OCDE recomenda que Carf volte a adotar o sistema de voto de qualidade em carta a Haddad

Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico argumenta que a mudança legislativa adotada em 2020, que alterou a prática do processo de recurso administrativo tributário no Brasil, não é praticada nos outros países e deve retornar ao modelo antigo

  • Por Jovem Pan
  • 26/04/2023 09h28
ROBERTO CASIMIRO/FOTOARENA/FOTOARENA/ESTADÃO CONTEÚDO Fernando Haddad Fernando Haddad é o atual ministro da Fazenda do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT)

No final do mês de março, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) enviou uma carta ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, na qual contesta o funcionamento atual do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), responsável por julgar litígios tributários, e requisitou mudanças no órgão. O questionamento principal diz respeito ao fim do chamado voto de qualidade no processo de recurso administrativo tributário no Brasil. Uma mudança legislativa adotada em 2020 determinou que, quando os votos dos juízes representantes do setor privado e público resultarem em empate, a decisão é sempre favorável ao contribuinte. No caso do voto de qualidade, que era adotado anteriormente, na ocorrência de empate entre os votos dos juízes, a decisão seria atribuída ao voto do presidente do Carf. Para a OCDE, o atual formato, além de não ser praticado no resto dos países do grupo, poderia “criar também um potencial risco de conflito de interesses, o que pode ser muito difícil de mitigar”.

“Nossa pesquisa inicial indica que, ao contrário do Brasil, a maioria das jurisdições que analisamos possui algum tipo de processo de recurso administrativo, mas não um que envolva representantes do setor privado no processo de revisão de tomada de decisão. Em vez disso, as revisões são realizadas por funcionários do governo da administração tributária ou Ministério da Fazenda. Em contraste, as regras brasileiras atuais permitem o envolvimento de juízes leigos, que antes ou depois de sua nomeação atuam como advogados ou juristas no setor privado. Eles não são juízes de carreira, mas são nomeados apenas por um curto período. Entendemos que a remuneração recebida por esses juízes leigos é, na maioria dos casos, significativamente menor do que a remuneração que eles ganham na carreira no setor privado. A natureza de curto prazo dessas nomeações, a remuneração comparativamente baixa e o fato de que, tanto antes quanto depois dessa nomeação, esses juízes podem trabalhar para o setor privado e podem obter benefícios diretos ou indiretos devido às posições que assumem em seu papel de juiz no Carf poderiam, em alguns casos, criar também um potencial risco de conflito de interesses, o que pode ser muito difícil de mitigar”, argumenta a carta.

Neste sentido, a OCDE pede que o atual formato seja reavaliado e, na falta do desenvolvimento de um modelo melhor, recomenda o retorno ao formato anterior do voto de qualidade, que foi restaurado por uma medida provisória (MP) do governo Lula (PT), após ter sido extinto em 2020. Contudo, a MP ainda não foi instalada pelo Congresso Nacional e deve ser reeditada na forma de um projeto de lei que será tramitado com urgência constitucional. “No sistema anterior, o presidente do Carf – um representante da administração tributária teria direito a dar o voto decisivo para manter o imposto reivindicado e as penalidades aplicadas pela Receita Federal do Brasil em um processo equilibrado. Um retorno a esse processo mitigaria as possíveis consequências negativas do modelo estabelecido em 2020 que foram discutidas acima. Isso não terá um impacto negativo nos direitos dos contribuintes, porque eles ainda manterão seu recurso à revisão judicial independente, onde poderão contestar, com base legal, a avaliação tributária, bem como os impostos reivindicados e as penalidades aplicadas”, analisa a OCDE.

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