Selic mais alta é vital para a economia, e BC mira evitar nova disparada da inflação em 2022

Segundo economistas, elevação da taxa de juros para 3,5% reforça compromisso da autoridade monetária em conter o avanço do aumento generalizado de preços, que se mostra mais persistente do que o previsto

  • Por Gabriel Bosa
  • 05/05/2021 18h59 - Atualizado em 05/05/2021 19h15
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Ueslei Marcelino/Reuters Banco Central anunciou novo reajuste de 0,75 ponto percentual na Selic, o segundo movimento para cima em 2021 Banco Central anunciou novo reajuste de 0,75 ponto percentual na Selic, o segundo movimento para cima em 2021

A nova alta de 0,75 ponto percentual da Selic anunciada pelo Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) nesta quarta-feira, 5, é fundamental para evitar a deterioração da economia brasileira no segundo semestre com uma inflação que já se mostra mais persistente do que o esperado, e que deve continuar pressionada pelo encarecimento das commodities no mercado internacional, aumento do custo aos produtores e risco de descontrole das contas públicas. Ao mesmo tempo, ao jogar a taxa de juros para 3,50% ao ano, a autoridade monetária nacional busca impedir que o galope do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o medidor oficial da inflação brasileira, impacte nas previsões de 2022. “A tarefa de hoje é garantir que a alta da inflação ficará circunscrita para 2021 e não vai se propagar para 2022”, afirma Mauricio Oreng, economista e superintendente de pesquisa macroeconômica do Santander. Esta é a primeira vez desde 2015 que o Copom faz duas alterações seguidas para cima. O movimento está em sintonia com a opinião do mercado sobre um posicionamento mais duro da autoridade monetária com o avanço da inflação no médio e longo prazo. Os efeitos da política do BC podem ser comparados a condução de um transatlântico: são pequenos movimentos seguidos que mudarão o curso ao longo do tempo. “A inflação de 2021 já contaminou o ano que vem, e o movimento do Banco Central é reduzir esse contágio. Ele sabe que a chance de não cumprir a meta neste ano é bastante alta, e agora que reduzir a probabilidade de isso acontecer novamente em 2022”, afirma Camila Abdelmalack, economista-chefe da Veedha Investimentos, que estima que o IPCA encerre 2021 a 5,3%.

O IPCA foi a 6,1% nos 12 meses encerrados em março, acima do teto de 5,25% perseguido pelo Banco Central para este ano, com meta de 3,75% e piso de 2,25%. Há tempos o mercado financeiro emite sinais de preocupação com a escalada do IPCA em 2021 com sucessivas revisões para cima na previsão publicada pelo Boletim Focus. Na edição desta segunda-feira, 3, as fontes do BC estimaram que o índice encerre o ano a 5,04%, ante projeção de 4,81% há um mês. O arrefecimento do risco fiscal com a aprovação do Orçamento de 2021 e a desaceleração do dólar no último mês devem retirar um pouco da pressão inflacionária. Apesar desse alívio momentâneo, outros fatores que trouxeram o IPCA até aqui, principalmente a valorização de commodities agrícolas, metálicas e energéticas, além da constante preocupação com as contas do governo em meio aos gastos para conter a pandemia, devem continuar alimentando o crescimento da inflação na última metade do ano. “Por mais que os riscos não possuam a mesma intensidade do primeiro semestre, o cenário inspira cautela porque não temos mais gordura para queimar com o valor da inflação já próximo do teto”, afirma Marcela Rocha, economista-chefe da Claritas Investimento, que projeta o IPCA a 5% até o fim deste ano. A retomada da economia brasileira estimada para o segundo semestre com o sucesso da vacinação em massa deve se tornar um novo fator de pressão nos índices. “Os serviços podem trazer sustos para a inflação, já que os estabelecimentos que sobreviverem à crise deverão repassar aos consumidores os custos que tiveram nos últimos meses.” Em um cenário oposto, Camila, da Veedha, afirma que a necessidade de novas ações para combater a pandemia reforçarão o desequilíbrio fiscal. “Poderemos ter a continuação do auxílio emergencial, o que traria pressão com o aumento do prêmio na curva de juros.”

O pessimismo com os rumo da inflação começa a se espraiar para o ano que vem, com economistas e entidades passando a enxergar o IPCA a 3,61%, de acordo com o Focus desta semana. Há um mês, a expectativa estava em 3,52%. Para 2022, a autoridade monetária nacional deve perseguir a meta de 3,50%, com variação entre 2% e 5%. O galope da inflação começou a tomar força no fim de 2020, impulsionado pela desvalorização do real ante o dólar, o encarecimento de commodities agrícolas, principalmente a soja e o arroz, e a disparada do risco fiscal. Desde então, a autoridade monetária nacional tem repetido que a alta é localizada e temporária, apesar de o presidente do BC, Roberto Campos Neto, já sinalizar que o ritmo está mais persistente do que o imaginado. “As ações de hoje vão se refletir no ano que vem, e as expectativas já estão acima do centro da meta. Mesmo que a alta não seja tão forte quanto a deste ano, é um alerta de que se o Banco Central não for duro na comunicação e não mostrar comprometimento, esta previsão pode desancorar”, explica Marcela, da Claritas. Para Oreng, do Santander, os indícios ainda apontam para uma elevação de preços localizada pelas mudanças de hábitos trazidas pelo novo coronavírus. No entanto, é preciso fixar posição de que todos os esforços estão indo na direção de controle inflacionário. “Continuamos acreditando que é algo temporário, mas a persistência está se mostrando mais intensa e não está arrefecendo, muito pelo contrário”, afirma.

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