Minoria Uighur denuncia estupros em campos de ‘reeducação’ da China
Mulheres relatam ter sofrido abusos e torturas sexuais sistematicamente por homens que chegavam à noite usando máscaras e ternos, o que indicaria um esquema de crime organizado
Estima-se que desde 2015 a China já prendeu um milhão de homens e mulheres da etnia Uighur nos campos de detenção de Xinjiang. Documentos do governo obtidos pela imprensa internacional mostram que essas minorias são presas principalmente por orar, usar véu no rosto, manter a barba longa e ter mais filhos do que o permitido. As informações corroboram as acusações levantadas pelos grupos de direitos humanos, que afirmam que o presidente Xi Jinping está minando principalmente a liberdade religiosa dos uigures. Originária da Ásia Central, a etnia segue o islamismo sunita e vive hoje principalmente no noroeste da China, onde lutam por sua independência e são alvo de constantes perseguições e monitoramentos. Apesar do governo afirmar que os campos de detenção servem para “reeducar” os uigures e outras minorias, há denúncias de que esses locais são palco para punições, doutrinações e até esterilizações forçadas. Pouco antes de deixar a Casa Branca, o ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, afirmou que o que estava acontecendo na China era um “genocídio” dos uigures. O país asiático rebateu dizendo que isso era uma “mentira absurda”.
Depoimentos mais recentes obtidos pela emissora de televisão britânica BBC indicam que Xinjiang também está vivendo um esquema organizado de estupro. Mulheres uigures que ficaram presas nos campos de detenção relatam terem sido estupradas sistematicamente por homens de terno mascarados, que visitavam as celas por volta da meia-noite para escolher as suas vítimas. As mulheres eram então levadas a um quarto sem câmeras de segurança, onde sofriam abusos e torturas sexuais. Em entrevista à BBC divulgada nesta quarta-feira, 3, Tursunay Ziawudun afirma que chegou a ser estuprada por mais de dois homens ao mesmo tempo e que outras presidiárias sumiram após essas sessões. Depois de passar nove meses presa, ela conseguiu fugir para o Cazaquistão e, em seguida, para os Estados Unidos, onde vive atualmente. Outra entrevistada, Gulzira Auelkhan, ficou 18 meses no campo de detenção e conta que era responsável por algemar e despir outras mulheres antes de deixá-las sozinhas com policiais ou homens chineses que vinham de fora. Alguns deles, segundo ela, pagavam para poder escolher as presidiárias “mais jovens e bonitas”.
Tursunay Ziawudun também testemunhou que algumas mulheres presas nos campos de detenção tinham DIUs instalados contra a sua vontade ou então eram completamente esterilizadas. Em janeiro, a Embaixada da China nos Estados Unidos chegou a confirmar que as mulheres detidas deixavam de ser “máquinas de fabricar bebês” e que isso representava para elas uma forma de “emancipação”, já que através da “erradicação do extremismo religioso” elas conquistavam “direitos de igualdade de gênero e de saúde reprodutiva”. Ainda segundo o relato de Ziawudun, todos os uigures, incluindo os homens, remédios e injeções cujos objetivos não eram especificados. No restante do tempo, os presidiários eram obrigados comparecer a aulas sobre o país, a cantar músicas patrióticas chinesas, assistir programas de televisão favoráveis ao presidente Xi Jinping e ler livros escritos por ele. Aqueles que não memorizavam passagens dos textos não recebiam alimentação e poderiam sofrer punições físicas, às vezes com eletrocutadores. “Eu não sei se eles fizeram lavagem cerebral em nós ou era o efeito colateral dos remédios ou injeções, mas você não consegue pensar em nada além de desejar estar com o estômago cheio. A privação de comida é muito severa”, conta.
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