Reforma tributária pode ser mais eficiente com ajustes à legislação existente do que com texto totalmente novo

Advogado avalia que PECs em tramitação no Congresso podem lançar o Brasil a um mundo de incertezas legislativas e que é possível utilizar a estrutura já existente para simplificar o sistema tributário nacional

  • Por Tatyane Mendes
  • 08/06/2023 11h00
Arte/Jovem Pan News Campanha da Reforma Tributária: O Brasil Precisa Câmara dos Deputados quer votar reforma tributária até 15 de julho com base nas PECs 45/2019 e 110/2019

A apresentação do relatório do grupo de trabalho da reforma tributária na Câmara dos Deputados trouxe mais clareza sobre os critérios que devem ser discutidos para o texto final. Contudo, alguns especialistas temem o impacto que a reformulação de todo o arcabouço legislativo sobre tributação existente possa causar. O advogado tributarista Carlos Gasperin é um dos que compartilha essa visão. Para ele, seria mais eficiente fazer pequenos ajustes na legislação, do que produzir um texto completamente novo. O jurista concorda que o sistema tributário brasileiro é complexo e ineficiente. Por isso, a simplificação do modelo de tributação é um objetivo nobre, mas que não pode ser alcançado a todo custo. “O Brasil é uma República Federativa de proporções continentais, possuindo unidades federadas de características econômicas diversas. Elas, muitas vezes, têm no seu tributo importante instrumento fiscal de fomento aos seus agentes econômicos ali instalados ou de atração para novos investimentos. Uma reforma tributária deve levar em consideração essas características nacionais, além da cultura de repartição de competências e de exercício da autonomia financeira dos entes subnacionais por meio de instrumentos tributários próprios”, defende. 

Ele indica que boa parte dos benefícios presentes nas Propostas de Emenda à Constituição (PECs) poderiam ser alcançados por meio de implementação de instrumentos legislativos já previstos na legislação dos tributos já existentes. “Afirmam que o IVA proposto implementará a não-cumulatividade plena, cada etapa sendo tributada e gerando crédito para as demais. Se olharmos para Lei Complementar 87/96, que rege o ICMS, essa disposição já existe, mas sua aplicação vem sendo postergada ao longo dos anos pelos Estados. Da mesma forma, a restituição dos créditos aos exportadores é mecanismo já previsto na citada da legislação, mas que não vem sendo aplicada a contento porque Estados e União não encontram uma forma dessa compensar aqueles pelas perdas”, exemplifica. O tributarista argumenta que as mazelas do sistema tributário nacional podem ser atacadas por meio de alterações legislativas menos profundas e que não causem tanto trauma à estrutura política e constitucional como o fazem as propostas que estão em voga.

O advogado acredita que as PECs colocarão por terra toda a sistemática de tributação do consumo vigente no país há mais de 60 anos, ao longo dos quais conceitos jurídicos foram imensamente debatidos pela doutrina e jurisprudência. “Ou seja, as propostas lançarão o Brasil a um mundo de incertezas legislativas. Durante esse período de transição, o contribuinte nacional deverá conviver com dois sistemas diferentes. Essa mazela se arrastará, em verdade, para além do prazo definido nas propostas, já que há prazos decadenciais e prescricionais que manterão vivos os tributos anteriores; haverá questões ainda não julgadas referentes ao sistema anterior que, em determinado momento futuro, deverão ser solucionadas; além de que todo o novo arcabouço conceitual inaugurado pela nova sistemática deverá se sedimentar ao longo das décadas vindouras por meio de debates doutrinários e jurisprudencial que virão”, salienta.

Carlos defende que a reforma tributária seja realizada, mas que seu processo seja realizado de forma mais prudente e adequada às características sociais, econômicas e políticas do Brasil. “Podemos utilizar a estrutura já existente e conhecida pelos brasileiros há mais de meio século, evitando embarcar em aventuras legislativas – que sequer o constituinte de 1988 aceitou- que podem instaurar o caos e a insegurança por muitos anos.  Precisamos de uma reforma tributária que ajuste e não refunde todo o arcabouço legislativo existente”, pontua. 

 

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