Portabilidade de financiamento imobiliário: Quando vale a pena?

  • Por Beatriz Manfredini
  • 31/10/2019 07h07 - Atualizado em 31/10/2019 11h19
Pixabay Entre 2017 e 2018, pedidos de portabilidade cresceram 453,8%

Ao decidir, nesta quarta-feira (30), reduzir a taxa Selic ao menor patamar da história, em 5% ao ano, o Comitê de Política Monetária (Copom) estimula bancos públicos e privados brasileiros a dar continuidade em uma empreitada de redução nos juros de financiamento imobiliário iniciada em setembro, com o primeiro corte – quando estava em 5,5% ao ano.

Na época, o Itaú Unibanco foi o primeiro a dar um passo em direção aos menores juros: diminuiu as taxas de 8,1% para 7,5% – mais a Taxa Referencial (TR) -, seguido pelo Bradesco, que reduziu de 8,2% para 7,3%, acrescentando-se também a TR.

Com a escalada de cortes, o Boletim Focus, relatório divulgado pelo Banco Central (BC) com projeções para a economia do país, desceu ainda mais a previsão da taxa Selic para o fim deste ano, deixando-a em 4,75% ao ano. Poucos dias depois, a Caixa Econômica Federal também diminuiu os juros para crédito imobiliário, com taxas entre 7,5% e 9,5% mais a TR.

Com os cortes nos juros, os pedidos de portabilidade de financiamento imobiliário, que já foram altos em 2018 – 453,8% maiores do que em 2017, de acordo com o BC – podem ser ainda mais solicitados.

Para o economista-chefe da Nova Futura Investimentos, Pedro Paulo Silveira, a tendência é que os valores caiam ainda mais. “A portabilidade é importante porque o banco vê que a taxa dele está maior, então ele quer competir com o outro, podendo diminuir os juros ainda mais. Além disso, há chances de, se o cliente pedir a portabilidade, o banco renegociar a dívida para cobrir a taxa menor dos outros”, diz.

Mas o que é portabilidade de financiamento?

A portabilidade acontece quando um cliente retira a dívida de um banco e a repassa para outro. Para isso, é preciso ir até a instituição financeira e solicitar o extrato de toda a dívida restante – sem os juros -, como se fosse antecipar a quitação do imóvel. Com o saldo devedor em mãos, é hora de procurar o banco para qual o valor será migrado.

Caso o novo banco aceite a troca, ele vai pagar a dívida do cliente com a instituição inicial, que havia fornecido o crédito, de modo que, agora, o valor a ser pago passa a ser devido para o novo credor.

Vale lembrar, aqui, que o banco que forneceu o crédito não pode se recusar a fazer a portabilidade. De acordo com o cofundador da Melhortaxa, Rafael Sasso, a instituição financeira é obrigada a fazer a mudança. “No máximo, ela pode cobrir a proposta que o novo banco te fez, de modo que você desista da mudança. O consumidor é livre para encontrar condições melhores de pagamento”, explica.

Regras

A portabilidade da dívida é regulamentada pelo Banco Central, que determina que o valor total do financiamento e o número de prestações não podem sofrer aumento ao migrarem para outro banco. Apesar das restrições, o valor da parcela poder ser alterado, caso seja a vontade do consumidor.

A migração não pode ser feita, no entanto, quando há mudanças no regime contratado. Se o cliente fez o financiamento com as taxas de juros mais a Taxa Referencial (TR), por exemplo, não poderá passar seu contrato para um modelo de taxas mais o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), considerado a inflação do país, e vice-versa.

Quem pode fazer?

Qualquer um pode pedir a troca de banco, mas vale lembrar que, ao solicitá-la, o cliente será submetido a uma nova análise de crédito, como a inicial feita na data original do financiamento. Por isso, caso a pessoa não atenda aos pré-requisitos para liberação de crédito da instituição, a portabilidade pode ser recusada.

“Os bancos podem recusar aceitar o novo cliente por três razões principais: ele não quitou alguma parcela, está com o nome negativado ou não tem renda suficiente para pagar pela operação”, afirma Sasso.

Quanto tempo demora?

Segundo a advogada especialista em direito imobiliário, Paula Farias, a transferência da dívida não é um processo demorado, sendo possível concluí-lo em menos de um mês. “Em torno de dez dias depois do pedido de portabilidade, o cliente já consegue saber se seu crédito foi aprovado ou não”, explica. “Depois disso, o processo fica mais nas mãos do próprio consumidor, que precisa levar a documentação necessária ao banco.”

Vale a pena?

Para o cofundador da Melhortaxa, o processo de portabilidade normalmente vale a pena. “O crédito imobiliário é a transação financeira mais importante e mais cara da vida de uma família, e é uma dívida que dura por 20, 30 anos. Às vezes, apenas R$ 50 reais por parcela parece pouco, mas em 20 anos já são R$ 10 mil economizados.”

Ele pondera, no entanto, que é preciso avaliar caso a caso, uma vez que os custos da transação – os bancos cobram taxas pelas mudanças – podem sair entre R$ 3 mil e R$ 4 mil reais. “Em alguns casos, faltando poucas parcelas para o fim, pode não valer a pena. Também há famílias que podem não ter essa quantia de dinheiro disponível. Nesse caso, melhor permanecer no banco de origem”, conclui.

Farias aponta que é preciso estudar muito antes de fazer a troca. A advogada enfatiza que, além dessas taxas de transação citadas acima que, segundo ela equivalem a cerca de 10% do valor do imóvel, “a grande questão para a qual os consumidores precisam se atentar é que não é apenas a taxa de juros. Tem os seguros que serão embutidos no contrato, a taxa de administração, tudo o que vai entrar nas parcelas.”

O professor de economia da Ibmec, Walter Franco, diz que portabilidade só vale a pena quando o cliente tem 100% de certeza do que está fazendo e de que a economia é realmente vantajosa. “A portabilidade, muitas vezes, é quase desnecessária. Se você não tem certeza do quanto vai gastar e não tem recursos para os custos dessa mudança, não faz sentido. Precisa pensar em tudo: se o crédito está aprovado, se tem boa relação com o outro banco, saber o que vai ser incluído no novo contrato, se você vai precisar abrir uma nova conta e pagar as taxas. Essa é uma simulação muito difícil de uma pessoa fazer sozinha. Se não estiver 100% informado, é melhor tentar renegociar com o próprio banco”, garante.

Franco ressalta que, para conseguir um bom preço em outro banco, não basta apenas checar o valor dos juros. “Precisa fazer as contas com muito cuidado. Às vezes, os juros caíram 0,5%, 1%, mas tem todas as outras cobranças. Fora os custos imediatos. Precismos mudar nossa mentalidade: às vezes, o melhor não é economizar, mas sim não gastar”, acrescenta.

O cliente pode tentar renegociar com o banco de origem?

De acordo com o professor, tentar conversar com o banco que forneceu o crédito ao cliente deveria ser o primeiro passo. “Ver a possibilidade de uma linha mais barata no próprio banco é sempre a primeira opção. Mudar de instituição financeira é complexo, burocrático, envolve novos contratos e novos custos. Fora que é preciso ter as boas relações com esse novo banco. Dentro de um que você já conhece é mais simples”, relembra.

Farias concorda. “É recomendável sempre sentar primeiro com o seu gerente e ver o que ele vai oferecer. É importante saber o momento em que o cliente está: tem as contas em dia? Em atraso? Tudo isso vai influenciar. Mas uma conversa franca com seu banco é mais vantajoso do que sair correndo para um lugar desconhecido e passar de novo pelo mesmo processo.”

Caso a renegociação não dê certo, “aí, sim, é hora de procurar outra instituição financeira”, diz. A dica, segundo os especialistas, pode ser tentar levar uma proposta com juros menores, de outro banco, ao seu financiador inicial.

 

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