Surpresa com a inflação faz mercado enxergar IPCA acima de 10% em 2021 e superior ao teto da meta em 2022
Variação de preços foi a 1,25% em outubro, o maior valor em 19 anos, e somou alta de 10,67% nos 12 meses acumulados; inflação não encerra acima de dois dígitos desde 2015
A surpresa com a aceleração de 1,25% do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de outubro, o registro mais expressivo desde 2002, e com acumulado de 10,67% em 12 meses, levou a uma série de revisões para cima das expectativas do mercado financeiro para inflação. Em alguns casos, a alta passa de dois dígitos em 2021, enquanto para 2022 há quem enxergue a inflação ficando acima do teto da meta pelo segundo ano consecutivo. O Banco Central (BC) persegue a meta inflacionária de 3,75% neste ano, com margem de 1,5 ponto percentual, ou seja, entre 2,25% e 5,25%. Já para 2022, a autoridade monetária tem como centro 3,50%, com piso de 2% e teto de 5%. Em revisão publicada nesta tarde, a XP Investimentos passou a perspectiva do IPCA para 10,1% neste ano, enquanto para 2022 a entidade alterou a estimativa para alta de 5,2%. “A surpresa do mês acima do projetada confirma leitura desafiadora da inflação, pressionada tanto pelos repasses em curso dos elevados custos de produção quanto pelo efeito da aceleração dos preços dos serviços”, afirmou a economista Tatiana Nogueira.
A Veedha Investimentos segue a mesma linha e elevou a expectativa da inflação em 2021 para 10,2%, enquanto no ano que vem a projeção foi revista para 5,5%. Segundo a economista-chefe, Camila Abdelmalack, o cenário é influenciado pelo desarranjo entre a oferta e a demanda na produção de bens, o aumento generalizado da energia em todo o mundo e a desvalorização do real ante o dólar. “Tudo isso fomenta a aceleração dos preços no Brasil. Nós acompanhamos um repasse dos preços do produtor ao consumidor em uma dinâmica global”, afirma, citando também as altas inflacionárias nos Estados Unidos, na Europa e na China. O Bank of America também revisou para cima a expectativa com a inflação neste ano e passou a ver o IPCA a 10,1%. Para 2022, o banco manteve a projeção de 5%. “Esperamos o pico de 10,74% em novembro, mas os riscos ainda estão em alta com a volatilidade no preço das commodities e barulhos fiscal e político”, informou o BofA em relatório. Em um ritmo mais moderado, a Ativa Investimentos passou a ver a inflação a 9,4% ao fim deste ano, e 4,4% em 2022. “Matematicamente os avanços da inflação, no ano corrente, com coeficiente de inércia de 0,3, não são suficientes para justificar os avanços inflacionários de 2022, visto que a trajetória de juro segue subindo também. Logo, atribuímos grande parte do avanço das expectativas de 2022 não mais aos fatores associados, exclusivamente, a oferta e demanda, mas sim uma desancoragem das mesmas”, afirmou Étore Sanchez, economista-chefe da entidade.
A última vez que o país fechou o IPCA com dois dígitos foi em 2015, aos 10,67%, também acima do teto da meta de 6,5%. Quando isso acontece, o presidente do Banco Central precisa publicar uma carta aberta ao ministro da Economia explicando os motivos de a variação de preços ter estourado o limite. A aceleração da inflação em 2021 é puxada principalmente pela variação de preços administrados, como a energia elétrica e os combustíveis, em meio ao quadro de forte desvalorização do real ante o dólar, alta no preço das commodities e crise hídrica. O mercado financeiro projeta que o IPCA encerre o ano em 9,33%, segundo previsão do Boletim Focus divulgado nesta segunda-feira, 8. Na semana passada, a estimativa apontava para alta de 9,17%. A constante revisão para a variação de preços deste ano já contaminou as expectativas de 2022. Para o ano que vem, a mediana da pesquisa feita pelo Banco Central aponta inflação a 4,63%, ante 4,55% na edição da semana passada. A autoridade monetária persegue a meta de 3,50% em 2022, com piso de 2% e teto de 5%.
A deterioração das expectativas da inflação foram reforçadas pelo aumento do risco fiscal com o apoio do governo federal na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios. O texto, que foi aprovado em segundo turno pela Câmara dos Deputados na noite desta terça-feira, 9, e agora segue para o Senado, autoriza o adiamento do pagamento das dívidas do Executivo, muda as regras do teto de gastos e dá base financeira para o governo elevar as parcelas do Auxílio Brasil a R$ 400 por mês até dezembro de 2022. Em resposta, o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC acelerou a alta dos juros ao acrescentar 1,5 ponto percentual e elevar a Selic para 7,75% ao ano na reunião de outubro. Em ata, a autoridade monetária sinalizou novo aumento de mesma magnitude no encontro de dezembro, o último de 2021, encerrando o ano com os juros em 9,25%. Para analistas, o BC deve manter o ritmo de alta até o fim do ciclo, projetado para até março de 2022, com a Selic próxima de 11%. A autoridade monetária reconheceu que o movimento deixa a taxa em patamar “significativamente contracionista” — quando os juros dificultam as atividades econômicas. Essa mudança levou à revisão da expectativa do Produto Interno Bruto (PIB) de 2022 para 1%, com análises mais pessimistas indicando recessão no próximo ano.
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