Governo errou ao enfrentar Cunha e verá custos maiores para aprovar projetos
O governo da presidente Dilma Rousseff cometeu um “erro estratégico” ao decidir enfrentar o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) na disputa pela presidência da Câmara e, com a derrota de domingo, terá custos maiores para aprovar matérias de seu interesse na Casa.
Cunha venceu a eleição já no primeiro turno com 267 votos, dez a mais do que o necessário para encerrar a contenda na primeira rodada de votações, enquanto o candidato do PT, Arlindo Chinaglia (SP), que teve apoio ostensivo de ministros petistas ficou apenas com 136 votos, em uma derrota categórica e cujo placar causou espanto no Palácio do Planalto.
“O custo para o governo aprovar as suas iniciativas vai aumentar, esse é o resumo da ópera”, disse à Reuters o cientista político da Fundação Getúlio Vargas Cláudio Couto.
“Quem dentro do governo bolou essa estratégia (de enfrentar Cunha) não leu Maquiavel. E provavelmente deveria ter tido uma outra abordagem, que era a de tentar uma composição com o Cunha”, acrescentou.
O novo presidente da Câmara, um desafeto do Palácio do Planalto, iniciou sua campanha para o cargo ainda no ano passado e desde então começou a viajar pelo país em busca de apoio. A candidatura de Chinaglia, muito mais recente, não conseguiu sequer atrair o apoio de todos os integrantes do bloco formado para lançar sua candidatura.
Além das traições sofridas, o governo também teve de engolir o fato de o PT, partido da presidente e maior bancada da Câmara, ficar sem uma cadeira na Mesa Diretora da Câmara e correr o risco de ficar fora das principais comissões, apesar de Chinaglia afirmar que o acordo para a formação do bloco que o apoiou previa que um petista estaria na mesa em caso de derrota dele.
“Isso (a derrota sofrida no domingo) é o maior sinal de que a presidente precisa melhorar a sua relação com o Legislativo como instituição e sobretudo com a base aliada como ator político que vai ser bastante relevante para o segundo mandato”, disse o analista político da Tendências Consultoria Rafael Cortez.
Dilma terá um ano complicado pela frente na economia, com a inflação rondando o teto da meta há meses, expectativa de estagnação econômica, juros em alta e necessidade de um forte ajuste nas contas públicas.
E é justamente nesse ajuste que a presidente precisará do Congresso para aprovar, por exemplo, a mudança na concessão de benefícios sociais, como o seguro-desemprego.
“O governo precisa melhorar sua atuação legislativa junto ao colégio de líderes, que é o colegiado que de alguma maneira define a agenda, e certamente todas as medidas que o governo vai propor implementar neste segundo mandato vão precisar ser bem trabalhadas junto ao Poder Legislativo, porque não vai ter vida fácil junto à presidência do Eduardo Cunha”, disse Cortez.
TAMANHO DA DERROTA
O tamanho da derrota sofrida na disputa pela presidência da Câmara causou espanto no Palácio do Planalto e, segundo uma fonte do governo, a tarefa agora é recompor a base aliada na Câmara, já que os governistas avaliam que Dilma tem mais votos do que os 136 dados a Chinaglia no domingo.
Para Couto, da FGV, o governo precisa “aprender com a derrota” e procurar Cunha para buscar o diálogo com o presidente da Câmara, aproveitando o tom conciliador adotado por ele após a vitória.
“Ele é o presidente da Câmara e mostrou nesse episódio como ele consegue angariar apoios em torno dele. Então, ou o governo abaixa a bola e conversa com ele reconhecendo esse poder, ou vai sofrer novas derrotas”, disse Couto.
Se na Câmara a estratégia governista naufragou, no Senado a postura mais conservadora do governo, de apoiar a reeleição de Renan Calheiros (PMDB-AL), mais alinhado ao Planalto, deu resultado e ele derrotou o candidato avulso Luiz Henrique (PMDB-SC), que tinha o apoio da oposição.
“Quando o governo viu que estava perdido na Câmara, se voltou para cá. Ou seja, entregou os anéis lá para poder salvar os dedos”, disse o líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO), lamentando a vitória de Renan na Casa.
“A Câmara dos Deputados tem um presidente com independência. A Câmara vai ser o poder que vai pautar muito mais matérias que a sociedade deseja, e o Senado Federal vai ficar a reboque.”
Por outro lado, os 31 votos obtidos por Luiz Henrique na eleição de domingo no Senado superam as 27 assinaturas necessárias para criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito na Casa, por exemplo.
E, como lembra Cortez, da Tendências, a oposição no Senado terá o reforço de nomes de peso, como os ex-governadores tucanos José Serra (SP), Tasso Jereissati (CE) e Antonio Anastasia (MG).
“Na Câmara o problema maior (para o governo) é dentro da base aliada e no Senado vai ser realmente o espaço que a oposição vai ter, com mais chance de contrapor ao governo”, disse.
*Eduardo Simões e Jeferson Ribeiro
Comentários
Conteúdo para assinantes. Assine JP Premium.