Obras de arte mais caras da história ultrapassam US$ 200 milhões; veja ranking e entenda o que define preços

Pinturas de da Vinci, Cézanne e do norte-americano Jackson Pollock foram negociadas por bilionários ou herdeiros árabes em transações bilionárias ao redor do mundo

  • Por Lorena Barros
  • 21/11/2021 08h00
REUTERS/Noemie Olive homem olhando cópia da monalisa Valor atribuído às obras depende da história dos quadros e dos artistas

Um leilão realizado em Nova York na última terça-feira, 16, fez com que a obra “Diego y yo” (Diego e eu), de Frida Kahlo, fosse arrematada por US$ 35 milhões (equivalente a R$ 190 milhões), se tornando um recorde para a artista e para todas as obras latino-americanas até o momento. Apesar do alto valor, o quadro de Frida não chega a custar 10% do preço da obra de arte mais cara já leiloada na história, o quadro “Salvator Mundi”, de Leonardo da Vinci, arrematado por US$ 450 milhões em novembro de 2017. Do ponto de vista artístico e econômico, uma série de fatores faz com que os preços de quadros pintados há décadas ou séculos atinjam valores estratosféricos, movimentando uma indústria centenária de casas de leilões e adicionando à arte conotações de negócios. Para além do tamanho ou do custo de confecção, o tempo, nome do artista e a incitação do “desejo de posse” daquela ideia são cruciais para determinar o preço de uma obra.

“A gente tem que entender que a arte é um ecossistema, é uma manifestação do ser humano, como é a ciência e como é a tecnologia. Um livro, poema, música, conjunto de instalações, toques e gestos podem contar histórias, revelar desejos de uma cultura, nos ensinar modos de fazer, nos ensinar maneiras de viver melhor e viver outras vidas. Quando a gente lê um livro que nos emociona, de certa forma estamos lendo outras vidas. Quando uma dessas histórias impacta muito ela vira uma história de desejo de muitos. Nesse caso, a gente começa a disputar isso, e atribuir valor às coisas. É um constructo mental. O que atribui valor à história de arte é o desejo dos humanos de se relacionarem com aquela história”, explica Rejane Cantoni, professora de Criatividade na École Intuit Lab, escola francesa de Design, Artes e Comunicação Visual em São Paulo. Ela traz como exemplo uma das obras mais famosas da história, a Monalisa, de Leonardo da Vinci, que não mostra apenas o busto de uma mulher, mas traz um novo tipo de perspectiva nas pinturas da época (que desfoca o fundo da imagem, ao contrário do que a maioria dos pintores fazia) e uma série de retoques com pigmentos que envelheceram ao longo de séculos.

“A Monalisa que a gente vê hoje é uma Monalisa que tem 500 anos de história, mas além disso o que o Leonardo ali faz é a maestria da época. Quando ele pinta aquele retrato, na verdade, ele está dizendo para a gente: ‘Nesta época nós víamos o mundo assim, as pessoas se vestiam assim’”, aponta a docente. A sensação de desejo e o reconhecimento em torno daquela cultura terminam sendo fatores que agregam valor à obra e tornam um quadro de Frida, “menos popular” do que da Vinci, mais barato do que a obra do italiano. “Se você for hoje em uma cidade remota e perguntar para alguma pessoa simples que tem uma experiência de mundo contemporâneo muito mais local do que internacional, o nome de um artista, a chance dela falar ‘da Vinci’ é maior do que de falar ‘Frida Kahlo’. É sobre qual história impacta mais. O Leonardo ainda impacta mais. É a força daquele signo”, analisa Cantoni, considerando excelente o trabalho de retrato do artista europeu. Para ela, por contar uma história mais local no México e ter em suas obras uma grande carga de drama, é possível classificar a arrecadação do quadro de Frida como impactante.

Do ponto de vista do leiloeiro Rafael Ruiz Zafalon de Paula, pessoa mais jovem do Brasil a exercer a função, a arrecadação dos milhões no quadro de Frida é importante não só por se tratar de uma obra latina, mas também por retratar o gênero feminino. “Essa foi uma marca para o mercado não só pelo valor, mas por ser [o quadro de] uma pintora mulher, que é um fato que, infelizmente, no mercado nós ainda temos uma certa defasagem. A história foi um pouco injusta com as mulheres, mas nós estamos mudando, eu espero que consigamos mudar isso com o tempo”, analisa. Ele lembra que para além da apreciação da arte, há uma relação econômica que envolve os arremates de obras por valores tão altos. “Todo colecionador é um investidor. Ele busca liquidez. É como um jogo de investimento na bolsa de valores: o nome do artista, a sua história, a sua produção, a permanência do artista no seu período e no seu estilo, a persistência daquela obra na sua história… Todos esses fatores são pontuais e essenciais para que essa peça, esse investimento, seja um ponto de liquidez e traga retorno”, explica. O profissional lembra que artistas brasileiros como Di Cavalcanti, Cândido Portinari e Tomie Ohtake (que nasceu no Japão, mas viveu e morreu no Brasil) têm obras cada vez mais valorizadas no mundo dos leilões.

“Esse processo [de valorização] é longo. Não é um processo delgado, não é um processo que pode ser encurtado”, afirma. A obra brasileira mais cara da história, “A Caipirinha”, da artista Tarsila do Amaral, foi leiloada no ano de 2020 por R$ 57,7 milhões, preço superior ao recorde anterior, de R$ 5,7 milhões, batido em 2015 na venda da obra “Vaso de Flores”, de Alberto da Veiga Guignard. O responsável pela compra não foi identificado. Apesar dos trâmites financeiros que envolvem o leilão de uma obra, Rafael Zafalon lembra que o trabalho de um leiloeiro vai além de cantar os arremates em um palco e muitas vezes passa por um processo de análise do valor da obra, das suas qualidades e de possíveis danos e do valor sentimental e histórico que aquele objeto tem para o comprador e para o mundo. “Tudo isso é feito para que haja essa interlocução entre espectador e obra e para que tudo isso seja muito mais do que uma simples troca ou investimento. Fazemos isso para que seja um caso de amor e apaixone os nossos clientes”, pontua. Veja, abaixo, a lista de obras mais caras da história:

“Salvator Mundi”, Leonardo da Vinci

O maior valor de uma pintura na história até o momento foi arrecadado em novembro de 2017, quando o príncipe herdeiro Badr bin Abdullah bin Farhan, em nome do governo da Arábia Saudita, comprou a obra “Salvator Mundi”, de Leonardo da Vinci, por US$ 450 milhões. O quadro, feito por volta dos anos 1600 para o rei Louis XII da França, passou para as mãos do Rei Charles I, da Inglaterra, e foi declarado como perdido no século 18, sendo confundido com uma cópia no ano de 1958 e vendido por US$ 59 dólares. Após uma série de restaurações, o quadro foi leiloado em 2005 por cerca de US$ 10 mil, em 2013 por US$ 127 milhões e atingiu o seu valor final em 2017. Após uma série de debates sobre a autenticidade da obra, porém, curadores do Museu do Prado, na Espanha, “diminuíram” a categoria da obra, que deixou de ser creditada a da Vinci e passou a ser considerada um trabalho “autorizado e supervisionado por Leonardo”.

“Interchange”, Willem de Kooning

Vendida por US$ 300 milhões em setembro de 2015, a obra “Interchange”, do artista holandês Willem de Kooning, foi adquirida pelo bilionário Kenneth C Griffin. Ela é considerada um quadro do expressionismo abstrato, foi finalizada no ano de 1955 e retratava partes da cidade de Nova York vistas por Kooning, que virou um cidadão norte-americano em 1962, mais de 35 anos após se mudar para os Estados Unidos. A peça, que foi comprada de Kooning por US$ 4 mil pelo arquiteto Edgar Kaufmann Jr, foi vendida a negociadores japoneses por US$ 20,7 milhões no final da década de 1980 e repassada ao magnata David Geffen anos depois, que vendeu de forma privada o quadro a Griffin. Após ser adquirida pelo preço recorde, a pintura foi emprestada por Griffin ao Instituto de Arte de Chicago, onde está exposta.

“Nafea Faa Ipoipo”, de Paul Gauguin

A terceira obra mais cara já vendida na história foi o quadro “Nafea Faa Ipoipo” (“Quando te Casarás?”, em tradução livre) do francês Paul Gauguin, negociado por US$ 300 milhões com um colecionador suíço pela família real do Qatar no ano de 2014. A obra pós-impressionista foi feita em 1892, no período em que o pintor francês foi ao Taiti e retratou paisagens e moradores locais. O primeiro preço dela, negociado diretamente com o pintor quando ele voltou à Europa, foi de 1,5 mil francos. Até ser vendida, a obra estava emprestada ao museu Kuntsmuseum Basel, na cidade suíça da Basiléia.

“Os Jogadores de Cartas”, Paul Cézanne

Uma das cinco pinturas da série “Os Jogadores de Cartas”, de Paul Cézanne, foi vendida em fevereiro de 2012 pelo magnata grego George Embiricos por US$ 250 milhões à família real do Qatar. Na época, ela se tornou a obra de arte mais cara já vendida. Mesmo com a imprensa internacional anunciando o valor inicial da compra por US$ 250 milhões, a estimativa é de que ela tenha chegado até US$ 300 milhões por causa de taxas de câmbio, o que a deixa “ao lado” da obra Paul Gauguin vendida em 2014. A obra foi comprada para fazer parte do Mathaf: Museu Árabe de Arte Moderna, em Doha, na capital do Qatar. Outras quatro peças da coleção de Cézanne que leva o mesmo nome estão no Museu de Arte Metropolitana de Nova York; na Fundação Barnes, da Pensilvânia, no Museu d’Orsay, em Paris, e no Instituto de Artes de Courtauld, em Londres.

“Number 17A”, Jackson Pollock

Vendida pela Fundação David Geffen ao bilionário Kenneth C. Griffin por US$ 200 milhões no ano de 2015, (junto à segunda obra mais cara do mundo, Interchange) a obra “Number 17A”, do pintor norte-americano Jackson Pollock, foi feita no ano de 1949 e é hoje a quinta com o maior preço da história. Assim como a segunda obra mais cara da história, o quadro de Pollock também está exposto no Instituto de Arte de Chicago, do qual o bilionário faz parte.

Comentários

Conteúdo para assinantes. Assine JP Premium.