Exclusivo: Alckmin já teve mais audiências com Lula do que Mourão com Bolsonaro e Temer com Dilma

Compromissos com empresários, representantes do PSB e pautas internacionais compreendem boa parte da agenda do vice-presidente, que parece se espelhar em Marco Maciel

  • Por Janaína Camelo
  • 21/04/2023 15h42 - Atualizado em 21/04/2023 16h13
Ricardo Stuckert/PR/Divulgação Alckmin se despede de Lula Lula e Alckmin no Palácio da Alvorada

Em menos de quatro meses de mandato, o vice-presidente Geraldo Alckmin se reuniu ao menos 12 vezes com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em audiências a portas fechadas, só os dois ou com outras autoridades. Levantamento exclusivo da Jovem Pan nas agendas oficiais mostra que Alckmin não está disposto a ser um “vice decorativo”. A frequência de encontros neste início de governo chama atenção quando comparada à de antecessores, relegados a um papel meramente administrativo — conforme a lista de compromissos oficiais dos últimos nove anos. Entre 1º de janeiro e 30 de abril de 2019, Jair Bolsonaro não chegou a receber Hamilton Mourão em reunião exclusiva. Foram apenas dois encontros coletivos em reuniões ministeriais. Também se viram em cerimônias oficiais, mas já viviam em clima de desconfiança, especialmente por causa de manifestações do vice contrárias a posicionamentos do então presidente.

Nos quatro primeiros meses de mandato, Bolsonaro publicou em sua agenda oficial duas reuniões de Conselho de Governo, onde participam toda sua equipe ministerial e vice-presidente. Mas o nome de Mourão só aparece uma única vez, em reunião no dia 19 de fevereiro, ao lado de outros quatro ministros e alguns secretários de governo. O general, que é hoje senador, também aparece nas imagens da reunião do dia 22 de abril daquele ano, usada pelo então ministro da Justiça, Sergio Moro, para acusar Bolsonaro de interferência na Polícia Federal. O evento nunca entrou na agenda do ex-presidente. Com Dilma Rousseff, em seu segundo mandato, Michel Temer conseguiu ter três encontros a sós com ela no gabinete presidencial, entre janeiro e abril de 2014. Pouco tempo depois, eclodiriam queixas do emedebista, que se sentia um “vice decorativo”, dada a falta de consideração da petista em planejamentos e decisões estratégicas. Na ocasião, Temer reclamou que “só era chamado para resolver as votações do PMDB e as crises políticas”. A relação azedou, Dilma perdeu apoio no Congresso e acabou sofrendo impeachment por suas pedaladas fiscais. 

Entre os compromissos oficiais de Dilma Rousseff, em seus quatro primeiros meses de mandato, não há menção a nenhuma reunião ministerial ou de governo, ou mesmo qualquer outra audiência com sua equipe onde o vice-presidente deveria estar presente. Mas os três encontros particulares com Temer foram explicitamente publicados. Agora, tudo mudou. A média de audiências entre Lula e Alckmin a cada mês é 75% maior que a dos antecessores. Nas 12 audiências entre Lula e Alckmin, além de reuniões particulares, estão almoços com governadores e reuniões ministeriais. As audiências a sós com o presidente aconteceram nos dias 20 de janeiro e nos dias 9 e 17 de março, todas no Palácio do Planalto. A agenda de Alckmin, que também ocupa a pasta de Indústria, Comércio e Serviços, também é intensa em relação ao resto da Esplanada. Até hoje, o vice — que ocupa interinamente a Presidência durante a viagem de Lula a Portugal — recebeu o total de dez ministros de governo. Entre eles, Fernando Haddad, da Fazenda; Nísia Trindade, da Saúde, Alexandre Padilha, de Relações Institucionais, Camilo Santana, da Educação; e Luiz Marinho, de Trabalho e Emprego.

A quantidade de despachos com o presidente Lula e ministros só não é maior que os compromissos com pauta internacional e reuniões com empresários, que compreende a maior parte da agenda do vice-presidente. Ele manteve 22 compromissos com empresários ou entidades representantes da indústria e 27 agendas envolvendo temas internacionais. John Tuttle, vice-presidente mundial da Bolsa de Valores de Nova York e Liesje Schreinemacher, ministra do Comércio Exterior e Cooperação ao Desenvolvimento do Reino dos Países Baixos, foram alguns recebidos por ele no Palácio do Planalto. Entre os empresariado, figuras representativas do setor, como Josué Gomes e Eduardo Eugenio, presidentes da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Fierj), respectivamente; além da diretoria da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e representantes da Indústria do Amazonas. Em paralelo aos encontros com gigantes do segundo setor, Alckmin também atendeu defensores do empreendedorismo sustentável, frente mais aliada com as pautas da base do presidente Lula, como Márcio Lopes de Freitas, presidente do Sistema OCB (Organização das Cooperativas Brasileiras), e a Frente Parlamentar Mista do Empreendedorismo.

Nessa mesma posição, de tentar alinhar seus compromissos no governo às pautas do eleitorado de Lula, o vice-presidente tem aberto as portas de seu gabinete a representantes de movimentos sociais. Entre eles, Cleusa Ramos, presidente da Associação dos Trabalhadores Sem Terra de São Paulo; Toni Reis, diretor-presidente da Aliança Nacional LGBTI+; e Preto Zezé, presidente global da Central Única de Favelas. No campo político, o vice-presidente se mostra ativo nas articulações com o Congresso, em parceria com o ministro Alexandre Padilha. Já recebeu em conversas no gabinete representantes de 16 partidos, sendo a maior parte deles, do PSB, sigla no qual é filiado. Ao todo, foram 10 encontros com seus colegas de partido até agora. Apesar da atuação intensa, Alckmin mantém o perfil discreto que o caracteriza, rendendo homenagem a Marco Maciel, considerado até hoje em Brasília o vice ideal.

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