: vou fazer todo o esforço para chegar ao déficit zero, mas não é realista. O descompasso entre a demanda, o serviço público, a pobreza e necessidade de se modernizar a estrutura econômica e social do país mostra que isso não vai se realizar“, analisa.

Ele complementa que, quando o governo produz um orçamento, ele precisa sinalizar o que pretende com ele. No caso da gestão de Lula é a meta de déficit zero. Contudo, Haddad considera que isso é apenas uma intenção do governo, que pode se perder durante a execução do orçamento. Apesar disso, o economista considera importante que o governo comece esse próximo ano com esse compromisso. “Não é realista pensar que o governo vai chegar ao déficit zero em 2024. Com o quê ele vai contingenciar? Com dinheiro do SUS [Sistema Público de Saúde]? Com transferências fiscais? Com as políticas compensatórias? Isso não é possível. Vai ser difícil aumentar a tributação sobre a riqueza financeira”, complementa.

O ex-ministro analisa que tributar os riscos, como o governo deseja para garantir a arrecadação, não é uma tarefa fácil e deve encontrar resistência no Congresso. Para Haddad, a solução é promover um novo ciclo de expansão da economia brasileira, através do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). “Sem aumentar a carga tributária, que é um terço do PIB, você aumenta a arrecadação e coloca nos cofres públicos os recursos necessários para enfrentar essa avalanche de demanda. O equilíbrio fiscal passa pela retomada do crescimento do país”, considera.

Segundo o economista, as dificuldades para a formulação do orçamento anual de 2024 nasceram nos últimos 50 anos de história recente do país. Ele pontua que, até 1980, o Brasil crescia uma média de 5% ao ano. Porém, a economia não conseguiu manter o mesmo ritmo, chegando a registrar taxas negativas em alguns anos. “Isso repercute no orçamento da seguinte forma: do lado da despesa, você tem uma avalanche de demandas para diversos setores, principalmente as políticas sociais compensatórias e o desenvolvimento da ciência e tecnologia. O governo tem que gastar para recuperar essas questões. E temos três grandes problemas a serem atacados: a pobreza, o baixo dinamismo do mercado de trabalho e o desequilíbrio regional de desenvolvimento”, indica.

O ex-ministro aponta que, como o país conta com uma avalanche de demandas e cresceu pouco nos últimos 23 anos, a arrecadação não acompanhou a demanda de recursos. “Se o país tivesse crescido a 5% ao ano, nós teríamos hoje, do lado da receita, mais ou menos entre R$ 300 e R$ 400 bilhões. Nesse aspecto, nós estamos sob um orçamento precário, do ponto de vista da avalanche de demandas”, classifica. Ele complementa que este é um problema estrutural, e não ligado às ideológicas do governo atual e do anterior. Haddad esclarece que o muda é no quê cada gestão irá investir, mas o total do gasto é limitado pela receita. O economista finaliza afirmando que tem uma expectativa favorável e otimista para o futuro da economia, mas ele afirma que é necessário um planejamento de médio e longo prazo.

 

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