Kajuru diz que governo Bolsonaro vive pior momento: ‘Centrão está no comando’

Em entrevista à Jovem Pan, senador falou sobre os trabalhos da CPI da Covid-19, afirmou que votará contra a indicação de André Mendonça para o STF e criticou escolha de Ciro Nogueira para a Casa Civil

  • Por André Siqueira
  • 25/07/2021 08h00
Jefferson Rudy/Agência Senado Senador Kajuru de óculos no plenário da Casa Kajuru foi um dos autores do mandado de segurança que garantiu a instalação da CPI da Covid-19

Um dos autores do mandado de segurança apresentado ao Supremo Tribunal Federal (STF) que garantiu a instalação da CPI da Covid-19, o senador Jorge Kajuru (Podemos-GO) afirma que os trabalhos da comissão estão “comprovando a corrupção” e “revelando escândalos” no Ministério da Saúde. Por telefone, o parlamentar falou à Jovem Pan na quinta-feira, 22, sobre a atuação do colegiado, a indicação do Advogado-Geral da União, André Mendonça, à Suprema Corte, a recondução de Augusto Aras para o comando da Procuradoria-Geral da República (PGR) e a escolha do senador Ciro Nogueira (PP-PI) para a Casa Civil. Para Kajuru, este é o pior momento do governo do presidente Jair Bolsonaro. “O Centrão está no comando”, avalia. Ele pondera, no entanto, que ceder espaços aos partidos que compõem este bloco pode prejudicar o governo federal. “A chance de colocar o Centrão nesses postos do governo e trazer corrupção para dentro do governo é muito grande”. Confira abaixo a íntegra da entrevista:

O senhor foi um dos autores do mandado de segurança que resultou na instalação da CPI da Covid-19. Qual o balanço do senhor sobre os três primeiros meses de trabalho? Confesso que fiquei surpreso com a CPI, porque tinha receios. A surpresa é boa, primeiro pela qualificação dos senadores que estão se preparando para os questionamentos, que não vão lá pelos 30 segundos do Jornal Nacional. Alguns vão despreparados e só querem aparecer. Essa é a parte ruim, o nível cai. O presidente Omar Aziz só cometeu um erro: ele deveria ter decretado a prisão de mais gente. A CPI existe para isso. Mas o mais importante foi a descoberta de escândalos. Para mim, o presidente [Bolsonaro] não roubou, mas ele está errado ao dizer que não deixa ninguém roubar. Nem Deus, na Presidência, evitaria a corrupção com tanta gente trabalhando ao seu redor. Estamos vendo a comprovação de corrupção. E vão aparecer mais escândalos. Nos 90 dias finais, será ouvida gente mais forte e mais considerável do ponto de vista de informar o que não sabemos e coisas que o Brasil precisa saber. O lado ruim é esse Fla-Flu, porque aí vira revanchismo. E acaba tendo o espírito revanchista por causa dos governistas. O Flavio [Bolsonaro] discute toda hora com o relator [Renan Calheiros], quer falar toda hora. Aí vira aquela bagunça, aquela parte patética com o Flavio, com o Marcos Rogério, é muito ruim. Virou uma guerra pessoal. O Flavio disse que a relação dele com o Renan virou uma guerra. Não pode ser assim. Temos que ter uma apuração independente.

Os jornais divulgaram um vídeo da secretária Mayra Pinheiro, da Saúde, dizendo que precisava de perguntas e respostas para alinhar o depoimento com os senadores que chutariam para ela fazer o gol. O que o senhor pensa disso? Foi revoltante ver o vídeo da Mayra Pinheiro. Ela deveria ter sido presa. Isso de combinar pergunta e resposta, para mim, é motivo de expulsar o senador da CPI. É motivo, inclusive, para a CPI ser justa e me colocar no lugar desse senador. A CPI só existe porque eu e o Alessandro [Vieira] fomos ao STF. É um desgaste enorme para o governo. O presidente Bolsonaro não pode achar que o público dele aceita qualquer coisa. O Brasil não é só seu público. As pessoas estão se decepcionando. Até bolsonaristas que eu conhecia, os fanáticos, mudaram de opinião. Em qualquer governo minimamente sério, ela deveria ter sido demitida.

O Senado terá que sabatinar o procurador Augusto Aras e o ministro André Mendonça. O senhor votará contra? Essas indicações são a parte mais triste desses últimos dias. Quanto ao André Mendonça, fui o primeiro a dizer que não o receberia, não falaria por telefone e que votaria contra. Por quê? Pelas qualificações, que não as vejo. É um lusco-fusco, um Kássio Nunes [indicado por Bolsonaro para a vaga do ministro Celso de Mello]. Na AGU, ele é mais advogado do Bolsonaro do que da União. Por fim, fiquei intrigado e é preciso ter coragem para falar isso: o credo não deve importar para votarmos uma indicação de ministro do STF. Não interessa se ele é católico, ateu, evangélico. Interessa se chegará preparado ao STF, se tem qualificação. O Mendonça está em campanha pelo Brasil, viajando. Quem está pagando? E o Aras, meu Deus. Ele é um Geraldo Brindeiro da época do Fernando Henrique Cardoso, é um engavetador de tudo o que aparece contra a Presidência. Ele é da cozinha do presidente. São dois péssimos nomes. Esperava que Bolsonaro escolhesse melhor. O presidente começou o governo com nomes fantásticos, ministro Tarcisio [da Infraestrutura], ministra Tereza [da Agricultura], ministro Queiroga [da Saúde]. Agora, Aras e Mendonça, meu Deus.

É o pior momento do governo? O presidente Bolsonaro sabe que não sou da turma do quanto pior, melhor. Eu tenho posição. Mas, sim. Esse é o pior momento do governo. Sobre a pandemia, a gente pode culpá-lo no que tange ao enfrentamento. Mas dar a ele a responsabilidade por tudo, pelo desemprego, por exemplo, aí foi a pandemia. Mas agora, o presidente, que naquela gravação que divulguei se dizia favorável à CPI, ele está fazendo o contrário. Ele vive o dia todo com ódio da CPI. É muito ruim isso. Ele chama o G7 de sete patifes, ataca senadores, não é assim, tinha que haver harmonia. Ele tinha que demonstrar tranquilidade, serenidade e dizer que vai tomar providências sobre aquilo que a CPI comprovar de verdade. Ele tinha que mostrar isso ao Brasil, respeitar a liturgia de seu cargo. Bolsonaro está acuado e começou a cometer um erro atrás do outro. O Fundão, por exemplo. Ele é contra, mas os dois filhos [Eduardo e Flavio Bolsonaro] votam a favor? Eles votariam contrariando o pai? É indiscutivelmente o pior momento. Mas o país não pode ter mais um impeachment. Não dá, senão vamos chegar à conclusão de que todo presidente será destituído.

O presidente escolheu o senador Ciro Nogueira para a Casa Civil, coração do governo… Saber que o Ciro vai para Casa Civil é baixar o nível ao subterrâneo. O Centrão está no comando. E o Bolsonaro vai acabar indo para o PP [partido presidido por Nogueira].

Como o senhor vê esta cruzada bolsonarista pelo voto impresso? Não posso crer que vão rasgar a Constituição. Não tem cabimento achar que voltar ao voto impresso é uma evolução. É voltar ao tempo em que se comia a cédula. Voto impresso é a certeza de que será fraudulenta a eleição. Para A ou para B. A eleição no Brasil é inquestionavelmente um sucesso. Ela melhora a cada vez. Mas, para mim, esse papo de golpe é bravata. O Braga Netto [ministro da Defesa] não é dono do TSE, o Bolsonaro também não. A partir do momento que se definir o voto impresso, é melhor fechar o TSE. Não tem cabimento. As pessoas que concordam com o voto impresso, na maioria, são os fanáticos. As pessoas esclarecidas, embora a ignorância seja a maior multinacional do mundo, não concordam. Eu vi com bons olhos o movimento dos partidos que se movimentaram para barrar a aprovação desta PEC. Sempre me falaram que o Arthur Lira é uma cópia do Eduardo Cunha, mas agora não vou mais acreditar nisso, porque ele está mostrando que não vai permitir isso. As eleições vão ocorrer normalmente.

Falando em eleições, como o senhor avalia as pesquisas que apontam a polarização entre Lula e Bolsonaro? Uma eleição que só vai acontecer em outubro do ano que vem não poderia estar sendo discutida com tanta antecedência. O Brasil vive uma campanha eleitoral. O Ciro Gomes grava vídeos como se estivesse no horário de rádio e TV. O Bolsonaro fala, o Lula responde. Todo dia. Nas minhas redes, coloco os três, dou espaço para os três, o brasileiro que analise. Não sou feliz de ver a polarização. Sonho em ver a terceira via. Sonho com isso desde antes de entrar na vida pública. Mas está difícil enxergar a terceira via. O Ciro Gomes é o mais preparado de todos, no que tange a qualidade do candidato, mas é rejeitado pela forma raivosa como sempre se dirige aos outros. Ele tinha que rever isso. São mais de 12 meses até a eleição. Pode aparecer uma pessoa mais forte, com mais aceitação, mais credibilidade. Não basta popularidade. Prefiro a credibilidade. Na terceira via ainda não apareceu um nome com um número razoável [nas pesquisas]. Falam no nome da senadora Simone Tebet, no nome do meu irmão Datena. Se aparecerem em uma pesquisa com 10%, é um número importante. Você soma com os 12% que o Ciro sempre tem, são 22%, aí as pessoas começam a alimentar essa expectativa. Caso contrário, sem chance. As pesquisas mostravam o Luciano Huck, ele não passava de 4%. Foi por isso que desistiu. Com esse número, volta para casa, né? Você está vendo que o povo não te quer e não te vê com qualificação.

Mesmo com a máquina na mão, o senhor vê espaço para o presidente Bolsonaro deixar de ser competitivo? O caminho para isso existe, especialmente, em função da CPI e da forma como boa parte da população brasileira enxerga esse tal Centrão. Eles viraram chacota. A credibilidade do Centrão é zero. Eles têm espaço na TV, são partidos com capilaridade, mas o presidente não pode achar que isso basta. Eles estão no miolo do governo. Eu penso uma coisa: Bolsonaro não pode ser 100% culpado por ter que se relacionar com o Centrão. Nem Deus conseguiria governar sem ter que se acordar com esse pessoal. É um pessoal com força de voto no Congresso, mas é faminto, quer o poder para fazer negócio. Esse é o perigo: o presidente prometeu que não roubaria, mas não pode achar que não vai deixar que roubem. Não tem jeito. Deus teve surpresa com um apóstolo, não teria com essa quantidade de secretários e assessores? Lamento, mas isso vai prejudicá-lo. A chance de colocar o Centrão nesses postos do governo e trazer corrupção para dentro do governo é muito grande.

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